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“Decisão sobre vacina deve ser científica”, diz professor da USP Jorge Kalil

Pesquisador afirma que politização atrapalha definição de estratégia nacional de imunização e que critérios de escolha devem ser científicos

atualizado

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IEA USP/Reprodução
Professor Jorge Kalil
1 de 1 Professor Jorge Kalil - Foto: IEA USP/Reprodução

O imunologista Jorge Kalil, da Universidade de São Paulo, reclama da politização em torno do assunto compra de vacinas, especialmente a discussão entre Bolsonaro e Doria em relação à Coronavac.

Para o experiente pesquisador, uma questão que era científica – escolher em quais vacinas apostar – transformou-se em uma batalha política por popularidade. Segundo ele, que é um dos membros titulares da Academia Brasileira de Ciência (ABC), a decisão para a compra de uma vacina deve ser eminentemente científica, com pessoal técnico avaliando sobre as vacinas com melhor potencial para atender à população brasileira.

Kalil também defende que a escolha seja tomada pelo governo federal, que tem sob o guarda-chuva do Ministério da Saúde o Programa Nacional de Imunizações. “A compra é antecipada para garantir as doses, mas precisa ser feita observando critérios técnicos”, afirma o imunologista, que é uma das maiores autoridades brasileiras no assunto.

A disputa política vai atrapalhar a imunização da população brasileira?
Eu sou cientista, não sou político. Segundo a Organização Mundial de Saúde, temos 180 vacinas em desenvolvimento, 40 estão em estudos clínicos, sendo 9 na última fase dos estudos clínicos, nos testes da fase 3.

Essas vacinas são de dois tipos: ou de vírus inativados ou produzidas a partir de proteínas chamadas espículas. As vacinas de vírus inativados são mais antigas, são mais óbvias, nem sempre dão uma resposta forte e duradoura. As outras são experimentais, não sabemos como funcionarão. O que vai dizer quais são as vacinas que vão funcionar são os estudos de fase 3.

É possível que muitas vacinas funcionem. É possível que nenhuma vacina funcione e é possível que as vacinas funcionem parcialmente – ou seja, que um percentual da população fique protegido e outro não.

O fato de o Brasil ter vários estudos em andamento é ótimo, desde que se faça bons acordos para que as vacinas sejam distribuídas no país. Das quatro vacinas com testes em andamento no Brasil, apenas duas têm acordos: Oxford/AstraZeneca e Coronavac.

Os Estados Unidos, por exemplo, pegaram as vacinas que eles achavam que tinham mais chance de dar certo e compraram 100 milhões de doses de cada uma, pagando antecipado para acelerar os estudos de fase clínica. É como uma aposta, para garantir doses lá na frente.

A realização de testes no Brasil garante que as vacinas estejam disponíveis para a população?
O ideal é que o Brasil tenha bons acordos – seja de entrega de vacina ou de transferência tecnológica.

Os de transferência tecnológica vão demorar muitos anos para serem implantados – quando se diz que a vacina será fabricada no Brasil é num futuro longínquo. Por enquanto, ela será apenas envazada e distribuída.

Quanto mais acordos de compra de vacina o país tiver, melhor – maior a chance de termos vacinas que funcionem para toda a população. A Janssen e a Pfizer estão fazendo estudos aqui individualmente, sem a participação de universidades ou instituições de pesquisas públicas. Até onde sei, não há acordos com estas farmacêuticas, então pode ser que elas testem aqui e isso não beneficie o Brasil. Se o país não fizer acordo, pode ser que elas apenas se beneficiem e vendam para outros países. Até onde sei, só há acordos com Oxford/AstraZeneca e Coronavac.

O governo federal tem que comprar a Coronavac? Como devem ser tomadas as decisões sobre compras de vacina?
Tem que olhar os dados científicos e ver quais são as vacinas que têm mais possibilidade de funcionar e que poderão ser distribuídas para todo o país. Isso depende de variantes até de logística, pois pode ser que não seja possível garantir transporte em determinadas condições para o Nordeste, a Amazônia e o Pantanal.

Está sendo politizada uma coisa que não deveria ser. O assunto não deveria ser uma queda de braço entre políticos. – Não vou comprar a do Doria. – Ele não quer comprar a minha vacina.

Meu entendimento é que a decisão deve ser do governo federal, que é quem toca o Programa Nacional de Imunizações (PNI). Essa negociação é do governo federal, não de governos isolados.O programa é nacional.

O governo de São Paulo assumiu um risco com a vacina chinesa e agora está tentando passar esse acordo para o governo federal. Não acho adequado. Outros estados também estão fechando acordos, não acho adequado.

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