“Cotistas e pobres”: PUC cria comissão para analisar ofensas de alunos
Diretor da PUC diz que comissão é composta por três professores e presidida por um educador negro. O caso também é investigado pela polícia
atualizado
Compartilhar notícia
São Paulo — A Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP) criou uma comissão para analisar a atuação de alunos nas ofensas contra estudantes de direito da Universidade de São Paulo (USP), com gritos de “cotistas e pobres”. O caso aconteceu no último sábado (16/11), durante os Jogos Jurídicos Estaduais (JJE), em Americana, no interior de São Paulo.
Em entrevista ao Metrópoles, o diretor do curso de Direito da PUC, Vidal Serrano, contou que a comissão é formada por três professores e é presidida por um educador negro. Segundo ele, os docentes vão analisar quantos alunos participaram das ofensas e se a ação é plausível de uma expulsão.
“Isso não é um inquérito policial, nós nem temos competência pra isso… A ideia é verificar se está faltando alguma coisa que possamos fazer”, afirmou Vidal Serrano. Questionado sobre a chance de expulsão dos estudantes, o diretor afirmou que existe sim a possibilidade e que a comissão “vai avaliar as sanções”.
Ainda de acordo com Serrano, a faculdade está trabalhando na criação de um grupo de estudos de direito desportivo. O plano é que o coletivo elabore uma proposta de código ético de conduta em jogos universitários.
Ofensas
Vídeos do momento das ofensas, com gritos de “cotistas” e “pobres”, circulam nas redes sociais. A organização do JJE manifestou repúdio aos gritos proferidos. “Tais atitudes são inaceitáveis e vão contra os princípios de respeito, igualdade e dignidade que defendemos e promovemos”, disse em nota.
Veja:
Segundo os organizadores, todas as associações atléticas decidiram que os jogos da PUC-SP “a serem realizados nas rodadas restantes da edição de 2024 ocorrerão sem a participação da respectiva torcida”. “Ainda chegou ao nosso entendimento que as devidas ações já foram feitas contra os agressores, visando assegurar que os atos racistas registrados sejam investigados e responsabilizados conforme a lei”, acrescentaram.
Manifestações das faculdades
O Centro Acadêmico XI de Agosto, representante dos alunos da Faculdade de Direito da USP, no Largo São Francisco, disse, em nota, que foi “surpreendido com espanto, indignação e revolta com o episódio criminoso de ofensas racistas e aporofóbicas proferidas por alunos da Faculdade de Direito da PUC-SP contra franciscanos”.
“As injúrias racistas e aporofóbicas contra alunos da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo são uma violência contra toda a comunidade franciscana. É nas academias de direito que se formam os profissionais que deveriam operar contra injustiças, injúrias e preconceitos de classe e raciais, mas não é essa a realidade”, afirmou o XI de Agosto, em nota.
Representante de alunos da PUC, o Centro Acadêmico 22 de Agosto também manifestou “repulsa às falas racistas e classistas de estudantes do curso de direito”. “A PUC-SP é uma instituição com histórico de luta pela igualdade social e racial no Brasil. Não há lugar no curso de direito da PUC-SP para indivíduos racistas e classistas. Tal episódio criminoso deve ser apurado com absoluto rigor, garantido o devido processo legal”, destacou a entidade, no comunicado.
O 22 de Agosto também afirmou que pedirá à universidade a expulsão “daqueles que comprovadamente se envolveram neste lamentável episódio”. “O Centro Acadêmico conclama as demais entidades a também se somarem nessa luta por apuração e repulsa ao racismo e a toda e qualquer forma de violência e descriminação”, pontuou.
Estagiários demitidos
Quatro estudantes já identificados foram demitidos de estágios em escritórios de advocacia. São eles Tatiane Joseph Khoury, Arthur Martins Henry, Matheus Antiquera Leitzke e Marina Lessi de Moraes.
Em nota oficial enviada ao Metrópoles, a empresa Machado Meyer Advogados comunicou que “alinhada com os seus valores institucionais e o seu compromisso inegociável com a promoção de um ambiente inclusivo e respeitoso” decidiu pelo desligamento de Marina Lessi de Moraes.
O escritório Tortoro, Madureira e Ragazzi confirmou que Matheus Antiquera Leitzke foi demitido. “Não toleramos, por parte de nossos profissionais, qualquer prática de atos de racismo ou qualquer tipo de preconceito contra quem quer que seja”, apontou.
O Castro Barros Advogados, que desligou Arthur Martins Henry, repudia quaisquer práticas discriminatórias. No mesmo sentido, a firma Pinheiro Neto Advogados lamentou o caso e garantiu que Tatiane Joseph Khoury não integra mais a equipe: “O escritório reitera que não tolera e repudia racismo ou qualquer outro tipo de preconceito.”
Investigação
A reitoria da PUC-SP determinou a apuração do episódio envolvendo alunos da Faculdade de Direito que chamaram estudantes da USP de “cotistas” e “pobres”.
“A reitoria determinou à Faculdade de Direito a apuração dos fatos, com o rigor necessário, a partir das normas universitárias e legais, promovendo a responsabilização e conscientização dos envolvidos”, declara, em nota. “Manifestações discriminatórias são vedadas pelo Estatuto e pelo Regimento da Universidade, além de serem inadmissíveis e incompatíveis com os princípios e valores de nossa instituição”, afirma.
A reitoria também informa que a PUC-SP promove a inclusão social e racial, por meio de programas de bolsas na graduação e na pós-graduação, bem como de permanência dos estudantes bolsistas. “Além disso, participa da criação das políticas públicas de inclusão, como o Prouni e o Fies.”
A Secretaria da Segurança Pública (SSP) afirmou que o caso é investigado por um inquérito policial instaurado para apurar o ocorrido. Ainda de acordo com a pasta, as vítimas estão sendo ouvidas, e os vídeos apresentados estão sob análise da equipe de investigação.