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Telhada sobre bico na PM: “Sempre foi currículo, nunca foi vergonha”

Ex-comandante da Rota, o deputado federal Coronel Telhada diz que fez bico por 15 anos com o apresentador Gugu Liberato e foi punido na PM

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São Paulo — Coronel da reserva da Polícia Militar (PM), ex-comandante das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) e, atualmente, deputado federal, Coronel Telhada (PP) nunca negou que fez bico ao longo de toda a carreira. Foram 15 anos fazendo a segurança privada do apresentador Augusto Liberato, o Gugu, com quem acabou mantendo também uma relação de amizade e confiança.

O tema veio à tona nos últimos dias, após PMs serem flagrados fazendo a segurança do delator do Primeiro Comando da Capital (PCC) Vinícius Gritzbach, morto fuzilado no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, há 10 dias.

Em entrevista ao Metrópoles, Telhada afirma que já ficou preso no quartel e respondeu a procedimentos investigatórios por causa da atividade extra corporação, que é vetada na PM. “Todos nós que fazemos ou fizemos bico, sabemos que é público e notório que é proibido”, diz.

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O ex-comandante da Rota Paulo Telhada, durante trabalho como segurança do apresentador Gugu
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Porém, o coronel da reserva afirma que PMs fazem bico por necessidade e que, no passado, 70% da corporação atuava em segurança privada no horário de folga. “Mil vezes o homem fazer uma segurança, um trabalho na hora de folga do que ficar bebendo, tomando cachaça em boteco, arrumando problema, arrumando briga”, diz.

Segundo Telhada, entretanto, mesmo sendo uma infração grave, há limites para PMs que queiram se aventurar no bico, como trabalhar para suspeitos de participar do crime organizado, bicheiros, contrabandistas ou fazer escolta de dinheiro vivo e joias, por exemplo. “Aí, está pedindo para tomar paulada, né?”. Confira a íntegra da entrevista abaixo:

 

O que leva policiais a trabalharem no horário de folga como seguranças privados, mesmo sabendo dos riscos desse tipo de atividade?
Isso é simples. O que leva o policial a trabalhar na folga é uma procura de uma condição mais digna, uma condição salarial melhor, né? Ao longo dos anos, todo mundo sabe que a condição de pagamento para Polícia Militar sempre foi insignificante. Principalmente, nos anos do famigerado PSDB. Muito defasado, o salário. Não era dado reajuste, não era cumprida a data-base. Enfim, a tropa passava por muitas necessidades. Então, o policial, sim, o policial honesto, que honra o seu nome, era obrigado a trabalhar na hora de folga, sim, para poder completar o salário, poder pagar uma escola melhor para os filhos, dar condição de saúde para os filhos, uma alimentação melhor. Sem dúvida, o completamento através do bico sempre foi muito necessário. Essa é a grande realidade, a grande realidade.

O senhor sempre afirmou que fez bico ao longo da carreira na PM. Qual a sua opinião hoje sobre a atuação de policiais militares em atividade de segurança privada?
Policial militar é feito para trabalhar com segurança pública, segurança de dignitários, segurança de pessoas, em segurança de locais. O homem é preparado para essa missão. O homem que faz a segurança pública, ele faz a segurança privada também com maestria, porque ele conhece o serviço, ele é preparado para isso nas escolas. Cuidar de locais, de ocorrências, de autoridades. Então, ele consegue, sim, desempenhar o serviço de segurança privada a contento. Aliás, ele é muito valorizado, né? Porque ele tem a experiência, a expertise, tem o poder de polícia. Sempre foi muito valorizada a posição do policial. Os homens que fazem é porque necessitam. Repito, mil vezes o homem fazer uma segurança, um trabalho na hora de folga, do que ficar bebendo, tomando cachaça em boteco, arrumando problema, arrumando briga. Prefiro o homem trabalhando do que o homem criando problema.

De que forma os comandos devem lidar com essa situação? De que maneira o senhor lidava com comandados que faziam bico?
Todos nós que fazemos ou fizemos bico sabemos que é público e notório que é proibido. O regulamento sempre proibiu. O regulamento mudou em 2001. Até 2001, o fato de você fazer bico era uma falta leve. Era uma punição leve. Em 2001, houve a alteração no regulamento disciplinar da Polícia Militar e exercer função estranha ao serviço, que é o famoso bico, passou a ser uma punição grave. De 2001 para cá, começou a agravar. Até então, não era grave, era leve. Nós todos sabíamos que corríamos esse risco. Então, o policial que era pego fazendo bico, ele sabia que ia ficar preso, que iria tomar um, dois, três dias de prisão, que iria ficar sem ir para casa, que iria ficar dormindo no quartel. Eu mesmo fiquei algumas vezes. Você corria o risco, não podia reclamar que não sabia. Não podia ser mimizento, ficar chorando pelos cantos. Você fazia, assumia o risco. Se fosse pego, responderia por aquilo, como respondi várias vezes. No meu prontuário, tenho punições por fazer bico, sim, graças a Deus. Mas não tenho uma punição por fazer coisa ilegal, por pegar dinheiro, nada disso. Então, realmente, para mim, trabalhar na hora de folga sempre foi currículo, nunca foi vergonha.

Quais as principais dificuldades que o senhor encontrava para conciliar o trabalho na PM com a atividade privada na segurança de Gugu?
Sem dúvida, era a escala. A escala era corrida e, às vezes, no dia de serviço da polícia você tinha um show para fazer, tinha uma gravação. Aí, o que eu tinha, era chamar um policial que tivesse de folga, conhecia vários policiais, e esse policial que estivesse de folga era meu amigo, era um homem de confiança, ele ia no meu lugar e exercia o serviço, sempre através da minha coordenação, do meu controle. Ligava na época para o Gugu e dizia “não posso ir, porque estou de serviço na polícia. Mas vai fulano, vai beltrano, e era sem novidades, porque o Gugu, com o tempo, passou a conhecer esses policiais também e nós fazíamos um revezamento tranquilo, sem alterar e atrapalhar a escala na Polícia Militar. Uma outra coisa que é inadmissível também. O homem faz bico no horário de folga, depois no quartel, no serviço, querer ficar fazendo corpo mole, querer ficar dormindo. Isso é inadmissível. Nós sempre fomos o contrário disso. Nós fazíamos bico, sim, no horário de folga, e na hora do serviço trabalhávamos mais ainda. Tanto que a minha carreira, a minha vida, ao longo dos anos, sempre foi pontuada de muitas ocorrências, de muitas ações contra o crime. Isso aí sempre foi público e notório. Ou seja, a gente trabalhava forte no bico e trabalhava forte na PM, fazendo com que a gente desenvolvesse da melhor maneira possível. Então, para mim, nunca houve nenhum tipo de problema em fazer bico e trabalhar na hora de folga.

Como o senhor vê o fato de PMs atuarem como seguranças privados de pessoas investigadas, como no caso de Vinícius Gritzbach?
Olha, totalmente irregular. Aí, aí o cara pede para tomar uma paulada mesmo. Nós tivemos inúmeros casos na polícia de PMs que, no horário de folga, fizeram bico para bicheiro, fizeram bico lá para o pessoal da 25 de Março, lá para o chinês, que esqueci o nome dele [Law Kin Chong]. Esses policiais, na época, lembro que ele foi preso [Chong], 28 policiais também foram presos, foram mandados embora da polícia. Então, é aquela situação. Você fazer bico é irregular, é punição disciplinar, você vai ficar preso na polícia. Agora, você trabalhar com uma pessoa envolvida com o crime, trabalhar com uma pessoa que tem ligações com o crime, que é criminoso, não sei se é o caso desse rapaz [Gritzbach], não posso dizer isso, mas em outros casos aí, aí, sim, você não comete só uma infração disciplinar. Você comete um crime também e vai responder por esse crime. É grave, gravíssimo isso. Quando se alia ao crime, você, praticamente, responde em qualquer coautoria que houver. E, infelizmente, os colegas aí, não sei se eles sabiam ou não dessa condição do cidadão, se soubessem pior ainda, arriscaram e agora vão ter que responder por isso. É muito grave essa situação de estar fazendo segurança para indivíduo envolvido com o PCC. A gente sempre tomou essa cautela, quando a gente era convidado para um bico, para fazer uma segurança, a gente sempre levantava onde era, com quem era, por que era, qual o motivo, qual o serviço. Ah, vai escoltar dinheiro? Aí, está pedindo para tomar paulada, né? Vai escolar joia? Vai escoltar contrabando? Tá pedindo para ser incriminado e responder junto. Mesmo o bico, apesar de ser uma infração disciplinar, ele não pode ser com cometimento de crime. Ele não pode ser junto com criminosos. Aí, você se nivela no mesmo patamar e vai responder por isso.

Durante entrevista concedida ao atual secretário de Segurança Pública de SP, Guilherme Derrite, em 2020, o senhor citou a atuação como segurança do Gugu. O atual SSP é um admirador da sua trajetória, com quem o senhor mantém proximidade desde a época em que foi seu comandado. Na última segunda, Derrite disse que os PMs que faziam a segurança de Gritzbach “terão que explicar o que faziam, porque o simples fato de realizar um serviço extracorporação já configura uma contravenção disciplinar, que não é permitida”. Que conselho o senhor daria a Derrite em relação ao bico?
O Derrite, quando ele fala que os PMs vão ter que se explicar e que sabiam que realizar um serviço extracorporação já configura contravenção disciplinar, é o que falei. Todo policial militar sabe disso. Tá escrito no RDPM, Regulamento Disciplinar da Polícia Militar. O homem que se predispõe a fazer, ele se predispõe a responder disciplinarmente. Então, ele não pode alegar ignorância. Sempre soube disso, como lhe disse, respondi várias vezes, fiquei preso, respondi uma vez um conselho de justificação também, queriam me mandar embora da polícia como major, mas é o que te falei. Você assume o que você faz. Tem que ser sujeito homem, entendeu? O que o Derrite faz é uma postura adequada de um secretário, que tem que tomar a atitude, realmente. Qualquer comandante, ao ser instado, ao ser informado sobre uma infração disciplinar, sobre um crime que algum dos seus homens ou mulheres estejam praticando, ele tem que tomar a medida adequada, a medida disciplinar, a medida regulamentar a respeito, senão ele prevarica, ele comete um crime também. Então, atitude que o secretário de Segurança Guilherme Derrite toma é uma atitude legal, é uma atitude correta, e ele tem que fazer isso mesmo. Não há o que fazer, não há o que fazer. Tem que se tomar as providências, os policiais responderão. Espero que fique só no nível administrativo, responderão administrativamente, ficarão presos ou não, dependendo do que foi informado, aí, mas, infelizmente, essa é a triste realidade. Como lhe disse, eu mesmo respondi, várias vezes, fiquei detido no quartel por causa disso.

É possível estimar qual o percentual de PMs que fazem bico de segurança (exceto Dejem) fora do horário de trabalho atualmente em SP?
Hoje, creio que é bem baixo, justamente por causa da Dejem. A Dejem veio para, praticamente, acabar com o bico. O homem, na hora de folga hoje, faz a Dejem, faz a operação delegada também, com a prefeitura. Muito poucos policiais hoje preferem fazer um bico do que fazer a Dejem. O bico, como dissemos aqui, é uma infração disciplinar, você vai responder disciplinarmente, responder criminalmente, se for o caso. A Dejem, não. Você está de serviço, escalado pela polícia, fardado, armado, de viatura. Ou seja, é uma coisa totalmente legal. O valor que é pago hoje é um valor muito bom, que complementa bem o salário. Mesmo o pessoal que faz bico hoje sabe a dificuldade em se conseguir PM para fazer bico justamente por causa do advento da Dejem e da Operação Delegada. Agora, estimar esse número em porcentagem, eu não tenho essa porcentagem, creio que é baixa, com relação ao que foi no passado. No passado, eu lhe diria que praticamente 70% da tropa fazia bico, mas hoje creio que é bem abaixo disso. Se for estipular aqui uma porcentagem seria leviano, porque não tenho essa informação.

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