Primeira leva de secretários indica “bolsonarismo light” de Tarcísio
Montagem da equipe do governador eleito de SP aponta para uma direita mais moderada que a base bolsonarista que ajudou a elegê-lo
atualizado
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São Paulo – A primeira leva de secretários anunciada pelo governador eleito Tarcísio de Freitas (Republicanos), para postos-chave da administração, indica que o futuro governo de São Paulo deve refrear a influência da base bolsonarista mais radical que ajudou a elegê-lo em outubro.
O “bolsonarismo light” de Tarcísio busca amarrar em São Paulo o apoio majoritário que liberais e conservadores deram ao presidente Jair Bolsonaro (PL), com promessas de privatizações e cargos para evangélicos, mas se afastando dos temas mais ideológicos encampados por seu padrinho político, que renderam enorme desgaste com a opinião pública, como a resistência à vacinação.
Essa versão do ex-ministro bolsonarista e futuro governador ficou mais evidente com as sete nomeações que ele anunciou para o seu secretariado nas duas primeiras semanas da transição de governo em São Paulo.
Dois são quadros técnicos de confiança de Tarcísio, um é pastor evangélico e filiado ao Republicanos e três são do aliado PSD, incluindo o próprio presidente da sigla, Gilberto Kassab, que será o homem-forte do governo. Apenas um é oriundo do bolsonarismo e, ainda assim, também tem exibido uma versão mais “light”.
Indicados
O primeiro nome confirmado por Tarcísio foi o do empresário Renato Feder, secretário da Educação do Paraná, que assumirá a mesma pasta em São Paulo. No estado vizinho, ele terceirizou a empresas privadas serviços como merenda, segurança e até a administração de escolas, medida que governos do PSDB discutiram em São Paulo por anos mas nunca adotaram diante da resistência de sindicatos e partidos de oposição.
Embora a gestão de Feder tenha ampliado o número de escolas cívico-militares no Paraná, uma das bandeiras do bolsonarismo na Educação, o projeto foi executado por determinação do governador Ratinho Junior (PSD), aliado de Bolsonaro. Com Feder, o Paraná assumiu a liderança nacional no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que mede a qualidade do ensino no país. A ideia é replicar o modelo em São Paulo, sem entrar nas polêmicas fomentadas pelos bolsonaristas mais radicais, como os projetos de homeschooling e escola sem partido.
Já na Saúde, Tarcísio escolheu o ex-deputado federal Eleuses Paiva, professor da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto e que já confrontou publicamente as ideias defendidas pelos aliados do presidente Bolsonaro na pandemia, como em relação ao uso de máscaras, ao distanciamento social e à vacinação.
Tanto Paiva quanto Feder são ligados ao PSD de Gilberto Kassab, que foi anunciado como secretário de Governo e será o grande articulador político da gestão Tarcísio. A escolha aponta para um governo muito mais pragmático do que ideológico. Basta lembrar que enquanto monta o primeiro escalão paulista ao lado de Tarcísio, Kassab negocia ministérios no governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), rival de Bolsonaro.
Extrema confiança
Para comandar duas pastas centrais do governo, Tarcísio escolheu duas pessoas de sua confiança, também sem qualquer vínculo com o bolsonarismo. Na Casa Civil, colocou o advogado e amigo Arthur Lima, que foi seu colega da Academia Militar das Agulhas Negras e presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL) durante a gestão de Tarcísio no Ministério da Infraestrutura. Ele ficará responsável pelo “monitoramento” de todas as ações do governo.
Já para assumir uma função semelhante à que exerceu no governo Bolsonaro, o governador eleito optou pela procuradora federal Natalia Resende, que o auxiliou na estruturação de projetos de concessões, privatizações e Parcerias Público-Privadas (PPPs) no governo federal. Ela comandará uma supersecretaria, que unirá Infraestrutura, Transportes e Meio Ambiente, desbancando nomes alinhados ao bolsonarismo, como o ex-ministro do Meio Ambiente e deputado federal eleito Ricardo Salles (PL).
Bolsonarista
Até agora, apenas a Secretaria de Segurança Pública foi entregue a um “bolsonarista raiz”: o deputado federal Guilherme Derrite, conhecido como Capitão Derrite. Embora seja um ex-oficial das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), da Polícia Militar, que já se envolveu em polêmicas ao defender a morte de suspeitos em confrontos, Derrite também já tem dado sinais de um discurso mais moderado durante o governo de transição.
Bastante midiático, o futuro secretário tem experiência em lidar com a imprensa – já foi porta-voz do Corpo de Bombeiros – e tem dito aos jornalistas que fará uma gestão “transparente” e “próxima” à imprensa, postura bem diferente da adotada por Bolsonaro, a quem Derrite se diz grato por sua primeira eleição como deputado, em 2018.
O último nome anunciado na primeira leva de secretários foi o do deputado federal Roberto de Lucena (Republicanos), para a pasta do Turismo. Lucena é pastor evangélico e sua indicação foi vista como um afago de Tarcísio à base religiosa que ajudou a elegê-lo. Mas a trajetória do futuro secretário, que já atuou na mesma pasta no governo Geraldo Alckmin, também demonstra uma atuação menos ideológica do que pregam algumas lideranças mais fanáticas.
Encontro com Alexandre
O mais recente sinal do “bolsonarismo light” de Tarcísio, que tem demonstrado disposição em reconstruir relações rompidas por Bolsonaro e seus apoiadores mais fiéis, foi o encontro com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, ocorrido na sexta-feira (2/11), e revelado pelo colunista do Metrópoles Igor Gadelha. Moraes virou inimigo número 1 do bolsonarismo e tem tentado manter certa influência em alguns setores do governo paulista, como na Segurança Pública, pasta que ele já comandou no governo Alckmin.