Projeto recria clássico da literatura infantil em CEU da Brasilândia
Alunos do 7º ano questionaram professora sobre histórias antigas e adaptaram o clássico “O Pequeno Polegar” para a periferia dos dias atuais
atualizado
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São Paulo – A história do Pequeno Polegar, clássico da literatura infantil, ganhou novos cenários e personagens nas mãos dos alunos de duas turmas do 7º ano da CEU EMEF Jardim Paulistano, no distrito da Brasilândia, na zona norte de São Paulo.
Orientados pela professora de leitura Thatiana Galante de Sá, os estudantes fizeram uma releitura do conto e produziram 15 textos para o livro “O Pequeno Polegar na Quebrada”.
Na obra dos alunos, as aventuras do protagonista acontecem na região da Brasilândia, onde os estudantes moram e estudam. O projeto levou a professora Thatiana a ser uma das vencedoras do Prêmio Educador em Destaque, realizado pela Prefeitura de São Paulo, nesta sexta-feira (6/10).
A educadora ficou em 5º lugar na premiação, que remunerou docentes por projetos pedagógicos realizados no ano de 2022.
Thatiana conta que a ideia de desenvolver um livro com os alunos surgiu depois que eles começaram a questionar alguns trechos das histórias clássicas.
“Eles começaram a contestar os textos. ‘Poxa, isso aqui hoje em dia não funciona’. ‘Onde já se viu um homem falar desse jeito com uma mulher?’”, afirma Thatiana.
Ela decidiu, então, instigar os estudantes a repensar os clássicos. Para isso, escolheu uma obra que eles haviam lido em sala há pouco tempo, “O Pequeno Polegar”.
“E se essa história acontecesse aqui no distrito da Brasilândia? Se acontecesse aqui no Paulistano? Se o Pequeno Polegar existisse agora, como que ele seria? Como ele se comportaria, por quais lugares ele passaria?”, disse ela aos estudantes.
Missão livro
As turmas ganharam a missão de repensar o conto clássico. Para isso, Thatiana propôs exercícios para que os alunos estudassem o local em que viviam.
“Nós fizemos pesquisa na internet, assistimos reportagens e lemos notícias de jornal para saber como a nossa comunidade é retratada”, afirma a professora.
As pesquisas mostraram um olhar preconceituoso e raso sobre a região, com extenso material sobre os casos de violência no bairro e poucas informações sobre os pontos positivos do local.
“Nós discutimos sobre tudo isso. Sobre o que é a Brasilândia, o que acontece aqui. Qual a experiência deles morando aqui, da família deles”, diz a professora.
Dos debates em sala de aula saiu a ideia de que as releituras dos contos clássicos ajudassem a apresentar a região para quem é de fora dela.
“Para que quem não mora aqui tivesse uma ideia do que é viver na nossa comunidade, o que é a Brasilândia, esse lugar tão imenso que comporta tantas famílias e tantas realidades diferentes”, afirma Thatiana.
Além dos textos, as turmas também foram incentivadas a produzir ilustrações para acompanhar os contos.
O livro foi finalizado em novembro de 2022 e a direção da escola mandou imprimir cerca de 70 cópias – uma para cada aluno envolvido no projeto e algumas a mais para manter na sala de leitura do colégio.
As impressões só ficaram prontas neste ano e, para celebrar, a professora decidiu organizar uma sessão de autógrafos com os pais dos estudantes. O evento foi um sucesso.
“Eles ficaram muito empolgados e felizes”, diz a educadora, contando que o projeto ajudou a resgatar a autoestima dos alunos. Thatiana diz que os estudantes também passaram a se envolver mais em outras atividades escolares.
“Estão mais envolvidos nos projetos escolares e com menos problemas disciplinares”, afirma.
Ela diz que o projeto mostra o potencial e o talento dos alunos, mesmo com todas as vulnerabilidades sociais da região.
Assim como os estudantes, Thatiana também mora na Brasilândia e, quando criança, ouviu que não poderia sonhar alto por causa do lugar onde vivia.
“Os meus próprios professores da escola me falavam ‘isso que você está sonhando é impossível para quem mora aqui’”, diz ela.
Mas a professora não desistiu de sonhar. Entrou na Universidade de São Paulo (USP), se formou em Letras e Pedagogia, e decidiu voltar à escola pública para incentivar seus alunos.
“Eu queria que outros alunos pudessem acreditar neles mesmos e saber o potencial que eles têm”, diz Thatiana. “Eu acredito que eles começaram a enxergar isso”, afirma ela.