“Se eu não sair, vou falir”, diz comerciante sitiada pela Cracolândia
Com dívida de R$ 25 mil, comerciante fecha lojas no centro de SP após 20 anos na região, por causa dos usuários de drogas da Cracolândia
atualizado
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São Paulo — Os três comércios tocados pela empresária Marlize Sorge na República, centro de São Paulo, estão com os dias contados. Depois de 20 anos na região, ela desistiu dos pontos e vai se mudar para o litoral paulista.
“Se eu não sair, vou falir”, afirma Marlize. A empresária acumulou uma dívida de R$ 25 mil de aluguel desde que usuários de drogas da Cracolândia se dispersaram pelo centro da capital paulista.
A presença dos dependentes químicos na região afastou os clientes e derrubou as vendas nos três comércios tocados por ela.
“O centro de São Paulo está sendo destruído”, afirma Marlize. A lojista conta que o proprietário dos pontos tem sido compreensivo com a dívida do aluguel porque entende a complexidade da situação.
Desde que os usuários saíram da Praça Princesa Isabel, no ano passado, os tumultos envolvendo dependentes químicos têm se tornado cada vez mais comuns. Nessa terça-feira (12/7), usuários de drogas atacaram pelo menos seis ônibus e um caminhão na altura da Rua Aurora (veja vídeo).
“Minha funcionária teve que abaixar a porta da loja três vezes ontem [terça]”, afirma a empresária.
Os casos de assaltos e furtos na região também aumentaram. Entre janeiro e maio deste ano, o 3º Distrito Policial, que atende os bairros atingidos pela Cracolândia, registrou 3.438 roubos. Um aumento de 13% em relação ao mesmo período do ano passado.
O crescimento dos furtos foi ainda maior, quase 23%. Os casos saltaram de 4.209 nos quatro primeiros meses de 2022, para 5.173 em 2023.
Moradora da República há 35 anos, Marlize diz que tem vivido uma rotina de cansaço e medo nos últimos meses tanto no trabalho quanto em casa.
No prédio em que mora, na Rua Vitória, apenas 8 dos 40 apartamentos estão ocupados. Os outros ficaram vazios depois que um grupo de usuários passou 90 dias instalado em frente à fachada. “Tinha que pedir licença para os usuários”, conta a empresária.
Agora, ela alugou uma casa em Bertioga, no litoral paulista, e está em contato com imobiliárias para abrir as três lojas na cidade litorânea.
Comércio prejudicado
O prejuízo enfrentado por Marlize é relatado também por outros comerciantes do bairro. Dono de uma autopeças na Santa Ifigênia há 36 anos, Tiago Garcia diz que o fluxo de usuários tem atrapalhado todas as lojas.
O comércio dele teve uma queda de 50% no movimento no último ano por causa da violência. “O pessoal vem para comprar e é roubado”, afirma o empresário.
Tiago diz que tenta negociar uma redução no aluguel, mas até agora não teve sucesso.
Um comerciante da Rua Conselheiro Nébias que preferiu não se identificar conta que a proprietária do ponto interrompeu a cobrança do aluguel por causa da Cracolândia.
“Ela mesma já falou: ‘nem paga enquanto não resolver o problema aí’”, afirma o lojista. Ele diz que outros proprietários têm feito acordos do mesmo tipo com seus locatários por medo de não conseguir novos lojistas para os pontos.
“Se fechar a loja não aluga. Aí fica com a loja fechada, tem que fiscalizar para ninguém roubar, para não entrar”, diz o comerciante.
O Metrópoles questionou a Secretaria de Segurança Pública sobre a segurança na região. A pasta afirma que desde o início do ano, tem atuado para combater a criminalidade na área central da capital.
“O policiamento ostensivo foi ampliado, com o incremento de 120 militares a mais diariamente, além do trabalho de investigação por meio das operações, que permitiram o aumento do número de prisões na área”, diz a nota.
Segundo a SSP, a área da 1ª Seccional, responsável pelo centro, teve aumento de 46,79% no número de prisões nos cinco primeiros meses do ano (2.933), quando comparado ao mesmo período do ano passado (1.998).