E o jogo virou… Michael Bisping impõe mais um revés a Anderson Silva
No retorno após suspensão por doping, Spider se vê novamente enredado e perde por pontos
atualizado
Compartilhar notícia
Anderson Silva não quis deixar por menos. Voltando de uma suspensão de 13 meses por doping e se dizendo injustiçado ao longo de todo esse tempo, o lutador brasileiro buscou um desafio e tanto. Encarou o inglês Michael Bisping em octógono erguido na Arena O2, em Greenwich, cidade de Londres. Perdeu por pontos, em decisão unânime dos árbitros, ao fim de cinco assaltos.
A grandiosa Arena 02 foi palco das partidas de basquetebol e dos eventos de ginástica olímpica nos Jogos de 2012. Também já recebeu concertos de Taylor Swift, The Rolling Stones e até de um reformado Led Zeppelin. Uma vastidão que pode abrigar até 23 mil pessoas e que, na noite de ontem, girou em torno de dois homens.
Michael Bisping, de 37 anos, não é nenhum novato mas ainda não disputou o cinto de campeão do UFC. Encarava a luta contra Anderson Silva justamente como o passaporte a conduzi-lo ao inédito desafio. Bisping ali naquele momento era um sujeito, portanto, sem nada, nada a perder. Chamando os ingleses para seu lado, ele jogava em casa.
Durante a semana passada, e desde que o confronto com Spider foi anunciado, ainda em dezembro, Bisping não perdeu a oportunidade de provocar o oponente, atraindo mídia e torcida, esquentando as expectativas. Lembrando dos recentes percalços de Silva, não lhe faltava assunto para aquelas provocações que a imprensa adora.
É de conhecimento geral que os últimos anos de Anderson Silva, para muitos o maior campeão das chamadas mixed martial arts, foram bem puxados. A derrota para Chris Weidman, no já distante julho de 2013, custou ao brasileiro mais do que o cinturão. Ele saiu com o moral abalado e com o carisma definitivamente arranhado. Fazendo blague com Weidman em pleno ringue, firulando e dançando, se fez de besta e apanhou feio, num nocaute bizarro que já entrou para a história do esporte – e de maneira nada gloriosa.
Daí em diante a sorte de Anderson Silva parece ter se esvaziado. Na revanche contra Weidman, em dezembro de 2013, ele quebrou feio a perna ao tentar chutar o adversário num golpe igual a tantos e tantos outros. Após longo estaleiro, a luta com Nick Diaz, em janeiro de 2015, serviu somente para que o ex-campeão fosse flagrado no antidoping. Em sua defesa, disse que não havia tomado anabolizante algum, apenas um remédio contra impotência sexual.
Michael Bisping pediu para Anderson não “esquecer do Viagra” na bagagem para Londres. Perfeito gentleman.
O gongo da discórdia
Esqueça o Viagra. O problema de Anderson Silva, em cima do ringue, é bem outro. Pode-se até apontar o momento exato em que surgiu: o controverso UFC 112. Enfrentando Damien Maia em Abu Dhabi, janeiro de 2010, o então campeão tripudiou abertamente. Andava em círculos, subestimando um adversário que não achava estar à sua altura. Na tentativa de espezinhar o rival, acabou espezinhando a torcida local, que prontamente se virou contra ele.
Até o filme “Like Water” (2011), um documentário hagiográfico com toques narrativos da saga “Rocky” e sacadas de autoajuda, teve que tratar dessa faceta não muito simpática e olímpica de seu protagonista.
Noite passada, em Londres, Anderson Silva mais uma vez apresentou seu costumeiro arsenal de gracinhas. Rondando Michael Bisping com a guarda baixa, chamando o camarada para acertar-lhe um murro, Spider queimou o primeiro round nesse ritmo. No segundo, conseguiu que Bisping de fato lhe acertasse umas boas pancadas. E no terceiro assalto, quando a luta enfim ficou aberta, Silva mandou um joelhaço que deixou Bisping sentado na lona.
Exatamente no momento em que o joelho de Anderson Silva varava o ar para acertar o rosto de Michael Bisping, soou o gongo. Para a arbitragem, o golpe não valeu. Bisping ganhou ali preciosos minutos para respirar e voltar à carga. Mas Anderson Silva nem ouvia mais nada e estava pulando nas cordas, de braços erguidos a comemorar uma vitória que ainda não havia acontecido.
Jamais saberemos o que se passou na cabeça de Anderson Silva naqueles poucos segundos. Se ele realmente entendeu que estava acabada a luta, por simplesmente não ter ouvindo o gongo ou pelo surto de adrenalina ao virar um combate que achava moleza, mas que se apresentara mais duro do que o previsto. Bem possível. Ou então, vá saber, Anderson Silva apenas usou daquele momento, com Bisping grogue, para mais uma de suas piadinhas infames, mais uma de suas pequenas humilhações que já vêm cansando muita gente.
Ao fim do combate, de toda forma, Anderson Silva preferiu reclamar da arbitragem e se enrolou de vez. “Não tem como vencer de um jeito, eles tentam tirar de outro”, acusou. “De vez em quando é que nem no Brasil, uma corrupção total”. Perceba que assim, numa única articulação intelectual malfeita, ele se esqueceu de que foi justamente lá em Londres que viveu uma noite definitiva para sua mitologia pessoal (a Cage Rage 8 de 2004) e também se esqueceu de que foi aqui no Brasil que ele se tornou o lutador que é…
A derrota para Chris Weidman, a grave lesão na perna, a queda por doping e, por fim, Michael Bisping. Este foi o quarto revés seguido em uma carreira nada afeita a fracassos.
Anderson Silva, completando 41 anos de idade em abril, deve saber que o tempo já não está mais correndo a seu favor. Talvez por isso ele tenha, horas antes de sua derrota, divulgado em seu canal no YouTube mais um de seus vídeos promocionais. Desta feita, em um tom de elegia, a peça foi construída sobre o poema “Act of Valor”, do cacique Tecumseh (1768-1813).
Líder dos índios shawnee da América do Norte, Tecumseh esteve à frente de seu povo em sangrentas batalhas contra os colonizadores ingleses. Foi dado como morto em um ato de traição, quando sua tribo já tinha se rendido, após uma batalha na província de Ontário. Seu corpo nunca foi encontrado.