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SP: condomínio de luxo em região de tragédia causa polêmica no litoral

Construção de 22 casas em condomínio de luxo próximo a praias famosas em São Sebastião, no litoral norte, causa polêmica entre moradores

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1 de 1 Imagem mostra fachada de empreendimento - Metrópoles - Foto: Arquivo pessoal

São Paulo — A construção de um condomínio de luxo com 22 casas em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, tem causado polêmica entre os vizinhos. A obra fica em um terreno entre as praias da Baleia e Barra do Sahy, na mesma região onde ocorreu a tragédia do Carnaval de 2023, quando 64 pessoas morreram depois que um temporal provocou deslizamentos de terra, deixando cicatrizes até hoje na paisagem da Serra do Mar.

O terreno tem 22,9 mil metros quadrados — equivalente a pouco mais de três campos de futebol — e fica próximo ao Rio Sahy, na Avenida Deble Luísa Derani. As casas terão entre 230 e 250 metros quadrados em uma região onde, não raramente, imóveis de mesmo tamanho custam mais de R$ 10 milhões — os responsáveis não divulgaram ainda os valores.

As regras para a construção no local são rígidas e impedem, entre outras, a edificação a menos de 30 metros da margem do rio. Também não são permitidas novas obras dentro da Área de Proteção Ambiental (APA) — o terreno está fora dessa perímetro — ou sobre manguezal. Há regras também sobre manejo de caranguejos, já que foram detectadas cinco espécies no local.

Os proprietários conseguiram todas as licenças e autorizações necessárias para levar a obra em frente. Moradores da região, entretanto, questionam a realização do empreendimento no local.

“Da noite para o dia, eles desmataram uma área enorme, foi algo violento, agressivo para os olhos. A gente não sabia, até então, se havia uma base legal para isso”, diz o advogado Fernando Castelo Branco, que faz parte da Associação Amigos Barra do Sahy (Sabs). “De qualquer forma, nos dias atuais, estamos em uma área de Mata Atlântica, circundando a Área de Proteção Ambiental (APA) e ali é uma área de mangue”, afirma.

Castelo Branco chegou a acionar autoridades a respeito, questionando a legalidade do empreendimento. “Não tenho elementos para isso [dizer que é ilegal]. Mas, realmente, chamou a atenção de todo mundo aqui. Não tivemos uma resposta à altura por parte dos entes públicos, principalmente do Ministério Público”, diz Castelo Branco.

Em outras ocasiões, a associação conseguiu impedir a construção de empreendimentos na região, como no caso do condomínio Reserva da Mata — há uma vitória em primeira instância impedindo a construção.

Sobre a obra em andamento atualmente, Castelo Branco diz que houve um impedimento para que prosseguisse entre novembro de 2023 e abril deste ano, período de reprodução dos caranguejos — a associação contratou uma consultoria que produziu um laudo atestando o impacto. “Aí, houve um embargo temporário. Eles, estrategicamente, recuaram. Mas, em abril, retomaram com toda força”, diz.

Em meio a disputas na região, o próprio Castelo Branco é alvo de críticas por ter imóvel próximo ao rio. O advogado diz que comprou dois terrenos, sendo que um deles era para ser um condomínio com seis casas, mas não foi para frente por causa de empreendedores.

“Em cima desse terreno, fiz a minha casa. Tirei todas as estacas. Minha casa é toda palafitada, toda ecologicamente correta. Tem outro terreno contíguo ao meu, que era uma imobiliária, e tinha uma casa de pescador. Dois imóveis pré-existentes. Não mexi em absolutamente nada”, afirma.

Além da associação do Sahy, moradores da Rua Maria Caetana, entre o Sahy e a Praia da Baleia, também criticam a construção do condomínio na vizinhança.

Vila Sahy

A tragédia de 2023 atingiu em cheio a Vila Sahy, o lado menos abastado da região, que fica após a Rodovia Rio-Santos, no pé da Serra do Mar e a 1 km do local onde está sendo construído o condomínio.

Morador da Vila Sahy e integrante do coletivo União dos Atingidos, Leandro dos Santos afirma que, desde pequeno, entendeu o terreno onde será construído o condomínio como parte de um manguezal, um lugar por onde passam caranguejos.

“Pouco a pouco, estamos perdendo as áreas de alagamento, responsáveis por sugar o excesso de chuva. Estão sendo aterradas para a construção de casas, condomínios, lojas e assim por diante. Vai vir com o tempo, quando der uma chuva e diminuir a vazão de água. Para quem não sabe, vai perguntar por que isso estará acontecendo”, diz. “Para mim, o impacto ali vai ser com qualquer chuva. Não só na Barra do Sahy, mas também aqui [na Vila]”, afirma.

Santos questiona a liberação de licenças para construção de imóveis em algumas regiões costeiras. “Você vai pegar muitas construções que, se eu for construir 1% do que estão fazendo, no mesmo tipo de ambiente, vou tomar multa, processo e assim por diante. Corro até risco de ser preso. Já esse povo, não”, diz.

Licenças

A Trafa Empreendimentos Imobiliários é responsável pela obra. Os sócios afirmam que cumpriram todas as exigências necessárias para fazer o condomínio. “Contratamos equipes justamente para fazer o processo como se deve. A gente está se baseando em todos os laudos. Não batemos um prego até ter 100% em ordem”, afirma Roberto Dreifus.

Os proprietários afirmam que a obra tem sido até mais rigorosa que o exigido pelo código ambiental. Os donos do terreno dizem que existe uma exigência de 30 metros de distância para o rio, mas a obra está a 60 metros. “A gente não fez nada de errado. Nós fizemos tudo com o maior critério possível”, afirma João Henrique Guerini.

Os responsáveis pela construção das casas afirmam quem foram dois anos e meio para obter as aprovações necessárias para dar início à obra. “Quanto às críticas dos vizinhos, é uma questão muito particular de cada um”, diz Guerini. “Compramos esse terreno há um tempão. Estamos falando de algo de 15 anos”, diz Dreifus.

Monitoramento

Representante do Instituto de Conservação Costeira (ICC), a advogada Fernanda Carbonelli afirma que, como entidade socioambiental que atua na região contra o crescimento desordenado, o ICC se manifestou dizendo que o empreendimento está fora dos limites da APA (Área de Proteção Ambiental) Baleia Sahy e apresentou as licenças exigidas.

“O ICC permanece monitorando a região e que qualquer constatação de falha de implantação do projeto e desvio de licenças concedidas, com certeza, iremos acionar os órgãos compententes para a proteção do nosso território, que trata de área sensível”, diz Fernanda.

O que dizem as autoridades

A Prefeitura de São Sebastião afirma que a obra, em relação à parte ambiental, tem aprovação dos órgãos estaduais como Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais do Estado (Graprohab) e Companhia Ambiental de São Paulo (Cetesb).

“Independente disso, a prefeitura acompanha todas as obras que são aprovadas no município por meio das fiscalizações de obras e meio ambiente”, diz a administração municipal, que entende que o empreendimento respeita as legislações aplicáveis.

“Caso ocorra da obra ser executada em desacordo com o projeto aprovado, a fiscalização municipal autuará a mesma e comunicará o órgão responsável pelo licenciamento do empreendimento para que sejam tomadas as medidas cabíveis”, diz, em nota.

A Cetesb diz que o empreendimento foi objeto de autorização via Graprohab e atende a todos os dispositivos legais ambientais incidentes na área, como Código Florestal, Lei da Mata Atlântica e Zoneamento Ecológico-Econômico do Litoral Norte.

“O local está fora de Área de Preservação Ambiental (PP) e a autorização implica em metas de preservação e compensação ambiental”, diz a Cetesb.

Procurado no último dia 7/11, o Ministério Público de São Paulo (MPSP) não se manifestou até a publicação da reportagem. O espaço segue aberto.

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