Preso é condenado a mais 4 anos de cadeia por redigir estatuto do PCC
Presidiário de 34 anos foi condenado nessa segunda-feira (24/6) após agentes penitenciários encontrarem com ele “cartilha do crime” do PCC
atualizado
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São Paulo – Um presidiário de 34 anos aumentou sua pena em mais quatro anos após ser condenado, nessa segunda-feira (24/6), por redigir o chamado “estatuto de PCC“. O documento foi encontrado no bolso de uma calça do criminoso, em uma revista feita antes de ele ir para a enfermaria no Presídio de Presidente Bernardes, no interior de São Paulo, em 8 de março do ano passado.
O documento de normas de conduta do Primeiro Comando da Capital (PCC), também conhecido como “cartilha do crime”, contém 45 regras que servem como parâmetro para eventualmente punir o que é considerado como desvio pela maior facção criminoso ao país.
Como já mostrado pelo Metrópoles, o código de conduta não se restringe somente ao sistema carcerário. Ele também é imposto a seus integrantes, em liberdade, e moradores de regiões controladas pela organização criminosa — majoritariamente periferias das cidades paulistas. Quando a “lei do crime” é desrespeitada, a facção realiza os chamados “tribunais do crime”, também conhecidos internamente como tabuleiros.
Ameaças a agentes
Nas sete folhas de papel almaço, encontrados no bolso da calça de Gilberto dos Santos Júnior, constavam as mesmas 45 regras usadas pelo PCC fora dos muros das penitenciárias. O flagrante ocorreu no pavilhão 5 da unidade carcerária.
Ele negou ser membro da facção, de acordo com o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), mas admitiu ter feito uma cópia manuscrita do estatuto. A autoria do documento do crime foi comprovada oficialmente, por meio de um exame grafotécnico, feito a pedido da Polícia Civil.
Além das regras de conduta, no verso de uma das folhas apreendidas no presídio havia anotações insinuando ameaças a agentes penitenciários de Presidente Bernardes, “devido à ocorrência de opressão e covardia por parte dos funcionários”, como consta em registros judiciais.
“Todo mundo precisa obedecer à cartilha de conduta, não só o PCC. A facção cobra de toda a periferia, de toda a comunidade em que está presente. Por isso que matam, nos tribunais do crime, os estupradores. É um artigo da cartilha de conduta”, afirmou em entrevista ao Metrópoles o promotor Leonardo Romanelli, coordenador do Núcleo de Inteligência e Gestão de Conhecimento do Ministério Público de São Paulo (MPSP).
Além da pena de morte, a facção pude quem descumpre suas regras com espancamentos.
“Mão na cumbuca”
Uma das ações punidas geralmente com espancamentos (assista abaixo) é roubar em locais proibidos pela facção. O “sentenciado” pode ter, inclusive, membros quebrados com o uso de pedaços de madeira.
O artigo 31 do código de conduta, chamado “mão na cumbuca”, prevê punição à pessoa que é suspeita de roubar dinheiro, drogas ou armas do PCC, considerado um dos crimes mais graves pela facção. A pena nesses casos é a morte, com requintes de crueldade e “assinaturas”, como furar os olhos do executado.
Cultura do medo
“As pessoas não têm noção das barbaridades que eles cometem. Eles têm um número de pessoas para matar”, afirmou o promotor Leonardo Romanelli.
A cota de mortes existe, segundo Romanelli, para que seja mantida a submissão da população às regras da facção, criando uma cultura de medo. Sempre haverá alguém que irá descumprir alguma regra, por causa do vasto número de “artigos do crime”, que são interpretados da forma que os líderes da facção julgarem mais conveniente.
Membros chamados de padrinhos, pelo fato de indicarem integrantes para o PCC, também podem ser responsabilizados por condutas erradas cometidas por seus “afilhados”. As punições nesses casos dependem da gravidade do desvio e de quem irá julgá-lo.
“Tribunais do crime” do PCC
O que é chamado de “tribunal do crime” foi instituído no início dos anos 2000 por Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola, apontado como líder máximo do PCC, quando ele criou o setor de “disciplinas” dentro da facção.
Os indivíduos nessa posição são responsáveis por garantir o cumprimento das regras da organização, podendo aplicar punições caso as “normas” sejam descumpridas. Para isso, porém, é necessário um julgamento cuja sentença é dada por criminosos do alto escalão da facção.
Investigações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do MPSP, mostram que Marcola descentralizou as ações financeiras do PCC, dividindo-as em células, ligadas a outras maiores, que chegam a um núcleo central.
A figura do disciplina nasceu para servir como uma espécie de “corregedor” das ações financeiras do PCC. Com o tempo, ele passou a julgar qualquer demanda apresentada, em um sistema de justiça marginal, pautado nos preceitos da facção.