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OAB-SP critica “ouvidoria paralela” de Derrite: “Indignação”

Em nota, OAB-SP afirma que “ouvidoria paralela” do secretário Guilherme Derrite teria “atribuição diversa e não coincidente com a atual”

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Policia Militar de São Paulo PMSP PM SP durante policimento na capital paulista - Metrópoles
1 de 1 Policia Militar de São Paulo PMSP PM SP durante policimento na capital paulista - Metrópoles - Foto: Fábio Vieira/Metrópoles

São Paulo — A Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP) divulgou uma nota, nessa segunda-feira (2/12), em que manifesta “indignação” com a criação de uma Ouvidoria Setorial da Polícia pelo secretário da Segurança Pública do estado (SSP-SP), Guilherme Derrite, publicada no Diário Oficial do dia 26 de novembro.

Para a OAB-SP, a “ouvidoria paralela” teria “atribuição diversa e não coincidente” em relação à atual Ouvidoria. Ainda de acordo com a Ordem, a “ouvidoria paralela”, desenhada para não ter qualquer autonomia, representa mais um passo no enfraquecimento dos mecanismos de controle e transparência da atividade policial no estado.

Leia a nota da OAB-SP na íntegra:

“A Comissão de Segurança Pública da OAB SP manifesta sua indignação com a criação de uma segunda Ouvidoria com a missão de exercer controle sobre as atividades de segurança pública no Estado de São Paulo. Quando o Estado vem impondo significativos cortes de investimento, não há razões objetivas para se criar um segundo órgão com atribuições sobrepostas.

A Resolução n. 66 da Secretaria de Segurança Pública aponta que a nova ouvidoria teria “atribuição diversa e não coincidente” com as da atual Ouvidoria das Polícias. No entanto, ao determinar a área de atuação do novo órgão, seu texto indica a sobreposição em temas centrais como: receber e sistematizar manifestações da sociedade, monitorar as ações das forças policiais e dar transparência ao sistema de segurança pública. Além disso, a Resolução da SSP prevê a subordinação direta da nova ouvidoria ao secretário (art. 7º, §1º), designado para exercício da função por ato do próprio Secretário (art. 7º).

A atual Ouvidoria das Polícias convive com inúmeros desafios, incluindo a escassez de recursos para atividades de rotina e dificuldade de acesso a dados, documentos e registros de ocorrência, o que dificulta e, muitas vezes, obstaculiza o cumprimento de suas funções. Criada em 1995, a Ouvidoria de São Paulo foi pioneira no país, mas tem sofrido com o enfraquecimento paulatino pela atual gestão da SSP, o que também se revela na falta de diálogo, nas críticas públicas à atuação em casos relevantes, como as operações policiais na Baixada Santista, e na restrição de investimentos.

A falta de apoio institucional inclui, por exemplo, a não nomeação do Conselho da Ouvidoria, cuja escolha dos membros é uma prerrogativa do Ouvidor e é atribuição do Secretário à sua nomeação. O ofício para nomeação está com a SSP desde 14/03/2023, já houve reiteração do pedido, mas a nomeação nunca foi feita.

A decisão pela criação de uma nova ouvidoria, desenhada para não ter qualquer autonomia, representa mais um passo no enfraquecimento dos mecanismos de controle e transparência da atividade policial no Estado. Ao invés de criar uma segunda ouvidoria, os investimentos públicos devem ser direcionados à atual Ouvidoria das Polícias. É preciso fortalecer o órgão, dando estrutura e autonomia para que este exerça o controle externo da atividade policial e continue sendo a voz da população, em geral.”

Repercussão negativa

A Ouvidoria Setorial, criada pela SSP, tem gerado reação negativa por parte de representantes de defesa dos direitos humanos, que veem uma tentativa de esvaziamento das atribuições da já existente Ouvidoria da Polícia, custo extra para os cofres públicos, bem como uma forma de confundir a população a respeito do órgão que deve receber denúncias sobre policiais civis e militares.

A indicação do ouvidor do órgão recém criado, que contará com dois funcionários e um “conselho de usuários de serviços públicos”, será atribuição de Guilherme Derrite. A Ouvidoria Setorial vai funcionar no térreo do prédio da própria SSP, que promete “atuação independente”.

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Morro São Bento, em Santos, durante a Operação Verão, em 2024
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Beatriz da Silva Rosa, mãe do menino Ryan, caminha em março de 2024 pelo Morro São Bento, em Santos

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Caberá à nova ouvidoria receber elogios, reclamações, sugestões e denúncias, “com exceção das ocorrências policiais que violem os direitos humanos”, que seguem com a Ouvidoria da Polícia.

Em nota, a Ouvidoria aponta atribuições conflitantes e questiona “a quem interessa essa confusão inapropriada e dispendiosa”. O estado de São Paulo tem enfrentado uma escalada na letalidade policial, com diversas denúncias referentes ao abuso cometido pela Polícia Militar, em especial no âmbito das operações Escudo e Verão, na Baixada Santista.

Comandada por Claudio Silva, a Ouvidoria da Polícia também diz que procurou a SSP para reforçar a necessidade de publicação do edital para criação do seu próprio conselho de usuários, algo previsto em lei, mas não houve “resposta conclusiva”.

“Em outra reunião com o Conselho Estadual de Segurança Pública, foi apresentada a proposta de criação de uma outra ouvidoria, para determinados serviços oferecidos pela SSP, onde alertamos para o fato de que tal proposta colidia com papeis já exercidos por esta Ouvidoria e estabelecidos em lei (Lei Complementar Nº 826, de 20 de Junho de 1997)”, diz.

A Ouvidoria da Polícia já tem por atribuições “receber denúncias, reclamações e representações sobre atos considerados arbitrários, desonestos, indecorosos ou que violem os direitos humanos individuais ou coletivos praticados por servidores civis e militares da Secretaria da Segurança Pública”.

A avalição também é a de que a medida tomada por Derrite cria órgãos em duplicidade, “com despesas incompatíveis com a austeridade orçamentária tão necessária”.

A Ouvidoria da Polícia passa atualmente por um processo de escolha para o ouvidor que ficará à frente do órgão nos próximos dois anos. Silva e mais duas pessoas, ambas do mesmo grupo, formam uma lista tríplice apresentada ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos). O mandato atual se encerra em 23 de dezembro.

Chapa branca

A criação da Ouvidoria Setorial é alvo de críticas por parte de representantes de grupos de defesa dos direitos humanos, que apontam um esvaziamento do órgão criado em 1995 e regulamentado por lei em 1997, durante a gestão de Mario Covas (PSDB).

Primeiro ouvidor, o sociólogo Benedito Mariano diz que o órgão criado por Derrite não vai ter relevância nenhuma. “O governador e o secretário Derrite querem criar uma ouvidoria chapa branca para desgatar o órgão de controle externo da polícia [Ouvidoria], autônomo e independente, criado há mais de 30 anos, por lei complementar. Foi aprovada por unanimidade na Assembleia Legislativa em 1997”, diz.

Mariano diz que a Ouvidoria Setorial não terá independência nenhuma. “O ouvidor tem mandato. Esse órgão que ele está criando por resolução interna da secretaria é burocrático, administrativo, sem representatividade nenhuma. É uma ouvidoria chapa branca para chamar de minha. É isso que o governo está criando. Totalmente inadequada, desrespeitosa, a criação desse órgão pela Secretaria da Segurança Pública.”

Além de ouvidor, Mariano foi também secretário de segurança urbana em gestões petistas e participou da elaboração do plano de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para o sociólogo, a política de segurança pública adotada no estado de São Paulo é equivocada.

Presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), Adilson Santiago diz que recebe com preocupação a resolução 66/2024 da SSP. “Causa estranheza, porque a própria resolução coloca a importância da escuta da população, e ele [Derrite] não escutou ninguém”.

Santiago também aponta que diversos pontos da resolução coincidem com as atribuições da Ouvidoria da Polícia. “Fica clara, evidente, a tentativa de esvaziar o trabalho da Ouvidoria da Polícia”, diz. “Para a gente, é uma afronta ao trabalho que a Ouvidoria vem desenvolvendo há anos. É um serviço importante, que demonstra ser essencial não só para a população, como para a democracia”, afirma.

O presidente do Condepe diz que o assunto será tema de reunião da entidade no próximo dia 6 e que a acionará o Ministério Público de São Paulo e a Defensoria Pública para que analisem a resolução de Derrite com critérios jurídicos.

O que diz a SSP

A SSP diz que, nos próximos dias, encaminhará as indicações para o cargo de ouvidor e para os integrantes da equipe executiva que comporão a nova Ouvidoria Setorial da pasta à Controladoria Geral do Estado (CGE) para avaliação.

Também afirma que o processo seguirá rigorosamente as determinações das Resoluções CGE nº 23/23 e nº 17/24, do Decreto Estadual nº 68.156, de 9 de dezembro de 2023, e da Resolução SSP-66.

“A Ouvidoria Setorial terá atuação independente e estará relacionada à qualidade e aprimoramento dos serviços prestados pela SSP que não se vinculem com ocorrências policiais que violem os direitos humanos. Ela será responsável por receber denúncias, sugestões e avaliações de serviços como registro de boletim de ocorrência, coleta de DNA, DDM Online, Disque Denúncia, entre outros”, diz, em nota.

Segundo a SSP, a Ouvidoria das Polícias “continuará sendo o órgão responsável pelo recebimento de denúncias relacionadas a violações de direitos fundamentais cometidas por policiais, sem nenhum impacto à sua atuação”.

Sobre o novo mandato, diz que a escolha do Ouvidor das Polícias será feita no momento adequado, “obedecendo ao ritual e às atribuições definidas pela legislação vigente”.

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