PCC se infiltra em cadeias da Europa para ampliar poder no exterior
Membros do PCC detidos em diferentes países recrutam presos locais para fortalecer sua rede internacional de tráfico de drogas
atualizado
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São Paulo — O Primeiro Comando da Capital (PCC) está se infiltrando em presídios da Europa para tentar ampliar seus tentáculos no continente e fortalecer sua bilionária rede de tráfico internacional de drogas. Até o momento, pelo menos Portugal e Espanha teriam detectado a presença da facção paulista em suas penitenciárias, há pelo menos dois anos.
O movimento está no radar do Ministério Público de São Paulo (MPSP) e da Polícia Militar (PM) paulista, segundo fontes das duas instituições ouvidas pelo Metrópoles, e de autoridades de diferentes países, que temem uma multiplicação de faccionados em suas cadeias.
Uma vez presos no exterior, os integrantes do PCC passam a tentar batizar novos membros, replicando a estratégia adotada nos presídios de São Paulo desde os anos 1990 para dominar o tráfico de drogas no estado. No ano passado, a maior facção do país completou 30 anos de existência e ganhou status de máfia justamente por causa de suas conexões internacionais.
“A gente sabe que o principal processo de recrutamento do PCC é pelo sistema prisional, não só no Brasil”, afirma o pesquisador Christian Vianna de Azevedo, da Iniciativa Global Contra o Crime Organizado Internacional (GI-TOC), atual subsecretário de Integração da Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais.
“A facção oferece aquela questão da proteção, da irmandade, oferece auxílio financeiro para família. Ela se utiliza do sistema para isso, e não foi diferente nesses outros países. Essas informações de que o PCC estava se infiltrando no sistema prisional da Espanha e de Portugal começaram a surgir no pós pandemia. Nesses sistemas, a facção já recrutou e batizou criminosos locais”, acrescenta Vianna.
A estratégia de batizar detentos faz com que os novos faccionados, ao deixarem os presídios, passem a atuar para o PCC nas ruas, fortalecendo a estrutura da facção nesses países e criando novas possibilidades para receber as drogas enviadas por meio do Porto de Santos e de portos do Nordeste.
O MPSP estima que o PCC e seus parceiros comerciais faturem cerca de R$ 10 bilhões por ano com a remessa de drogas para a Europa por meio do Porto de Santos, no litoral de São Paulo. Somente no último dia 21/10, a Receita Federal apreendeu no local 1,2 tonelada de cocaína que estava escondida em contêineres que tinham como destino o porto de Málaga, na Espanha. Foi a maior apreensão feita neste ano, resultando em um prejuízo de R$ 220 milhões à facção paulista.
De acordo com promotores do Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), que acompanham o processo de internacionalização do PCC, a facção prioriza, neste momento, países cujas barreiras linguística e cultural sejam menores.
Além da presença em Portugal e Espanha, é conhecida pelo MPSP a associação do PCC com a máfia italiana ‘Ndrangheta, da Calábria. Investigações apontam que a facção paulista ainda tem associações com grupos da Sérvia, Colômbia, Venezuela e de outros países.
Antes do PCC, traficantes europeus precisavam atravessar o Oceano Atlântico até Bolívia, Colômbia ou Peru, países produtores de cocaína, para negociar pasta base ou comprar a droga já refinada. A parceria comercial com a facção facilitou a logística e reduziu os riscos dos criminosos europeus.
De acordo com estimativa dos promotores do Gaeco, feita em 2023, há membros do PCC em pelo menos 23 países. Em Portugal e na Espanha, onde foi detectada a infiltração em presídios, haviam 42 e 19 faccionados, respectivamente.
Segundo autoridades do Gaeco, a expansão do PCC gerou preocupação no governo dos Estados Unidos, que teme o avanço da facção sobre seu território. Em 2022, o presidente americano Joe Biden assinou uma ordem executiva para combater organizações criminosas e redes de tráfico, que incluía o PCC entre alvos de sanções.
Paraguai
A estratégia do PCC de ampliar seus poderes em outros países por meio do batismo de detentos nos presídios já foi adotada, anteriormente, na América do Sul. Desde que dominou o tráfico na fronteira com o Paraguai, em 2016, a facção passou a comandar rotas de comércio de droga que passavam pelo país vizinho. Assim, membros da organização criminosa acabaram no sistema prisional paraguaio e passaram a batizar os “irmãos” locais.
“Quando o pessoal passou a ser preso do lado do Paraguai, começaram a recrutar [novos membros] dentro das cadeias paraguaias. Então, surgiu uma disputa com o Clã Rotela, um grupo criminoso análogo ao PCC em território paraguaio, mas muito menor em tamanho”, afirma o pesquisador Christian Vianna.
O batismo de novos integrantes do PCC também teria sido mapeado na Venezuela. No passado, ocorreu o movimento contrário. O Ministério Público de Roraima já identificou pelo menos 700 venezuelanos batizados no sistema prisional do estado.