A noite em que Nunes parou na delegacia após tiros na porta da balada
Episódio ocorreu em Embu das Artes, em 1996, quando o prefeito tinha 28 anos; ele negou ter atirado e processo foi arquivado após acordo
atualizado
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São Paulo – Já era madrugada de segunda-feira quando um policial civil que fazia bico de segurança no Caipirão, uma casa noturna em Embu das Artes, na Grande São Paulo, ouviu barulho de tiro no estacionamento. Ele saiu do carro em que estava e foi conferir o que havia acontecido. No local, próximo à entrada do estabelecimento, encontrou Ricardo Nunes (MDB) segurando uma pistola calibre 380.
O episódio ocorreu no dia 23 de setembro de 1996, quando o atual prefeito de São Paulo tinha 28 anos e era apenas um empresário solteiro. O caso era desconhecido dos paulistanos até agora, mas seu registro figura na certidão de antecedentes criminais que a campanha de Nunes apresentou à Justiça Eleitoral em 2020, quando ele se elegeu vice-prefeito. O Metrópoles teve acesso ao processo e descobriu essa curiosa passagem na trajetória do emedebista.
Em frente ao Caipirão, Nunes foi conduzido pelo policial às três horas da manhã para a delegacia de Embu, por portar uma arma sem licença e atirar em via pública ou local habitado, duas contravenções penais (delitos de menor gravidade) à época. O dono da pistola estava com o prefeito no local e teria fugido na hora da abordagem.
Na delegacia, o policial contou que, após sair do seu carro por causa do barulho de tiro, “visualizou” Nunes “empunhando uma pistola e efetuando novo disparo”, enquanto um outro indivíduo fugia. O prefeito apresentou uma versão diferente e negou que tivesse atirado com a arma.
Em seu depoimento, segundo consta do termo circunstanciado obtido pelo Metrópoles, Nunes disse que estava acompanhado de um amigo chamado Marcio Gonzales Garcia, que foi “remover” a pistola dentro do carro e “acidentalmente a arma disparou”. Ainda segundo Nunes, o policial que o conduziu à delegacia pegou a arma dentro do carro, “debaixo do tapete do lado do passageiro”.
A pistola estava registrada em nome de Garcia, conhecido pelo apelido “Bexiga”. Ao delegado João Romano, Nunes disse que seu amigo deixou o local após o disparo e não compareceu à delegacia porque o policial “não o convidou” a prestar esclarecimentos. Nunes assinou o termo circunstanciado e foi liberado para ir embora.
Em 1996, tanto o porte de armas sem licença quanto o disparo de arma de fogo em local público eram contravenções penais (delitos de menor gravidade), uma vez que o Estatuto do Desarmamento, que impõe penas mais duras para essas infrações, só passou a valer no fim de 2003.
Contudo, mesmo sendo um delito de menor gravidade, Nunes foi alvo de uma denúncia assinada pela promotora Silvia Tomaz Lourenço Moreno de Oliveira, em junho de 1997, por infringir os artigos 19 (porte de arma sem licença) e 28 (disparar arma de fogo em local público ou habitado) da Lei das Contravenções Penais. O prefeito virou réu e seria julgado naquele ano.
Em 20 de outubro de 1997, dia da audiência na 2ª Vara de Embu, a promotora do Ministério Público de São Paulo (MPSP) propôs a transação penal, um acordo judicial em que o acusado concorda com uma pena alternativa para encerrar um processo. Nunes topou a proposta e entregou o equivalente a R$ 120 (em valor da época) em canecas plásticas ao serviço social da Comarca de Itapecerica da Serra.
No dia 19 de agosto de 1998, a juíza Bárbara Hinderberger Cardoso de Almeida determina o arquivamento do processo após Nunes apresentar o recibo de compra das canecas plásticas.
Garcia, o amigo do prefeito que era o dono da pistola e estava com ele em frente ao Caipirão na noite dos tiros, nunca foi ouvido sobre o caso. O Metrópoles não conseguiu localizar Garcia, que hoje tem uma empresa de construção na zona sul. O espaço segue aberto para manifestação.
O que Nunes diz hoje
Procurado pelo Metrópoles, o prefeito Ricardo Nunes se manifestou por meio de nota, dizendo que o episódio ocorrido em Embu das Artes é antigo e que envolveu um “disparo acidental de arma” registrada em nome de outra pessoa.
“O episódio datado há quase 30 anos refere-se a um disparo acidental de arma registrada em nome de outra pessoa e sem consequências para nenhuma parte. O depoimento foi atendido prontamente conforme orientação policial na ocasião. Tanto a arma como o veículo onde a mesma foi encontrada pertenciam a terceiro, que deixou o local sem prestar esclarecimento”, diz a nota.