Pesquisa: 1,1 milhão de alunos foram vítimas de violência em SP
Dados foram levantados pela Apeoesp e o Instituto Locomotiva; professores paulistas também relataram casos de agressão dentro das escolas
atualizado
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São Paulo — Uma pesquisa feita no primeiro bimestre deste ano mostra que 1,1 milhão de estudantes da rede estadual de ensino de São Paulo foram vítimas de algum tipo de violência nas escolas. Já a quantidade de alunos que souberam de casos de violência foi de 1,6 milhão.
O levantamento foi enviado ao Metrópoles após o ataque a tiros na Escola Estadual de Sapopemba, na zona leste paulistana, na manhã de segunda-feira (23/10). O episódio terminou com uma aluna de 17 anos morta e outras duas baleadas, além de um estudante que se machucou quando fugia do ataque. O autor dos disparos, um adolescente de 16 anos, foi apreendido.
O levantamento ao qual a reportagem teve acesso resulta de uma parceria entre o Instituto Locomotiva e o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp). Foram feitas 3,6 mil entrevistas com alunos, familiares e professores, entre 30 de janeiro e 21 de fevereiro deste ano.
“É quase unânime em todos os perfis [ouvidos] a percepção de que o governo deveria oferecer mais condições de segurança para as escolas”, diz trecho da pesquisa.
O próprio governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) reconheceu ter havido alguma falha da gestão estadual e disse que não conseguiu evitar o ataque.
“Se você me perguntar se eu tenho todas as respostas para lidar com esse tipo de situação, eu sinceramente não tenho. Ninguém quer ver alunos morrendo. Ninguém quer isso. A sensação que fica é de frustração. O governo falhou? Provavelmente, falhamos em alguma coisa. A gente não queria ter falhado”, disse Tarcísio, em entrevista coletiva em frente à escola horas após o crime.
O governo determinou suspensão das aulas na Escola Estadual Sapopemba por 10 dias, para que pais, alunos e professores possam receber a devida assistência.
Em nota, a Apeoesp lamentou o ataque na zona leste e informou que, além dos estudantes que relataram episódios de agressão na pesquisa, 87 mil professores souberam de “variados casos de violência” dentro das escolas. Foram vítimas de violência, durante o trabalho, 40 mil educadores.
O levantamento mostrou, ainda, que, do total de alunos ouvidos, 41% dizem não se sentir seguros no entorno das unidades de ensino.
“Existe abandono nas escolas estaduais e esse abandono se agravou nos últimos governos estaduais, que reduziram extremamente e mudaram o caráter do programa de mediação escolar”, diz trecho da nota do sindicato.
A Apeoesp destacou, ainda, a redução nas verbas orçamentárias destinadas à educação. Conforme revelado pelo Metrópoles, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do governo Tarcísio que pretende flexibilizar o percentual mínimo de dinheiro que deve ser aplicado em educação pode retirar até R$ 9,6 bilhões da área em 2024. O texto precisa ser aprovado pela Assembleia Legislativa (Alesp).
O montante equivale aos orçamentos anuais da Universidade de São Paulo (USP) e Universidade de Campinas (Unicamp) somados — as universidades estaduais não são impactadas pela PEC —, e seria suficiente para construir mais de 1.900 escolas equipadas para até mil alunos.
Ataques a escolas
O atentado na escola de Sapopemba foi o segundo ataque a escola ocorrido este ano em instituições de ensino do governo do Estado promovido por alunos que sofriam bullying dos colegas. No país, foi o nono caso do tipo.
“De 2002 a 2022, foram consumadas ao menos 16 ocorrências dessa natureza no país”, informou, em julho, o Anuário Brasileiro da Segurança Pública, divulgado pelo Fórum Brasileiro da Segurança Pública, que alerta que 2023 já era o ano mais violento para esse tipo de ocorrência desde que o anuário começou a ser divulgado.
O atentado anterior em São Paulo ocorreu na Escola Estadual Thomazia Monteiro, na Vila Sônia, zona oeste, e foi promovido por um adolescente de 13 anos, armado com uma faca. Em 27 de março, ele invadiu a escola e atacou quatro professores e um colega. A professora Elisabeth Tenreiro, de 71 anos, morreu.
Antes do crime desta semana, os casos mais recentes no país haviam ocorrido em Minas Gerais e no Paraná. No último dia 10, um estudante de 14 anos foi morto e três ficaram feridos. O ataque, feito com uma faca, foi realizado por um ex-aluno da Escola Profissional Dom Bosco, em Poços de Caldas, no horário da saída dos estudantes.
Em 19 de junho, dois estudantes foram mortos a tiros no Colégio Estadual Professora Helena Kolody, no Paraná. O suspeito, um ex-aluno de 21 anos, foi encontrado morto dias depois na cadeia.
Em abril, em outro caso chocante, um homem de 25 anos invadiu uma creche armado com uma machadinha e um canivete e matou quatro crianças em Blumenau (SC).
Providências
Em julho, quando divulgou o anuário, o Fórum Brasileiro da Segurança Pública alertou sobre a urgência de providências que possam combater o fenômeno.
“Motivados sobretudo por discursos de ódio, bullying, racismo, misoginia, intolerância étnica ou religiosa, tais ataques exigem uma resposta pública que compreenda e considere a complexidade do fenômeno, induzindo a pesquisa e a análise de informações disponíveis que auxiliem na identificação das demandas prioritárias para o enfrentamento do problema”, disse texto da instituição.
Neste mês, o governo paulista anunciou a contratação de 1.782 professores para atuação como professores orientadores de convivência em 1.581 unidades de ensino. O programa Programa de Melhoria da Convivência e Proteção Escolar é uma iniciativa que já existia na rede para “um ambiente de aprendizagem solidário, colaborativo, acolhedor e seguro”.
Depois do ataque à escola Thomazia Montoro, o governo anunciou a contratação de 550 psicólogos para trabalhar com os alunos da rede. A secretaria diz que todos eles já estão trabalhando.