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Tarcísio monta megavigilância com empresa dirigida por ex-secretário do governo Bolsonaro

Tarcísio fez parceria para o programa Muralha Paulista com empresa dos Emirados Árabes Unidos cujo CEO no Brasil atuou no governo Bolsonaro

atualizado

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Francisco Cepeda / Governo do Estado de SP
Imagem colorida mostra sala de reunião com mesa repleta de homens de roupas sociais - Metrópoles
1 de 1 Imagem colorida mostra sala de reunião com mesa repleta de homens de roupas sociais - Metrópoles - Foto: Francisco Cepeda / Governo do Estado de SP

São Paulo – O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) firmou uma parceria com a estatal Edge Group, dos Emirados Árabes Unidos, para estruturar a criação de sua principal vitrine na Segurança Pública, o Muralha Paulista, um programa de megavigilância que conta com câmeras de monitoramento integradas em todo o estado.

A empresa, que produz desde mísseis a equipamentos de espionagem, é comandada no Brasil por Marcos Degaut, que foi secretário de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), padrinho político do governador.

Representantes da Edge já estiveram no Palácio dos Bandeirantes ao menos duas vezes neste ano, em reuniões com o vice-governador, Felício Ramuth, em janeiro, e com Tarcísio e o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite, no começo deste mês.

A empresa afirma trabalhar em um sistema de “monitoramento inteligente” de São Paulo, que batizou de “Bola de Cristal”. A referência ao objeto capaz “prever o futuro” está em sintonia com as premissas do Muralha Paulista, que tem como objetivo emitir alertas à polícia antecipando comportamentos criminosos, como noticiou o Metrópoles.

Para se ter ideia da importância que o governo dá à relação com a empresa dos Emirados Árabes, Tarcísio cancelou sua presença em um evento que havia marcado com o prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB), no último dia 3/5, para participar da última reunião com a Edge na sede do governo paulista.

Dois lados do balcão

Marcos Degaut foi servidor de carreira da Câmara dos Deputados e é aliado da família Bolsonaro. Em 2019, após a posse do ex-presidente, ele foi indicado ao cargo de secretário de Produtos de Defesa no Ministério da Defesa.

Nesse posto, Degaut viajou, a trabalho, quatro vezes aos Emirados Árabes no período e teve uma série de reuniões com a Edge, com o objetivo de adquirir produtos da empresa para o governo federal. Uma das visitas foi acompanhada pelo deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho 03 do ex-presidente e aliado de Tarcísio.

Em 2022, Bolsonaro chegou a comunicar oficialmente ao governo emiradense que o então secretário seria indicado como embaixador do Brasil naquele país – a nomeação ficou travada no Senado, entre outros motivos, pela falta de formação diplomática do indicado, e nunca foi efetivada.

Em maio do ano passado, já fora do governo federal, Degaut assumiu o cargo de CEO da Edge na América Latina. Na internet, há fotos dele negociando com a empresa como representante do governo brasileiro, em um passado recente, e firmando parceria com o governo Tarcísio como representante da Edge, neste ano.

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Marcos Degaut (na imagem, o mais alto), em reunião com da Edge com o governo de SP
Reunião em janeiro do vice-governador com representantes da Edge
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Marcos Degaut, em 2021, representando o Brasil, em reunião na Edge Group, em Abu Dhabi

Reprodução/Edge Group
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Marcos Degaut (na imagem, o mais alto), em reunião com da Edge com o governo de SP

Francisco Cepeda / Governo do Estado de SP
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Reunião em janeiro do vice-governador com representantes da Edge

Reprodução/Edge Group

Ao Metrópoles, o secretário Guilherme Derrite, que integra uma das cotas do bolsonarismo no governo Tarcísio, afirmou que não conhecia Degaut antes da reunião do dia 3/5. “Não conheço esse cara. Conheço o embaixador dos Emirados Árabes, que estava lá em uma reunião institucional. Foi a primeira vez que vi ele [Degaut]”, disse.

Parceria estratégica

Embora a Edge já tenha distribuído dois comunicados à imprensa sobre a parceria com o governo paulista, a gestão Tarcísio trata a cooperação como embrionária.

Ao citar o programa Bola de Cristal, em janeiro, a empresa disse que conduziria testes, por seis meses, de uma “importante iniciativa de segurança pública” com objetivos como a estruturação de dados, a “análise e integração de diferentes soluções” e o estabelecimento de respostas rápidas.

A empresa afirmou que vai fornecer a São Paulo tecnologias de monitoramento de câmeras, drones inteligentes, inteligência artificial, inteligência de dados e as soluções de comando, controle integrado, comunicações e reconhecimento avançado – sistemas que, no meio militar, são chamados C4ISR.

“O projeto inovador é o primeiro desse tipo na América Latina e será usado como piloto para futuras iniciativas em vários bairros de São Paulo e outras áreas metropolitanas do Brasil”, diz a empresa, em nota.

Já o governo paulista informou, em nota ao Metrópoles, que os documentos assinados com a empresa são “termos de cooperação” – cuja íntegra não foi divulgada – com o governo dos Emirados Árabes.

“A pasta manifestou interesse em formalizar um convênio futuro, junto ao Ministério de Pesquisas Estratégicas e Assuntos de Tecnologia Avançada daquele país, por meio da estatal Edge Group, com o objetivo de buscar soluções tecnológicas que auxiliem no combate ao crime e na proteção da população. As tratativas ainda estão em discussão, portanto, não há nenhuma atividade laboral em andamento pela pasta”, diz o governo.

Segundo Derrite, a parceria é específica para auxílio na construção do Muralha Paulista.

“O que tem é um acordo de cooperação entre governo do estado e Emirados Árabes para ajudar na estruturação do Muralha Paulista. É um acordo, um guarda-chuva maior. Dentro desse guarda-chuva, o grupo Edge é uma estatal dos Emirados Árabes. Agora, dentro disso, tem uma série de coisas. Eles têm viaturas, tem equipamentos, tem tecnologia”, disse Derrite.

Empresa em expansão

A ditadura dos Emirados Árabes Unidos controla a Edge Group, que é um conglomerado com pelo menos 25 companhias, segundo as informações da empresa. Ela atua no ramo de defesa, o que inclui produtos ligados à guerra cibernética e vigilância de comunicações.

O noticiário internacional relaciona a empresa a operações de violação de dados em celular e de privacidade, em ações descritas como espionagem e monitoramento de informações.

O secretário Guilherme Derrite afirma que o monitoramento de celulares não faz parte do escopo do trabalho da empresa dos Emirados Árabes em São Paulo. “Nunca falei sobre isso. Zero”, disse Derrite ao Metrópoles.

Mudanças de rumo

Nessa sexta-feira (10/5), uma semana após a reunião com Degaut e outros representantes da empresa, Derrite defendeu a incorporação de novas tecnologias nas operações da Polícia Militar e afirmou que o novo edital para compra de câmeras corporais para a PM, bastante contestada pelos bolsonaristas, poderá ter sistema de reconhecimento facial, alvo de polêmica na capital.

A fala marcou uma mudança no discurso de Derrite. No início do governo, em 2023, ele chegou a prometer que iria “rever”o uso desses equipamentos na PM. Ao defender as câmeras agora, Derrite disse que elas serão integradas ao Muralha Paulista e anunciou que o governo fará uma nova compra de equipamentos ainda neste mês.

O que diz a Edge

Em nota enviada ao Metrópoles, a Edge afirma que o “assinou um acordo e um plano de trabalho com a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo” no âmbito do um “memorando de entendimento” assinado entre os governos de São Paulo e dos Emirados Árabes Unidos.

Sediada em Abu Dhabi, a empresa afirma que é “um dos principais grupos de tecnologia avançada do mundo” e que a parceria firmada com a gestão Tarcísio “envolve colaboração em vários setores, incluindo projetos de segurança pública com uso intensivo de tecnologia” no estado, “sem custo para o governo de São Paulo”.

“A iniciativa respeita os mesmos ritos institucionais de reuniões e acordos que o Edge Group mantém com outros estados e governadores, em todas as regiões do Brasil. Como uma empresa dos Emirados Árabes Unidos, estamos prontos para cooperar em projetos com qualquer estado brasileiro, bem como para fazer investimentos para gerar empregos, renda e desenvolvimento tecnológico no Brasil”, diz a nota.

Em relação ao CEO da América Latina, Marcos Degaut, a empresa afirma que “não há conflito de interesses” porque “nunca foi um ‘cliente’ do Ministério da Defesa do Brasil” e “nem da secretaria que Degaut comandou”. A empresa diz ainda que a contratação de Degaut “somente ocorreu após um período bem superior à quarentena de 180 dias recomendada para servidores públicos” e que “todos os procedimentos legais e regulamentos estabelecidos pelos órgãos competentes sempre foram respeitados”.

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