Em 2 anos, prefeitura multiplica por sete gasto com obra sem licitação
A Prefeitura de São Paulo gastou 7 vezes mais com obras contratadas sem licitação em 2022 do que desembolsou em 2020, na gestão Bruno Covas
atualizado
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São Paulo – A Prefeitura multiplicou por sete, em apenas dois anos, o dinheiro público que está sendo gasto com obras feitas sem licitação em São Paulo sob o argumento de que são serviços de emergência, que não podiam esperar uma licitação comum.
Em 2020, último ano de mandato completo do prefeito Bruno Covas, morto em maio de 2021, a Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras gastou cerca de R$ 128,9 milhões com obras emergenciais, segundo dados do Tribunal de Contas do Município (TCM).
No ano passado, já sob governo Ricardo Nunes (MDB), de acordo com o Porta da Transparência paulistano, esse valor saltou para R$ 917,2 milhões, ou um crescimento de 611%, nos serviços executados por empresas terceirizadas para serviços de construção ou reconstrução de galerias, reparos ou ampliações de ruas e obras correlatas.
‘Emergência’ que espera meses
A legislação permite que o processo de licitação seja dispensado para a contratação de empresas para realizar obras de emergência, que possam por exemplo colocar pessoas em risco. A escolha da empresa pode ser feita após uma cotação simples com três concorrentes.
Mas nem todos os serviços de emergência são contratados assim que um problema é identificado, como mostram os processos administrativos dessas contratações, obtidos pelo Metrópoles. As obras de emergência podem durar meses para começar, exatamente como em uma licitação comum.
O relatório que embasou uma dessas contratações emergenciais, de uma obra de contenção de talude, recomposição de via e serviços afins realizada na Rua da Cidreira, Jaçanã, extremo norte da cidade, exemplifica o cenário.
O relatório foi encomendado para analisar uma cratera que surgiu na via. Ele que atesta a situação ser “de risco eminente, exigindo rigorosas e imediatas providências”.
Mas o documento, produzido em maio, informa que a causa do acidente foram “as chuvas fortes que atingiram a região em janeiro”, quatro meses antes, que “causaram o desabamento de muro de alinhamento e edificação da rua”. O contrato de emergência, de R$ 6,6 milhões, só foi assinado em setembro.
As obras da Rua da Cidreira foram executadas pela FFL Sinalização, Comércio e Serviços, a empresa que mais executou obras sem licitação na cidade em 2022, segundo a página da Transparência. Foram oito contratos, que totalizaram R$ 102 milhões.
A empresa, constituída como um comércio de autopeças em 2006 e com capital social de R$ 10 mil, alterou sua atividade em 2015 para obras sinalização de rodovias e obras em 2015, com o aumento de capital para R$ 1 milhão, passando a disputar licitações no interior paulista.
Por meio de nota, a empresa afirmou que “todos os serviços prestados para a Prefeitura de São Paulo foram executados dentro do devido processo legal, inclusive nos casos de dispensa de licitação”.
Prefeitura defende obras
A Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb), responsável pelos contratos de obras sem licitação, foi questionada sobre o motivo de o número de obras feitas sem processo de licitação ter aumentado tanto, mas não respondeu.
A pasta, chefiada pelo secretário Marcos Monteiro, enviou uma nota em que afirma que “a contratação emergencial é um ato legal e legítimo diante de situações que possam colocar os paulistanos em risco” e que “as contratações emergenciais, previstas em legislação vigente, são realizadas exclusivamente em situações onde a vida das pessoas está em risco, ou quando a integridade de alguma estrutura apresenta estado crítico”.
Segundo a nota, a Prefeitura só contrata empresas previamente cadastradas e que tem atestados de capacidade técnica para a execução dos serviços.
“Estudo realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) no último ano, que teve como tema as ações emergenciais da Siurb no campo da drenagem urbana, comprovou os benefícios gerados à população por essas obras”, segue o texto.
“O estudo apontou que houve redução entre 9% e 11% na intensidade das enchentes, redução de 66% nos casos de afogamentos nas ruas além de demostrar que, embora não seja possível mensurar o valor de uma vida humana, o benefício social gerado pelos óbitos evitados é de R$ 2,25 bilhões”, finaliza nota.