Peeling de fenol: polícia aponta que influencer assumiu risco de matar
Inquérito que investigava Natalia Becker pela morte de Henrique Chagas após peeling de fenol feito em sua clínica foi enviado ao MPSP
atualizado
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São Paulo — A Polícia Civil de São Paulo concluiu que a influenciadora Natalia Becker, de 30 anos, assumiu o risco de matar o empresário Henrique da Silva Chagas, de 27, que foi submetido a um procedimento de peeling com fenol na clínica dela, em junho deste ano, na capital paulista.
“Manipular tal substância [fenol] e [nem] sequer procurar saber dos riscos inerentes ou das possíveis medidas de solução em caso de eventuais intercorrências evidencia o dolo eventual da investigada, uma vez que esta assumiu o risco do resultado [morte], mais uma vez, frise-se, provável e possível”, diz o relatório final da investigação.
O inquérito foi concluído e encaminhado para análise do Ministério Público (MPSP) nessa terça-feira (20/8). Agora, o órgão decide se vai oferecer denúncia ou arquivar o caso. Se houver denúncia, a Justiça pode aceitá-la ou não.
O documento policial aponta que Natalia omitiu informações ao paciente antes do procedimento quando o descreveu como “minimamente invasivo”. Segundo a polícia, ela sabia da possibilidade do peeling de fenol provocar “intercorrências cardíacas” — intercorrências essas de fácil pesquisa em fonte aberta e contidas na apostila do curso que a influencer realizou, conforme os investigadores.
A polícia destacou que Natalia não tem formação técnica para a realização de procedimento com fenol e que ela e sua equipe não possuem qualquer preparo para atender eventuais intercorrências com pacientes, como foi o caso de Henrique.
Peeling de fenol
O empresário Henrique da Silva Chagas morreu devido a uma parada cardiorrespiratória em decorrência de “edema pulmonar agudo” ao inalar fenol durante peeling na clínica da influenciadora Natalia Becker. A causa da morte consta no laudo do Instituto Médico Legal (IML) da Polícia Técnico-Científica.
A perícia encontrou vestígios do produto químico na pele do paciente e conseguiu confirmar o que causou o problema nos pulmões dele: “edema pulmonar agudo desencadeado por ação inalatória local do agente químico fenol”, informa o documento assinado pelo médico que fez o exame necroscópico em Henrique.
“Consta a presença da substância química fenol na análise do fragmento de pele e tecido estudados em dose qualitativa. Consideramos que a inalação do ácido volátil ‘fenol’, usado topicamente na pele da vítima e identificado qualitativamente em exame toxicológico nos fragmentos enviados, provocou loco-regionalmente as alterações descritas macro e microscopicamente descritas em epiglote, laringe, traqueia e pulmões, culminando num edema pulmonar agudo responsável pelo êxito letal”, completa o laudo.
“As alterações ocasionaram danos na função respiratória, com inibição da hematose, que gerou o escurecimento sanguíneo, a congestão polivisceral e as equimoses (…)”, aponta a perícia no documento.
“Deve-se considerar ainda que a escarificação apresentada em face poderia ter contribuído para um aumento da absorção do produto, embora o mesmo não tenha sido detectado na amostra de sangue estudada”. A escarificação citada é a sequência de cortes feitos no rosto de Henrique antes da aplicação do produto.
Segundo a delegada Samia Olivier Martins de Oliveira, os peritos estão analisando os laudos e a equipe está empenhada na apuração da verdade dos fatos. Porém, para ela, pela simples leitura do laudo, não há prova de causa ou responsabilidade relacionada a Natália.
Morreu durante procedimento
Henrique Chagas começou a passar mal logo após ser submetido a um peeling de fenol no último dia 3 de junho. O óbito dele foi constatado por uma equipe do Samu cerca de uma hora depois dos primeiros sintomas.
Natália se apresentou na delegacia apenas dois dias após a morte da vítima e prestou depoimento por cerca de 2 horas. “Eu tô muito triste pelo que ocorreu, jamais quis prejudicar ninguém. Sinto muito pela família dele. Acabou com a minha vida isso. Eu jamais tive a intenção de prejudicar ele”, disse a influencer a jornalistas ao sair da unidade policial.
A mulher admitiu não ter solicitado exames prévios de Henrique e disse que aprendeu a aplicar o peeling em um curso on-line.
A clínica dela foi fechada e autuada pela Vigilância Sanitária do município. De acordo com a Secretaria Municipal da Saúde, o estabelecimento “exercia procedimentos em desacordo com a legislação vigente”.
Avaliação por foto
Troca de mensagens entre a equipe de Natalia Becker e Henrique Chagas da Silva, que morreu após ser submetido a um peeling de fenol, no início do mês, mostra que o jovem recebeu indicação para realizar o procedimento após enviar uma única foto e foi orientado a iniciar “tratamento”, feito com produtos vendidos pela influencer, durante o mês anterior à aplicação.
A negociação para o peeling de fenol, que foi incluída no inquérito da Polícia Civil e obtida pelo Metrópoles, aconteceu pelo Instagram. Natalia Becker, que não possui formação em medicina, foi indiciada por homicídio doloso.
Os prints (veja acima) mostram que a clínica da influencer, localizada na região do Campo Belo, na zona sul da capital paulista, permitia agendar procedimentos pela rede social. O cliente também tinha opção de agendar uma consulta antes da aplicação.
Ao entrar em contato com o perfil do estabelecimento, Henrique recebeu uma mensagem de boas-vindas, informou a sua cidade e escolheu sobre qual tratamento desejava tratar – entre “melasma”, “peeling de fenol” e “interesse em curso”.
Conversa pelo Instagram
Em seguida, a clínica enviou uma mensagem de apresentação e informava o valor à vista (R$ 4,5 mil) ou parcelado (R$ 5 mil). “Você quer conquistar uma pele mais firme e jovem? Entre em contato e agende uma consulta para saber se é indicado para você”, diz trecho do texto.
A sequência da conversa, no entanto, mostra que essa análise poderia ser feita, na verdade, por meio do próprio chat. “Poderia por favor enviar uma foto de sua pele para uma breve avaliação”, pergunta a clínica. Henrique responde com uma única imagem, do seu rosto de perfil.
“Obrigada pelas fotos! Você tem indicação sim de realizar o peeling de fenol!”, responde o estabelecimento, que se coloca à disposição, em seguida, para tirar dúvidas pelo Instagram.
O jovem prefere agendar uma consulta com Natalia. Ele também avisa que trabalha em um pet shop e pergunta se pode ter contato com calor após o procedimento. “Desde que não jogue o secador em seu rosto”, responde a clínica.
O estabelecimento, então, avisa que Henrique precisaria “iniciar o tratamento” um mês antes. “Como você tem cicatrizes profundas, temos que preparar a pele para o fenol”, diz a mensagem.
A Polícia Civil já sabe que a vítima não realizou qualquer exame médico antes de se submeter ao procedimento. No mês anterior, o jovem teria aplicado espuma de limpeza, hidratante facial, protetor solar e clareador, vendidos pela influencer. Também teria ingerido comprimidos de colágeno.