Do PCC ao Sindicato: a história da facção que promove ataques no RN
Apontada como responsável pelos ataques no RN, a facção Sindicato do Crime (SDC) é dissidente do Primeiro Comando da Capital (PCC)
atualizado
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São Paulo – É madrugada, o grupo está pronto para escapar da Penitenciária do Pitimbu (RN), mas dois presos começam a brigar. Nome respeitado no mundo do crime, Lindemberg de Melo e Souza, o Berg Neguinho, puxa a faca, ataca o colega e acaba jurado de morte pela cúpula do Primeiro Comando da Capital (PCC).
O episódio aconteceu em 2009 e seus desdobramentos dariam origem, anos depois, ao Sindicato do Crime (SDC), facção criminosa rival do PCC que é apontada como responsável pela série de ataques contra órgãos públicos, delegacias e ônibus no Rio Grande do Norte.
Após a tentativa frustrada de fuga, Berg Neguinho foi transferido para o pavilhão 2 da Penitenciária de Alcaçuz, na região metropolitana de Natal. Em fevereiro de 2013, presos ligados ao PCC invadiram sua cela e, enquanto ele dormia, o executaram a facadas.
A regra do PCC era clara: “Sangue é cobrado com sangue”. O assassinato de Berg Neguinho, no entanto, causou revolta da massa carcerária contra o “Comando Paulista”, como os detentos potiguares se referiam ao PCC, até então hegemônico no Rio Grande do Norte.
Fundado em março de 2013, o Sindicato do Crime adaptou o lema dos paulistas: “O certo pelo certo e o errado será cobrado”. Por discordarem da cúpula, até antigos membros do PCC no estado “rasgaram a camisa”, gíria usada para os dissidentes, e aderiram à nova facção.
Da “malandragem” ao PCC
Um estudo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), realizado pela antropóloga Natália Firmino Amarante, em 2019, liga o assaltante de banco Jackson Jussier, o Monstro, à chegada do PCC ao estado, no início dos anos 2000.
Até então, a criminalidade potiguar era regida pela lógica da “malandragem” – sem grupos organizados ou estatutos do crime. Com a liderança de Monstro, o PCC dominou os presídios do estado e marcou posição nas ruas de Natal, a partir de 2006.
Para a facção, o Rio Grande do Norte é visto como uma base estratégica. Além de expandir sua influência para fora de São Paulo, o PCC se beneficia da proximidade da costa potiguar em relação à Europa e à África, que favorece o tráfico internacional de drogas.
A morte de Monstro, durante um tiroteio com a polícia em 2011, é um divisor de águas para o PCC na região. Sem outras lideranças locais de relevância, decisões do “Comando Paulista” passaram a ser contestadas e o vácuo de poder abriu espaço para o surgimento do SDC.
Com estatuto inspirado no PCC, o Sindicato do Crime foi formado para mediar conflitos dentro do sistema prisional do Rio Grande do Norte, reivindicar direitos dos presos e “combater os erros” da facção paulista – como o assassinato de Berg Neguinho, visto como “covardia”.
Em pouco tempo, o SDC ganhou relevância. Já em 2014 e 2015, greves de fome e motins foram organizados por suas lideranças.
Inicialmente pacífico, o convívio com o PCC virou disputa por território dentro e fora das cadeias. O episódio mais emblemático da guerra entre as facções é o Massacre de Alcaçuz, em janeiro de 2017, em que 27 presos do SDC foram mortos, decapitados e queimados.
Do PCC ao Sindicato
Apesar do revés no episódio, o Sindicato do Crime se tornou a facção mais forte do estado e controla o sistema prisional potiguar. O grupo tem aliança ideológica com o Comando Vermelho (CV), que nasceu no Rio de Janeiro e também é rival do PCC.
“O SDC habita o imaginário social dos moradores de Natal, principalmente em decorrência de sua rivalidade com o PCC, que ocasiona diariamente assassinatos e reitera, recria novos (e velhos) ciclos de vingança”, afirma a antropóloga Natália Firmino Amarante, em seu estudo.
Liderança da facção, José Kemps Pereira de Araújo, o Alicate, de 45 anos, é apontado pelas autoridades como responsável por ordenar os ataques recentes no Rio Grande do Norte. Na semana passada, ele foi transferido para o presídio federal de Mossoró (RN), unidade de segurança máxima.
O motivo dos ataques estaria relacionado a reivindicações dos presos no sistema – como acesso à televisão ou direito à visita íntima, interrompidos desde o Massacre de Alcaçuz, em 2017.
Atribuída ao SDC, a suposta ordem para os ataques chegou até a circular no WhatsApp de autoridades de segurança. “A população carcerária do estado do RN vem passando por opressões, humilhação, desrespeito”, diz o texto. “Chegou a hora de darmos a resposta em cima de todo esse sofrimento”.