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Moradores ignoram poluição e pescam peixe na Billings: “Dá pra comer”

Deck no Cantinho do Céu vira point de pescadores que comem e doam peixes retirados da água poluída da Represa Billings, em São Paulo

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1 de 1 Imagem mostra pescador com peixe em represa - Metrópoles - Foto: William Cardoso/Metrópoles

São Paulo — A pescaria tem rolado solta às margens da Represa Billings, em pleno Cantinho do Céu, no superpovoado bairro do Grajaú, na zona sul de São Paulo. Um dos decks nas proximidades do Aquático SP virou um dos points, até mesmo em dias úteis. A conversa de pescadores é que peixes dali não fazem mal, “dá para comer”, embora autoridades e especialistas não recomendem o consumo.

Em dias ensolarados, a água da Billings apresenta um verde em tom quase fluorescente que intriga e chama a atenção de quem passa pelo Cantinho do Céu. Especialistas apontam a presença de toda a sorte de contaminantes, que vão desde coliformes fecais (cocô, basicamente) até metais, hormônios, fármacos e bactérias produtoras de toxinas. Não é por acaso. A região é cercada por casas, um dos lugares mais densamente povoados da capital paulista.

O sargento da reserva Osvaldo Augusto dos Reis, 64 anos, é morador do Jardim Eliana, também no Grajaú, e passou a se dedicar à pesca na Billings depois que se aposentou. O militar diz que pescava no mar, mas que precisou contar com ajuda de colegas mais experientes em água doce para aprender a tirar seus peixes da represa. “Eles me ensinaram, gostei, e quase todos os dias estou aqui”, afirma. “Está ficando muito bom para pescaria”, diz.

Carpa, tilápia, traíra, cará, jacundá, cascudo e lambari são as principais espécies. “Nosso objetivo com as varas são as carpas mesmo, de 3 kg, 4 kg, 5 kg. Até de 10 kg já pegarem aqui”, afirma o sargento da reserva.

Para Reis, não há risco no consumo dos peixes. “A água está muito limpa, os peixes são sadios, senão a gente já teria morrido”, diz, rindo. “Doei, mais ou menos, uns 300 peixes. Os que comeram não falaram nada, não passaram mal, então vou continuar doando, se eu pescar”, afirma. “O pessoal pede.”

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Pescador exibe peixe na Represa Billings, em São Paulo
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Desempregado, Rafael dos Santos de Carvalho, 24 anos, descobriu a pescaria na Billings por meio de amigos, que contaram que a represa dava bastante peixe. Foi uma opção à Guarapiranga, onde, segundo ele, parte dos pescadores usa redes, atrapalhando quem aposta nas varas.

Carvalho explica que os peixes que nadam próximos ao Cantinho do Céu não merecem a desconfiança na hora de irem para o prato. “Dá para comer, é bom, gostoso. Os que eu comi estão aprovados. Comi tilápia e cará”, afirma. Quando concedeu a entrevista, o pescador frequentava a Billings havia três semanas.

O porteiro Fabiano Roberto Pereira da Silva, 56 anos, tem a paixão pela pescaria no sangue, desde que morava no Recife. Da Billings, já tirou de 14 kg a 20 kg de peixes a cada dia em que esteve às margens da represa. “A gente divide entre todo mundo. É um peixe bom. Não é contaminado, não.”

Em setembro, centenas de peixes apareceram mortos em outro ponto da Billings, na cidade de São Bernardo do Campo, no ABC.

Riscos

Professora doutora do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Aline Dal’Olio Gomes afirma que não é recomendado comer os peixes da Billings.

“Um estudo realizado, em 2012, em diversos pontos do reservatório, incluindo a região próxima ao Cantinho do Céu, encontrou a presença de concentrações elevadas de metais como: alumínio, cobre, cromo, magnésio e zinco, nos tecidos de peixes das espécies tilápia, lambari, cará e traíra”, afirma a professora, citando também a presença de bactérias produtoras de cianotoxinas.

A professora afirma que o consumo frequente de peixes potencialmente contaminados pode trazer sérios riscos à saúde.

Diretora do Centro de Recursos Hídricos do Instituto de Pesca, vinculado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, Luciana Carvalho Bezerra de Menezes afirma que pesquisas mostram que a ocorrência de algas e cianobactérias podem comprometer a qualidade do peixe em relação ao sabor, conhecido popularmente como gosto de barro, inseticida e mofo.

“Não temos evidências de que ter gosto de barro represente um prejuízo à saúde do peixe e, consequentemente, à qualidade da carne. Porém, o excesso dos nutrientes e poluentes nos ambientes aquáticos podem indicar a presença de outros contaminantes, como metais pesados (chumbo, cromo, mercúrio, zinco, entre outros), que podem se acumular nas vísceras e na musculatura dos peixes, com concentrações que ultrapassem os valores estabelecidos pela legislação brasileira e internacional”, diz Luciana.

A especialista também afirma que a Billings é um ambiente poluído e que são necessários mais estudos para avaliar o risco do consumo dos peixes. Entretanto, diz que a represa sofre “elevada degradação ambiental” provocada, inclusive, pelo lançamento de bactérias originadas de esgoto doméstico, como bactérias de origem de esgoto doméstico Escherichia coli.

“Trabalhos do Instituto de Pesca reforçam os dados de degradação e de maneira geral vinculam restrições aos contatos primário e secundários com a água, como por exemplo usos para recreação e pesca”, diz.

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