Tabata supera revés, compra briga com “marmanjos” e finca nome em SP
Candidata chega ao primeiro turno sem grandes chances de vencer eleição, mas conquista espaço na política paulistana e se projeta para 2028
atualizado
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São Paulo — Em quarto lugar nas pesquisas, a candidata Tabata Amaral (PSB) chega neste primeiro turno com poucas chances de avançar para a próxima etapa da disputa, mas com o legado de ter fincado seu nome na política paulistana com uma campanha incisiva para uma estreante.
Tabata começou a disputa já com um revés: depois de meses de articulação para formar uma chapa tendo o apresentador José Luiz Datena como seu vice, ela viu o até então aliado anunciar uma candidatura própria pelo PSDB.
O saldo da traição custaria caro para a campanha: sem a coligação com os tucanos, Tabata se viu obrigada a lançar uma chapa puro sangue com Lucia França (PSB), e embarcou na corrida eleitoral com menos recursos e tempo de TV do que havia previsto inicialmente.
O cenário das pesquisas divulgadas na pré-campanha também não era lá muito animador: Datena e Pablo Marçal (PRTB) se destacavam nos levantamentos, que já tinham Guilherme Boulos (PSol) e Ricardo Nunes (MDB) na liderança, enquanto a pessebista pontuava na quinta posição.
Um detalhe, no entanto, era repetido efusivamente pelos membros da campanha: Tabata ainda era desconhecida por boa parte do eleitorado e, com rejeição baixa, tinha potencial de crescimento.
Foi com esse dado em mente que a equipe investiu em produzir conteúdos que apresentassem a candidata para o eleitor. Tabata entrou na disputa contando sua trajetória em uma série de vídeos. No primeiro debate, na TV Bandeirantes, também começou se apresentando como uma “filha orgulhosa da periferia de São Paulo”.
Estreante na eleição pela Prefeitura, a deputada federal surpreendeu os adversários no evento ao mostrar que sabia comprar brigas duras. Foi Tabata quem primeiro questionou Nunes sobre o boletim de ocorrência de violência doméstica registrado por sua esposa contra ele. Assistindo ao debate da plateia, Regina Nunes reagiu aos gritos: “É mulher atacando mulher”.
A pessebista foi também quem primeiro expôs o histórico criminal de Pablo Marçal, trazendo à tona a condenação do influencer por participar de uma quadrilha que aplicava golpes virtuais. Naquele mesmo evento, Tabata conseguiu ainda expor o desconhecimento de Marçal sobre temas da cidade, ao questioná-lo sobre a Operação Água Branca, projeto urbanístico que o adversário pensou se tratar de uma operação policial.
Ao longo da disputa, Tabata rivalizaria com Marçal diversas vezes. O clima de embate entre os dois começou ainda em junho, quando Marçal atacou a rival dizendo em um vídeo que ela não tinha qualificação para ser prefeita porque não era casada, nem mãe.
Em resposta na época, Tabata repudiou o caráter machista da crítica de Marçal. “A gente que é mulher está sempre devendo, né? Ou é jovem, ou é velha, ou tem filho demais, ou nunca teve filho”, disse a deputada, que aproveitou o momento para expor as polêmicas do rival, como a viagem que ele fez ao Pico dos Marins, colocando em perigo um grupo que liderava.
Marçal voltaria a atacar Tabata antes da disputa ter início, dizendo que o pai da deputada federal teria morrido porque ela o deixou para estudar em Harvard, o que não era verdade. Dependente químico, o pai de Tabata cometeu suicídio enquanto ela ainda estava no Brasil.
Já na campanha, a candidata contou que foram aqueles primeiros ataques de Marçal que a fizeram pesquisar sobre seu histórico.
“Aí é quando eu começo a entender quem é Pablo Marçal e começo a ver os processos, a ver as matérias, e me choca descobrir tudo isso que eu descobri junto à minha equipe”, disse Tabata em entrevista ao Metrópoles, em setembro. “Ele não é só um cara de ideologia extrema, um cara com propostas malucas. Ele é um criminoso”.
Vendo Marçal crescer nas pesquisas, ancorado em um domínio estratégico das redes sociais, Tabata decidiu apostar no enfrentamento direto a ele. Vestida com uma jaqueta de couro e em um cenário que lembrava séries policiais, gravou vídeos sobre a condenação de Marçal por envolvimento com uma quadrilha que aplicava golpes e expôs a relação do influencer com pessoas suspeitas de ligações com o PCC.
A reação ao ex-coach, enquanto seus adversários ainda pisavam em ovos para falar sobre ele, fez com que Tabata viralizasse nas redes sociais, ganhando elogios de eleitores dos mais variados campos. Um dos vídeos teve mais de 4 milhões de visualizações.
“[Marçal] chamou essa atenção toda porque está vendendo sonho. Porque ele vira para as pessoas, nesse contexto de tanta dificuldade, e diz: ‘Você vai enriquecer, você vai prosperar, você não vai depender do salário mínimo, da CLT, que muitas vezes é tão sufocante’. Só que o Marçal é a aposta do Tigrinho. É esse o caminho que ele oferece”, afirmou a candidata.
Tabata passou a acusar o rival de liderar uma “máfia digital”, pagando em dinheiro vivo para que as pessoas o promovam de forma ilegal nas redes sociais. Seu partido, o PSB, iniciou uma batalha jurídica contra o influencer, questionando sua candidatura no Tribunal Regional Eleitoral por suspeita de abuso de poder econômico.
A ação colocou holofotes sobre o financiamento da campanha de Marçal, beneficiada pelos cortes feitos por apoiadores dele. O influencer já tinha promovido campeonatos com prêmios em dinheiro para quem publicasse cortes dele que fizessem sucesso. Marçal negou que tivesse feito o campeonato desde que iniciou a pré-campanha, mas reportagens mostraram que há indícios de pagamentos feitos depois que o influencer já havia se oficializado como pré-candidato.
Em agosto, a Justiça Eleitoral atendeu a uma liminar do PSB e mandou derrubar os perfis oficiais do candidato, autorizando Marçal a criar novas contas. O ex-coach afirmou, então, que alvo de censura e seus apoiadores passaram a apelidar a candidata do PSB de “Tabata de Moraes”, em referência ao ministro do Supremo Tribunal Federal.
A batalha nas redes e na Justiça passou também a reverberar na campanha de Tabata nas ruas, com a candidata sendo reconhecida por eleitores por sua postura contra Marçal. Nas agendas, a pessebista começou a ouvir elogios por enfrentar o rival, mas houve também quem a chamasse de “ditadora”.
Nos debates, Tabata se destacou por não poupar os adversários, com perguntas duras tanto para Nunes e Marçal quanto para Boulos, com quem divide os votos do campo progressista. Na reta final da campanha, a pessebista questionou o deputado federal sobre seus posicionamentos em temas como a legalização de drogas, as parcerias com a iniciativa privada e a situação política na Venezuela.
Tabata, no entanto, também chamou atenção por ser quem melhor equilibrou os embates com a discussão sobre propostas. Com um plano de governo focado em educação, segurança e saúde, a candidata fez promessas de levar o ensino integral para 50% das escolas, acabar com a cracolândia, e inaugurar centros de monitoramento de segurança nas 32 subprefeituras da cidade.
Criada em uma ocupação, a pessebista prometeu ainda fazer o maior programa de urbanização da história de São Paulo e disse que, se eleita, vai atacar o déficit de moradia na cidade com projetos de locação social, em que o morador paga o quanto consegue e a Prefeitura arca com o resto do aluguel.
Com a campanha intensa nas redes e nas ruas, além dos 30 segundos no programa do horário eleitoral gratuito, a candidata conseguiu avançar nas pesquisas e assumiu o lugar de Datena, que derreteu com o desempenho ruim em debates e uma postura de “anticandidato”.
Na reta final, as brigas compradas com adversários começaram a cobrar seu preço e a deputada passou a ter que se defender de ataques que questionavam sua atuação na Câmara dos Deputados.
Os principais ataques direcionados à candidata na campanha vieram de Marina Helena (Novo). No debate promovido pela Rede TV! e o UOL, a candidata do Novo insinuou, sem apresentar provas, que Tabata teria usado jatinhos para visitar o namorado, o prefeito de Recife, João Campos (PSB). A pessebista respondeu que dizendo que nunca viajou de jatinho para Recife e prometeu processar a adversária: “Isso é um delírio!”, disse Tabata.
Em outro debate, Marina disse que Tabata havia plagiado projetos de outros deputados, citando uma reportagem do UOL que mostrava que outros parlamentares já tinham proposto projetos parecidos com o Pé de Meia e o dos absorventes nas escolas antes da pessebista. Incomodada com a acusação, Tabata pediu que o público procurasse na internet quem foi a autora do Pé de Meia.
Ao longo da disputa, a deputada, que desempenhava melhor entre as mulheres do que entre os homens, passou a pedir a ajuda das eleitoras paulistanas para “salvar a eleição”, “colocando juízo” na cabeça de amigos e familiares homens sobre o suposto perigo representado por alguns candidatos.
Como mulher, no entanto, também foi vítima de ataques machistas, como a divulgação de publicações que a associavam falsamente a imagens sensuais de uma criadora de conteúdo adulto. A candidata entrou com notícia-crime na Justiça contra o caso.
Em uma conversa com mulheres, ela disse que o episódio foi o que mais a machucou em toda a campanha.
“Eu coloquei minha vida em risco [durante a campanha]. Eu tive que olhar para segurança, estou batendo de frente com muita gente poderosa, mas a coisa que mais me machucou nesta eleição foram imagens [falsas] que fizeram de mim, pornográficas. Não é justo que a forma de me desestabilizar seja [usar] imagens pornográficas feitas por inteligência artificial”, disse.
Na última semana, Tabata oscilou positivamente nas pesquisas, contrariando a hipótese de um possível derretimento de sua candidatura pelo voto útil em Boulos, que segue líder dos levantamentos. Mesmo assim, deve ficar em quarto lugar no primeiro turno, caso as pesquisas estejam certas.
No fim de semana anterior à eleição, a candidata fez um comício na Vila Missionária, bairro onde cresceu, na zona sul de São Paulo, ao lado do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), do ministro do Empreendedorismo Márcio França (PSB), e do presidente de seu partido, Carlos Siqueira (PSB), mostrando que conseguiu unir o partido em torno de sua candidatura.
Sem grandes chances de vencer a eleição desta vez, Tabata tende a terminar o pleito como uma candidata em potencial para 2028. O apoio do partido, aparentemente, ela já tem.