Violência nas escolas: por que ações emergenciais são insuficientes
Educadores avaliam que medidas anunciadas por governo e Prefeitura de SP, como contratação de seguranças e psicólogos, são apenas paliativas
atualizado
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São Paulo – O governo e a Prefeitura de São Paulo anunciaram recentemente medidas para combater a violência nas escolas e evitar que ataques, como o que matou a professora Elisabeth Tenreiro, ocorram novamente. Especialistas em educação avaliam que as iniciativas são paliativas em um momento de crise e cobram melhorias estruturais.
“A avaliação geral é positiva, porque há necessidade de uma ação imediata. Nós estamos em um momento de crise de vulnerabilidade nas escolas, que precisa ser trabalhada de alguma maneira. Algumas medidas são interessantes e outras são problemáticas, especialmente se elas se perpetuarem e se tornarem o padrão”, diz Zilda Del Prette, professora sênior voluntária da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e ligada ao programa de pós-graduação em psicologia.
O pacote do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) inclui a contratação de 550 psicólogos, que circularão em esquema de rodízio pelas 5 mil escolas estaduais. “Embora o momento exija medidas emergenciais, essa questão precisa ser tratada com políticas mais estruturais. Por exemplo, 550 psicólogos circulando pelas escolas não vão dar conta de um trabalho que demanda uma ação conjunta com os órgãos de saúde”, afirma Márcia Jacomini, doutora em educação e professora do departamento de educação da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
Psicólogos
Márcia aponta que problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade, podem ser identificados em um primeiro momento na escola, mas depois a estrutura de saúde pública precisa ter capacidade e ambientes adequados para dar sequência ao tratamento, que é de longo prazo.
“O tratamento psicológico é, sim, necessário, mas como todo atendimento de saúde, ele precisa ser desenvolvido nas unidades básicas de saúde. Ou seja, nós precisamos ter uma combinação de aparatos do estado em todas as regiões para que a escola desenvolva um trabalho em cooperação com as unidades básicas de saúde”, afirma Márcia.
Zilda acredita que é necessário ter um “projeto de transição para que os psicólogos inseridos nas escolas se tornem agentes educacionais e não agentes clínicos”.
Comportamentos de risco
A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) anunciou um aplicativo de celular chamado “botão de alerta”, reforço na ronda escolar feita pela Guarda Civil Metropolitana e a criação de um curso para funcionários das escolas identificarem comportamentos de risco entre os alunos.
Os educadores analisam que, mesmo com um curso, os docentes e outros profissionais terão dificuldades nessa tarefa devido ao número excessivo de alunos por sala e a um quadro de servidores enxuto.
Os especialistas indicam a necessidade de investimento para melhorias estruturais, como a valorização da carreira de professor, com melhores salários e condições de trabalho. O governador anunciou, em fevereiro, a contratação de 15 mil docentes.
Zilda também afirma que as iniciativas emergenciais foram “intuitivas”, mas o estado ainda precisa implementar processos para avaliar como essas ações vão impactar a comunidade escolar.
Segurança
O plano estadual de combate à violência nas escolas também prevê a contratação de mil seguranças privados. Esses agentes deverão atuar desarmados em unidades de bairros mais violentos ou que têm registros de brigas entre alunos. Os educadores avaliam que é importante que, de fato, os seguranças não portem armas no ambiente escolar.
“Esperamos que esses profissionais sejam treinados para trabalhar em conjunto com a equipe gestora e os professores. É muito importante que eles estabeleçam uma relação com os estudantes. Não pode ser simplesmente um corpo estranho na escola”, diz Márcia.
A pesquisadora também acredita que as escolas deveriam ter permanentemente no seu quadro uma quantidade adequada de profissionais para monitorar a entrada, a movimentação nos corredores e a saída dos alunos.
Críticas
Catarina de Almeida Santos, professora da faculdade de educação da Universidade de Brasília (UNB), critica a presença de seguranças nas escolas, mesmo que eles estejam desarmados.
A docente da UNB afirma que um dos desejos de autores de ataques é o “confronto”, portanto o embate com os seguranças daria maior notoriedade aos criminosos, tornando as escolas um “alvo” mais atraente.
“A atuação da segurança pública deve ser no monitoramento, na identificação e nos desmonte dos planos para que as escolas não sejam alvos”, diz Catarina. A professora defende que questões sociais mais amplas, como desarmamento da população, combate ao extremismo e aos crimes de ódio, atuariam de maneira mais eficaz no combate à violência nas escolas.