PM morto negou condição do PCC para ser liberado, dizem investigados
O corpo do soldado da PM Luca Angerami, morto pelo PCC, foi encontrado em um cova rasa, no Guarujá, após mais de um mês desaparecido
atualizado
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São Paulo – Investigados pelo assassinato do soldado da Polícia Militar (PM) Luca Romano Angerami, de 21 anos, relatam que um traficante do Primeiro Comando da Capital (PCC) propôs liberar o policial antes de sequestrá-lo e matá-lo, mas a vítima se negou a sair do lugar sem levar suas munições que haviam sido roubadas.
A versão sobre os momentos que antecederam a execução do PM consta em pelo menos três interrogatórios, obtidos pelo Metrópoles. O corpo do soldado chegou a ficar mais de um mês desaparecido até ser encontrado em uma cova rasa de um cemitério do PCC, no Guarujá, no litoral paulista, na segunda-feira (20/5).
O PM havia sido visto pela última vez em uma biqueira, como são chamados os pontos de venda de drogas, na madrugada de 14 de abril. Antes, ele havia passado a tarde com amigos na Praia do Tombo, ido a um bar de sinuca e depois a uma adega na Vila Santo Antônio.
A Polícia Civil acredita que Luca foi sequestrado na saída da adega. Por sua vez, os investigados dizem que o soldado chegou por conta própria ao ponto de venda de droga, perto do qual foi flagrado por uma câmera andando ao lado de um suspeito, e só foi arrebatado no local.
Biqueira
Um dos depoimentos é de Carlos Vinícius Santos da Silva, o Malvadão, que estava na biqueira, diz ter presenciado “parte dos acontecidos” e é um dos presos na investigação. No celular dele, policiais encontraram conversas em que o suspeito descreve como teria participado do crime e diz que seu objetivo era ser apadrinhado pelo PCC. Também havia mensagens indicando que o soldado foi executado.
Segundo Malvadão, o PM parou o seu carro, um Toyota Corolla, um pouco à frente da biqueira, localizada na Rua das Magnólias, e logo foi abordado pelo traficante responsável pelo ponto. Esse criminoso seria Caick Santos Riachão da Silva.
Após conversar de 5 a 10 minutos com o PM, Caick teria voltado sozinho para a biqueira. Em seguida, o soldado foi abordado por outro suposto frequentador do local, identificado como Danilo Jefferson Corrales Lins Andrade, o Caga, que o convenceu a descer e ir até o ponto de venda de drogas.
Ao chegar à biqueira, Luca e Caga teriam sido questionados pelo traficante, que àquela altura já sabia que se tratava de um PM. “E ai, qual é, Caga, tá trazendo polícia?”, teria dito Caick, segundo depôs. Foi quando o soldado levantou a camisa para mostrar que estava desarmado.
Arma
Nesse meio tempo, outros criminosos teriam sido avisados da presença do policial e chegaram ao local. Entre eles, estavam João Victor de Souza Miranda Santos, o BH, João Marcus Galdino da Silva, o Trolho, e Rafael da Silva Santos, o Cebola, apontados como “disciplinas” do PCC na Vila Santo Antônio.
Diferentes depoimentos também citam a presença de Fábio Barbosa da Silva Júnior, o Fabinho, e Renato Borges de França, o Coroinha, no local.
Enquanto Luca era interrogado pelos traficantes, o “olheiro” da biqueira teria ido até o carro do PM, encontrado a arma de fogo dele e a levado para os criminosos. De acordo com os depoimentos, a pistola foi entregue na mão de BH.
“O irmão BH devolveu a arma para o policial, sem as munições, falando para ele ‘vazar’”, declarou Malvadão. Luca, no entanto, teria se negado a deixar o local sem levar “o pente e as balas” que os traficantes haviam tomado. “[O PM] começou a ameaçar que senão ia ter que voltar para pegar a munição (…) Aí, BH disse: ‘Vai ser assim então?.”
Essa versão da ocorrência é corroborada por Caick, Fabinho e o próprio BH, que admite ser integrante do PCC. Na investigação, o disciplina da facção criminosa relatou que “falou para o policial ir embora ‘porque ia molhar a quebrada’” – ou seja, atrair ainda mais policiais.
Sequestro
Após discussão entre o PM e os traficantes, os criminosos teriam obrigado a vítima a entrar em um veículo preto. Na versão de BH, ele e Trolho foram no banco traseiro, junto com o policial. Já Cebola teria dirigido o carro até um morro da Vila Baiana, onde o soldado teria sido entregue a criminosos identificados como “PC”, “PW” e “Snipe”.
A polícia diz que Luca foi submetido ao Tribunal do Crime, torturado e executado. O Toyota Corolla dele foi encontrado na Rodovia Cônego Domênico Rangoni, horas depois, ainda com a chave no contato e o uniforme do PM.
Malvadão, Caick, Caga, BH, Trolho, Cebola, Fabinho e Coroinha tiveram a prisão decretada pela Justiça. Em inquérito paralelo, Thiago da Silva Santos, o Gardenal, e Gabriel Santos de Jesus também foram acusados de participação.
Um 11º suspeito também chegou a ser detido por dar informações falsas sobre o caso e atrapalhar a investigação.
Corpo
Segundo a polícia, o corpo do PM foi encontrado com as mãos amarradas e enrolado em uma lona. Uma equipe da Seccional de Santos localizou o cadáver na Rua Gerson Maturani, na Vila Baiana.
O rosto da vítima, de acordo com policiais da Seccional que participaram da operação, estava desfigurado. Uma tatuagem no braço esquerdo teria ajudado na identificação do PM.
O desaparecimento de Luca Angerami já era tratado como homicídio. No fim de abril, o delegado Fabiano Barbeiro, da Divisão Especializada de Investigações Criminais (Deic) de Santos, afirmou que o soldado foi “executado covardemente por criminosos integrantes do PCC”.
Segundo o delegado, o rapaz foi morto “simplesmente pelo fato de ser policial, e por estar no lugar errado na hora errada”.