Quinta temporada de Chef’s Table se concentra em pautas sociais
Pela primeira vez sem um chef americano sequer, nova temporada resgata temas como imigração e respeito a diferenças
atualizado
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Se você não se emocionou com a belíssima história de amor entre o chef italiano Massimo Bottura e Lara Gilmore no piloto de Chef’s Table, ou com a inspiradora perspectiva de Alex Atala sobre comida brasileira em seu episódio na série, chegou a hora. Depois de quatro divertidos capítulos sobre confeitaria, a nova temporada de pequenos documentários da Netflix se afasta um pouco da gastronomia chique para concentrar no que interessa: o conteúdo humano.
O primeiro episódio da sequência é a história da mexicana Cristina Martínez, uma imigrante abertamente ilegal que vende o tradicional – e dificílimo – barbacoa na Filadélfia. A narrativa é permeada pelo amor e pela saudade: a chef se livrou de um relacionamento abusivo e, para garantir a educação e o sustento da filha, entrou sem documentação nos Estados Unidos e deixou a menina com a família em sua terra natal.
É impossível não se emocionar com a dramática escolha de Cristina. Para aplacar a saudade de casa, a solução foi replicar, em seu novo lar, o complicado preparo mexicano. Segundo especialistas que aparecem no episódio, se é difícil achar uma boa barbacoa no México, imagine provar do delicioso prato nos Estados Unidos.
Mesmo casada com um americano, trabalhando árdua e honestamente e gerando empregos na Filadélfia, Cristina não conseguiu o green card – e do lado de lá, sua filha não consegue o visto para os EUA. A história de partir qualquer coração é uma reflexão muito oportuna em tempos de xenofobia e patriotismo exacerbado se alastrando pelo mundo.
Por falar no mundo em conflito, o episódio seguinte ao de Cristina é, ao mesmo tempo, questionador e pacificador. O “antropólogo culinário” Musa Dagdeviren é um turco que se propôs a servir comida tradicional do país em seu restaurante. Com o passar do tempo, percebeu: muitos clientes se recusavam a comer determinados pratos por serem típicos de determinadas regiões ou de religiões em conflito na Turquia.
A solução foi corajosa: Musa buscou as raízes de cada alimento e se recusou a deixar qualquer um de fora. Além do resgate de tradições, seu restaurante hoje é conhecido por acolher uma diversidade de habitantes de Istambul, que o visitam para matar a saudade de casa. Ao final do episódio, a mesa farta. Não somos todos, afinal, uma grande comunidade diversa?
Na mesma busca por comidas típicas regionais está a tailandesa Bo Songvisava. Cozinheira experiente, ela dominava a gastronomia clássica europeia. Questionada sobre a comida típica de seu país, ela se apercebeu de um fato estarrecedor: não sabia nada sobre o assunto. Se é chocante ver uma tailandesa se mudar para Londres com intuito de aprender a própria gastronomia, é tocante vê-la recuperar tradições e levar a alta gastronomia típica de volta à Tailândia.
Por fim, a prova de que a genialidade pode ser discreta, silenciosa e orientada para equipes. Sempre à sombra de seu irmão, Ferran, Albert Adrià precisou se reinventar quando o restaurante onde os dois trabalhavam juntos fechou. Os dois são as mentes por trás do laboratório de criação dentro da cozinha profissional, e o caçula revolucionou a gastronomia molecular com a invenção de esferas saborizadas, por exemplo. A busca de Albert pela própria voz é o mote deste divertido episódio, não tão político quanto os três que o antecedem, mas de conteúdo igualmente estimulante.