“Ele não queria falar de crimes”, diz terapeuta de Pedrinho Matador
Maior serial killer do Brasil, Pedrinho Matador tentava começar nova vida com ajuda da terapeuta Iza Toledo até ser assassinado neste mês
atualizado
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São Paulo – Na última foto em que tiraram juntos (que ilustra esta reportagem), a psicoterapeuta Iza Toledo, de 52 anos, e seu amigo e ex-paciente, Pedro Rodrigues Filho, de 68 anos, sorriem para a câmera após um dia de passeio em um shopping na Praia Grande, litoral sul paulista.
Instantes depois, o homem que ficou nacionalmente conhecido como Pedrinho Matador recebeu uma ligação e, às pressas, partiu para Mogi das Cruzes. Era 20 de fevereiro, segunda-feira de Carnaval. Treze dias depois, ele seria assassinado a tiros e degolado na cidade da Grande São Paulo.
Considerado o maior serial killer do Brasil, Pedrinho Matador afirmava ter matado mais de 100 pessoas. Oficialmente, ele foi condenado por 71 homicídios, cumprindo 42 anos de prisão em regime fechado. Assim que saiu do sistema penitenciário, Pedrinho tomou a decisão de mudar de vida e deixar o passado para trás.
“Ele sentia que já tinha pago a dívida com a Justiça dos homens, por ficar 42 anos preso. A relação dele com Deus também era especial. Falava com Deus diariamente e tinha certeza de que tinha sido perdoado. Uma prova disso, para ele, era o fato de ter ido morar com a gente no litoral, para saber o que era viver de verdade, com pessoas que o acolheram”, contou Iza ao Metrópoles.
Tratamento e amizade
Pedrinho começou a se tratar com ela, via on-line, três vezes por semana, em sessões de duas horas. Durante as análises, ele começou a externar a confiança que adquirira na psicoterapeuta, pedindo para que ela o ajudasse a escrever sua própria história, destacando seu lado bom. “Falei para ele que, somente depois de nos vermos pessoalmente, eu poderia dar uma resposta.”
As sessões pela internet duraram quatro meses, até que Pedrinho desceu a serra e foi conhecer Iza e o marido dela, em Intahaém, no litoral paulista.
Em pouco tempo de convivência, Pedrinho foi “adotado” pelo casal, com o qual começou a morar junto.
“Ele deixou de ser meu paciente e passou a ser meu amigo e do meu marido”, afirma Iza, que sempre desmente boatos de que explorava a relação com Pedrinho para ganhar dinheiro ou que ambos eram amantes. “Isso jamais houve, de forma alguma, ele era uma pessoa íntegra e também amigo de meu marido”, afirmou.
A convivência com o ex-matador, como o próprio Pedrinho se chamava, fez com que a profissional da saúde mental deixasse de lado suas atividades clínicas e passasse a dar mais atenção ao desafio de entender a mente de um homem que matou tantas pessoas, incluindo o pai.
Ela topou escrever o livro sobre Pedrinho, previsto para ser uma trilogia. Até o momento, somente o primeiro volume foi publicado: “Serial Killer: eu não sou um monstro.”
Além dos livros, pouco antes de ser assassinado, Pedrinho havia fechado contrato para a produção de um documentário sobre a sua vida, pretérita e atual.
Sofrimento e terapia
Iza e Pedrinho conviveram por cerca de 18 meses no litoral. Durante esse período, ela usou de psicanálise e de terapias alternativas – com uso de cães, música e escrita criativa – para Pedrinho lembrar e encarar traumas de um passado de extrema violência.
“Ele não teve infância. Sofreu muito nas mãos do pai, a quem jurou de morte aos 12 anos, para proteger a mãe e a família. O Pedrinho não se lembrava de bons momentos na infância, foi um desafio para ele começar a relembrar a origem de suas dores.”
A convivência diária entre a psicoterapeuta e Pedrinho criou um laço de afeto semelhante ao de pai e filha, segunda ela. “Ele não queria mais falar de crimes. A angústia dele era essa. Ele me dizia: ‘o que adianta eu querer ser uma pessoa boa se as pessoas só falam do Pedrinho Matador? Ninguém quer saber de mim como estou agora'”, recordou Iza.
Para ajudar na divulgação do “novo Pedrinho”, eles criaram perfis em redes sociais, nos quais o ex-matador passou a compartilhar sua nova maneira de viver e de encarar o mundo.
“Quero que fique para as pessoas a memória do Pedrinho Rodrigues, um exemplo de superação. Desejo que [a imagem] do Pedrinho Matador não mate o Pedrinho Rodrigues”, acrescentou a psicoterapeuta.
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Últimos momentos
Pedrinho e a familia de Iza foram a um shopping, na Praia Grande, em 19 de fevereiro. Logo após posarem para uma foto, ela afirmou que Pedrinho recebeu um telefonema. “Ele me falou: ‘aqui não posso ficar mais nem um minuto’.
Na madrugada da segunda-feira de Carnaval, ela embarcou em um carro de aplicativo, pago por um amigo médico, e rumou para Mogi das Cruzes.
“Minha impressão foi a de que ele saiu de casa para que nada de ruim acontecesse com a gente. Ele me falava que no dia que achasse que sua presença colocaria em risco minha vida, da minha família, ele ‘queimaria o chão’ [iria embora] de lá. Não consegui entender o que aconteceu.”
Pedrinho chegou a compartilhar em uma rede social um vídeo afirmando estar em Mogi das Cruzes, mas o motivo da viagem ainda não foi esclarecido, assim como a motivação e a autoria do assassinato dele.
“Quando soube da morte dele, tive uma reação quase catártica, porque foi como se tivessem matado o meu pai”, afirmou Iza.
Tiros e degola
Pedrinho Matador foi morto a tiros, aos 68 anos, em frente a uma casa por volta das 9h50 de domingo (5/3), em Mogi das Cruzes. Ele estava acompanhado de sua sobrinha de consideração, uma jovem de 23 anos, e pela filha dela.
A jovem afirma ter ouvido os criminosos atirando contra Pedrinho, logo após ela sair do local, por ordem do pistoleiro – que usava uma máscara de palhaço.
Com Pedrinho já caído no chão, de barriga para baixo, outro criminoso também mascarado se aproximou empunhando uma faca de cozinha e o degolou. Os criminosos fugiram e ninguém foi preso até agora.
Quem foi Pedrinho
Natural de Santa Rita do Sapucaí, em Minas Gerais, Pedrinho nasceu com uma rachadura no crânio em razão dos chutes que o pai dele dava na mãe durante a gestação. O primeiro crime do serial killer foi quando ele tinha 13 anos. Pedrinho afirmou que empurrou um primo no moedor de cana e depois o picou com um facão.
Cerca de um ano depois, aos 14, Pedrinho matou o vice-prefeito de Alfenas, também em Minas Gerais, por demitir seu pai. Na época, o pai de Pedrinho foi acusado de furtar merendas destinadas aos alunos da escola onde ele trabalhava como guarda. Após matar o político, Pedrinho também assassinou outro vigia da unidade escolar, que ele acreditava ser o verdadeiro responsável pelos furtos.
Após cometer os primeiros homicídios, Pedrinho fugiu para Mogi das Cruzes (SP), onde ficou conhecido por roubar bocas-de-fumo e matar pessoas relacionadas ao tráfico.
Pedrinho Matador só foi preso aos 18 anos, em 1973. À época, acabou condenado a 128 anos de prisão. No entanto, foi justamente no sistema penitenciário que ele cometeu a maior parte dos assassinatos.
Pedrinho justificava os homicídios. Segundo ele, matava “pessoas que não prestavam”. Entre as vítimas, estavam estupradores e traidores. O homem dizia que não aceitava algumas condutas criminosas. Ele afirmava que nunca matou crianças, mulheres e pais de família.
Em 2018, Pedrinho conquistou a liberdade, aos 64 anos, após cumprir 42 anos de pena.