PRF suspeita de agentes públicos em esquema do falso Uber no aeroporto
Esquema milionário de Uber clandestino que aplica golpes em passageiros foi identificado pela PRF no Aeroporto Internacional de Guarulhos
atualizado
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São Paulo – O setor de inteligência da Polícia Rodoviária Federal (PRF) investiga se agentes públicos estão envolvidos na quadrilha do Uber clandestino que aplica golpes, extorsão e sequestro de bagagens de passageiros do Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, na região metropolitana.
Nesse sábado (14/1), o Metrópoles revelou, com exclusividade, que uma quadrilha de falsos motoristas de aplicativo arrecada cerca de R$ 8 milhões por mês com o esquema dentro do maior aeroporto do país. Até o momento, a PRF já identificou 140 veículos usados pelo grupo.
A suspeita sobre um possível envolvimento de agentes públicos no esquema surgiu por causa do “silêncio” interno diante da atuação da quadrilha, que aborda os passageiros dentro dos terminais, na área de desembarque. Há ainda índicios de intimidação de taxistas, que são diretamente prejudicados pela ação dos criminosos.
“O que gerou uma dúvida em nossos levantamentos foi esse poder de intimidação, que faz todo mundo se calar ali dentro [aeroporto]. Ele [silêncio] resulta só da organização criminosa, ou a situação está assim porque existe o envolvimento de agentes públicos?”, indaga o superintendente da PRF em São Paulo, Fernando Miranda.
Após cerca de um ano e meio de levantamentos, Miranda afirma que a PRF acionou a Polícia Civil do aeroporto, para que ela passe a colaborar na identificação de suspeitos, assim como em suas prisões, e na investigação sobre como é feita a lavagem de dinheiro da quadrilha.
“Eles [criminosos] vão guardar o dinheiro embaixo do colchão? Não acredito nisso. Então quando se percebe que há um volume de dinheiro desse jeito [milhões de reais], que existe um poder de intimidação e hierarquia, estamos falando de uma organização criminosa estruturada”, destaca Miranda.
Esquema milionário
Quando o esquema foi identificado, os criminosos mantinham uma frota clandestina estacionada em um bolsão, chamado pela quadrilha de “fazendinha”, perto do hangar de uma companhia aérea, nas proximidades do Terminal 3. Segundo a PRF, enquanto os motoristas ilegais aguardavam no estacionamento, outros criminosos – conhecidos como “puxadores” ou “pescadores” – abordavam as vítimas nos desembarques internacionais.
No caso de algum passageiro concordar com a viagem, os motoristas eram acionados, se dirigindo para os terminais. A estratégia era usada, segundo a polícia, para evitar abordagens dentro do aeroporto. Com a intensificação dos trabalhos da PRF, na Rodovia Hélio Smidt, a quadrilha mudou sua forma de ação. Os próprios condutores dos veículos passaram a “pescar” as vítimas, abordando-as nos desembarques internacionais.
Para atrair as vítimas, os criminosos oferecem valores abaixo dos calculados pelos aplicativos, mas fingindo ser colaboradores das empresas. O Metrópoles apurou que os criminosos argumentam que, para o motorista não ter sua parte descontada pelo app, ele faz a corrida sem usar o sistema legalizado. Eles usam os logotipos da Uber e da 99, aplicativos oficiais de transporte de passageiros, para ludibriar os passageiros.
Hierarquia criminosa
O Terminal 3, onde chegam passageiros da Europa e Estados Unidos, é o ponto de atuação dos líderes da quadrilha, chamados de “cabeças”. Eles costumam ficar encostados em pilastras, sempre com roupas de alto padrão, da mesma forma que os carros que utilizam.
As lideranças têm livre trânsito pelo aeroporto, inclusive podendo atuar no Terminal 2, onde ficam seus subordinados, aguardando para abordar passageiros oriundos de países da América Latina e da África.
Fiscalização
Por meio de nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) de São Paulo afirma que desenvolve “diversos trabalhos” em parceria com a PRF, Polícia Militar e a Guarda Civil Municipal de Guarulhos, “visando a abordagem de veículos.”
“Caso haja alguma atividade ilícita, o boletim de ocorrência é registrado e as investigações são realizadas”, diz trecho de nota da SSP, que não informou se algum suspeito da quadrilha já havia sido preso ou responsabilizado pelo esquema até a publicação desta reportagem.
A Uber afirmou, também por meio de nota, que “todas as viagens” precisam ser feitas por meio de seu aplicativo oficial, para que o passageiro tenha informações sobre o motorista, como nome, foto, além de saber o modelo do carro usado.
“Qualquer viagem feita fora desses padrões não é uma viagem de Uber e, portanto, não dispõe das diversas ferramentas de tecnologia e processos de segurança oferecidas pela plataforma”, destacou.
O aplicativo acrescentou que “todos os motoristas parceiros” passam por uma verificação de antecedentes criminais antes de terem acesso à plataforma.
A empresa 99 também afirmou que as corridas do app devem ser solicitadas exclusivamente por pessoas cadastradas no aplicativo. “Além de ser proibida pela legislação, usuários que adotem a prática de fazer corridas fora do app não contarão com as funcionalidades de segurança que a companhia oferece”, alertou.
A GRU Airport, que administra o aeroporto de Guarulhos, afirmou que a fiscalização do trânsito, no perímeetro aeroportuário, é de responsabilidade das polícias Rodoviária Federal e Militar, além da Secretaria de Transportes e Mobilidade Urbana de Guarulhos.
A concessionária acrescentou que, quando solicitada, concede apoio aos órgãos públicos, além de alertar usuários do aeroporto sobre os riscos do uso de transporte clandestino.
A Secretaria de Transportes e Mobilidade Urbana de Guarulhos afirmou que, em 2022, apreendeu 33 veículos usados clandestinamente para transportar passageiros na cidade. Ainda no ano passado, o governo municipal registrou 13.973 autuações de veículos envolvidos de alguma forma com o transporte clandestino de passageiros.