Trisal consegue na Justiça direito de registrar filho com duas mães
Casal e amiga do trabalho em Bragança Paulista se tornaram uma família em 2018; decisão garante nome dos três no registro do filho mais novo
atualizado
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São Paulo — Um trisal de Bragança Paulista, no interior de São Paulo, conseguiu na Justiça o direito de registro multiparental do próprio filho. Com a decisão do Tribunal de Justiça publicada na terça-feira (5/3), os documentos da criança passam a incluir o nome do pai, Marcel Mira, e das duas mães, Regiane Gabarra e Priscila Machado.
Os três entraram com o pedido de registro de multiparentalidade do menino Pierre em agosto de 2023. O bebê, fruto de uma fertilização in vitro, já era registrado com os nome dos pais biológicos, Marcel e Regiane. Mas faltava a inclusão do nome de Priscila, que se sente mãe desde o planejamento da gravidez de Regiane.
“Eu sinto que o Pierre é meu filho desde a primeira consulta que a gente fez na clínica de fertilização. O sentimento, o afeto sempre existiu e nada tira isso de mim”, conta Priscila.
A família optou pelo procedimento porque Marcel já havia passado por uma vasectomia.
“Fim de uma maratona”
Para Priscila, a conquista do registro é uma grande vitória: “Para mim, parecia um sonho. É como seu eu tivesse no fim de uma maratona. Os olhares maldosos não têm como sanar, mas mesmo aquele que olhar com um olhar julgador, agora vai ter que aceitar que ele é meu filho também”.
A decisão também foi comemorada pelo pai Marcel: “A Pri sempre foi mãe do Pierre, mesmo antes do Pierre ter o nome de Pierre, mesmo antes dele ser concebido. Para nós do trisal, toda decisão que a gente toma é uma decisão de três cabeças, e a decisão de ter um filho foi uma decisão que nós três tomamos juntos”.
O trisal já divide a criação de outros três filhos: um rapaz de 20 anos e duas meninas de 16 e 11 anos. As meninas são fruto do relacionamento de Priscila e Marcel, que já eram casados desde 2005.
Em 2018, Regiane, que era colega de trabalho e amiga de Priscila, entrou para o relacionamento depois de passar uma noite com os dois. Agora, a filha de 11 anos também deseja incluir o nome de Regiane Gabarra em seus documentos.
“Pessoas não entendiam”
Ao Metrópoles, Regiane contou que se sente mãe das meninas desde o início da relação dos três: “Eu entrei nesse relacionamento em que já estavam os dois, o casal e as duas filhas, mas eu as amei [as meninas] desde o momento que eu as conheci. Eu tinha sentimento por elas como mãe e as pessoas não entendiam.”
A experiência para Regiane prova que a maternidade vai muito além de um documento: “Nós duas [ela e Priscila] passamos por essa experiência de ter filho que a gente gestou e filho que a gente não gestou, mas que o amor é o mesmo. Ser mãe é um sentimento que atravessa o corpo, ele vai na alma”.
Na decisão favorável à inclusão de nome de Priscila Machado no registro de Pierre, o juiz André Luiz da Silva da Cunha, da 1ª Vara Cível de Bragança Paulista, responsável pelo caso, argumentou que não há razões para negar a maternidade socioafetiva, já que “Priscila acompanhou a gestação e nascimento da criança, convive diariamente com ela e acompanha e participa do seu desenvolvimento, exercendo, assim, as funções inerentes à maternidade”.
O advogado da família, Diego dall Agnol Maia, comentou que a decisão reforça o direito de multiparentalidade, que não é uma exclusividade de famílias formadas por trisais.
“A multiparentalidade transcende essas situações. Ela atravessa muitas relações de minorias e maiorias. Ela acontece, por exemplo, quando um casal pede o divórcio e tem um novo casamento. O direito nesse sistema está defendendo a relevância do afeto”, disse o advogado.