Motos ignoram sinal vermelho e superam 800 acidentes nos cruzamentos de SP
Motos se envolveram em 858 acidentes de janeiro a maio em cruzamentos de SP, segundo dados oficiais; desrespeito ao sinal vermelho colabora
atualizado
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São Paulo — Flagrantes de desrespeito dos motoqueiros ao sinal vermelho são frequentes nas ruas de São Paulo e ajudam a explicar uma trágica estatística no trânsito paulistano. Segundo dados oficiais, 858 acidentes envolvendo motos ocorreram em cruzamentos da capital paulista entre janeiro e maio deste ano.
Além da pressa e da imprudência dos motoqueiros, a fiscalização insuficiente ajuda a turbinar esses números. Só nos primeiros cinco meses do ano, as motos estiveram envolvidas em 141 dos 340 acidentes com morte na cidade de São Paulo — 41,5% do total.
Os dados oficiais são aqueles registrados pelo Infosiga, do governo estadual. Como são comuns ocorrências menos graves, em que as partes resolvem a situação sem a interferência policial, é de se esperar que o número de acidentes seja, na realidade, bem maior.
Se há subnotificação dos acidentes, pode-se dizer o mesmo das multas.
Os dados mais atualizados sobre infrações de trânsito em São Paulo são de março. Eles mostram que, no primeiro trimestre deste ano, foram aplicadas 9.037 multas a motociclistas por avanço do sinal vermelho — uma a cada 15 minutos. O condutor é autuado em R$ 293,47 e leva sete pontos na carteira de habilitação.
Do total, praticamente 7 em cada 10 infrações desse tipo foram anotadas por agentes de trânsito —ou seja, os chamados marronzinhos são fundamentais para detectar quem cruza semáforo fechado.
Mas a participação deles na aplicação das multas cai à metade do total, praticamente, nos fins de semana e também durante os períodos da noite e da madrugada, quando os agentes não são tão presentes nas ruas.
Os marronzinhos ouvidos pelo Metrópoles dizem que são em número insuficiente para fiscalizar a capital como um todo — apontam a realização de planos de demissão voluntária ao longo dos últimos, sem reposição, como causa do déficit. Também afirmam que os radares têm dificuldade para flagrar o avanço de sinal vermelho com a nova placa do Mercosul, o que contribui para a subnotificação.
Inconsequência
Especialista em mobilidade, Sergio Ejzenberg afirma que o problema vai além do desrespeito ao sinal vermelho. “Na ânsia de ganhar tempo e faturar mais, ou por prazer lúdico inconsequente, vemos motociclistas trafegando em excesso de velocidade, pela contramão, e até nas calçadas”, pontua.
O especialista afirma que é preciso trabalho de educação e conscientização dos motociclistas, em conjunto com os aplicativos de entrega, que concentram inúmeros colaboradores sobre duas rodas.
“Para os motociclistas que têm comportamento antissocial e perigoso por puro prazer, a fiscalização tem que ser rigorosa. Para isso, é necessário fiscalização eletrônica automática de velocidade e nos semáforos, bem como videomonitoramento”, afirma.
Ejzenberg também frisa que quem infringe regras de trânsito coloca todos em perigo .”Os riscos recaem sobre os próprios motociclistas, vítimas das próprias estripulias, e sobre os pedestres atropelados por motos velozes que desrespeitam as travessias existentes nos semáforos”, ressalta.
Precariedade
Presidente do Sindicato dos Mensageiros Motociclistas, Ciclistas e Moto-Taxistas do Estado de São Paulo (Sindimoto), Gilberto Almeida dos Santos afirma que não há motivo para que motociclistas ou motoristas avancem o sinal vermelho.
“Não vale a pena colocar sua vida e a de outras pessoas, seu patrimônio e sua habilitação em risco para ganhar 30 segundos, 1 minuto na entrega”, destaca.
Basta parar em um cruzamento com semáforo para flagrar cenas de desrespeito. Em uma tarde na rua, por exemplo, o Metrópoles flagrou 18 motociclistas avançando o sinal vermelho em quatro cruzamentos distintos da cidade ao longo de uma hora — 15 minutos em cada.
Gil, como é conhecido pela categoria, ressalta que a precarização das relações trabalhistas favorece esse tipo de imprudência, por mais que não a justifique. “A gente sabe dessa situação toda, da exploração das empresas de entrega por aplicativo, que vêm desvirtuando as leis do trabalho, as convenções coletivas, e remunerando esses trabalhadores por entrega”, pondera.
“De certa forma, empurra o trabalhador para correr e se expor cada vez mais em situações como [avançar] o farol vermelho, entre muitas outras”, argumenta.
Fiscalização
Responsável por fiscalizar o trânsito paulistano, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) afirma que há 894 pontos de fiscalização eletrônica na cidade.
Além disso, diz a CET, todos os agentes de trânsito estão aptos a fiscalizar avanço ao semáforo vermelho, “lembrando que essa infração está diretamente relacionada ao mau comportamento do condutor infrator, seja este motorista ou motociclista”.
A companhia afirma também que promove gratuitamente cursos e atividades para educar motociclistas e campanhas de conscientização de todos os usuários do trânsito, como o Maio Amarelo e a Semana da Mobilidade.
Procurada pelo Metrópoles, a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que representa parte dos aplicativos, afirma que segurança viária é um tema prioritário.
“Nossas empresas incentivam, por meio de cursos, campanhas e comunicações constantes com entregadores parceiros, o respeito às leis de trânsito”, diz. “Não há nenhum tipo de incentivo a práticas que estejam fora de conformidade com a legislação”, afirma, em nota.