PM que matou são-paulino cometeu 4 erros de protocolo de bean bag
Entre as regras, protocolo da PM classifica como erro usar bean bag para “dispersar manifestação ou movimentação de massa”
atualizado
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São Paulo – O cabo da Polícia Militar (PM) Wesley de Carvalho Dias Silva, de 30 anos, cometeu ao menos quatro erros previstos no protocolo interno da corporação para o uso de bean bag. Ele é apontado como responsável pelo tiro que matou o são-paulino Rafael dos Santos Tercilio Garcia, 32, na final da última Copa do Brasil.
Oficialmente, o protocolo interno da PM é chamado de Procedimento Operacional Padrão (POP), que estabelece como um agente deve atuar em diferentes ações ou atividades operacionais. No documento que trata sobre o uso de bean bag, obtido pelo Metrópoles, a corporação detalha como a munição deve ser usada e cita nove “possibilidades de erros”.
O protocolo deixa claro que o equipamento deve ser usado contra um alvo específico, identificado como agressor, e não é recomendado para dispersar multidões – como era o caso do tumulto no entorno do estádio do Morumbi, na zona sul da capital paulista.
Segundo o texto, o primeiro erro que um PM pode cometer é “utilizar a munição bean bag para dispersar a manifestação ou movimentação de massa, no lugar de equipamentos mais adequados, tais como granadas e agentes químicos lacrimogêneos”.
“Possíveis erros”
Já no segundo item, a PM determina que o disparo deve respeitar a distância mínima indicada pelo fabricante para realizar o disparo de bean bag. No caso do fornecedor da PM paulista, essa distância é de 6,1 metros.
Em seguida, o protocolo também lista como erros “deixar de prestar socorro” e “fazer visada na região da cabeça, pescoço, órgãos genitais, mamas femininas, mulheres grávidas, crianças, idosos ou pessoas visualmente incapacitadas”.
O torcedor do São Paulo foi atingido na parte de trás da cabeça. A delegada Ivalda Aleixo, titular do Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), responsável pela investigação, também já confirmou que o disparo foi feito “em distância curta”.
Procurado, o advogado João Carlos Campanini, que defende o cabo Wesley, nega que o PM tenha descumprido o protocolo, mas evita apresentar qual é a versão do acusado para cada item citado.
“A defesa entende que o Cabo Wesley não descumpriu qualquer medida de procedimento operacional de uso da bean bag e demonstrará tais detalhes no curso da apuração.”
Protocolo de bean bag
O documento foi elaborado pela Polícia Militar em abril de 2022. Nele, a bean bag é descrita como “munição de impacto controlado” e só deve ser disparada após ordem do PM que comanda a operação, exceto em casos de risco iminente à vida.
Assim, também são considerados erros pela PM disparar a bean bag sem ordem do comandante, quando não houver “urgência ou necessidade”, e deixar de registrar o uso da munição no relatório de serviço.
Fecham a lista de desrespeito ao protocolo “fazer uso do armamento em espaço que contenha obstáculo entre o policial e o agressor ativo ou com o objeto que possa permitir o desvio do disparo” e “não informar o preso acerca dos seus direitos constitucionais”.
Já entre os “resultados esperados” do uso de bean bag, a PM cita manter “a integridade física” do policial e garantir que “nenhum terceiro sofra lesões corporais em razão da ação policial”.
“Se não for possível identificar os agressores à tropa, não realizar o disparo com munição bean bag”, registra o documento.
Investigação
O inquérito da PM sobre o caso foi concluído em dezembro de 2023 e acabou com o indiciamento do cabo Wesley por homicídio culposo (quando não há intenção de matar). Já a investigação da Polícia Civil continua em andamento.
O caso aconteceu na noite de 24 de setembro de 2023. Na ocasião, o cabo Wesley portava uma espingarda calibre 12, estava lotado no Regimento de Polícia Montada (RPMon), a Cavalaria da PM, e foi escalado para atuar no esquema de segurança da final do campeonato, vencido pelo São Paulo contra o Flamengo.
Segundo as duas investigações concluiram que o cabo foi responsável pelo disparo de bean bag, em meio a um tumulto no fim da partida, que acertou a cabeça de Rafael. A vítima foi socorrida pelos próprios torcedores, em uma escada improvisada como maca, sem ajuda dos PMs.
Policiais ouvidos no inquérito alegaram que torcedores tentaram invadir o estádio e teriam atirado garrafas e pedras nos policiais. Chamado a depor no DHPP, o cabo Wesley ficou em silêncio.