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Moto por app: entenda a briga jurídica envolvendo a prefeitura e a 99

Prefeito Ricardo Nunes (MDB) prometeu ir à Justiça para barrar retomada do serviço de transporte de moto por aplicativo, anunciado pela 99

atualizado

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Imagem colorida mostra o prefeito Ricardo Nunes, homem branco, de cabelo e barba pretos, vestindo terno azul e camisa branca, durante entrevista ao Metrópoles em seu gabinete - Metrópoles
1 de 1 Imagem colorida mostra o prefeito Ricardo Nunes, homem branco, de cabelo e barba pretos, vestindo terno azul e camisa branca, durante entrevista ao Metrópoles em seu gabinete - Metrópoles - Foto: DANILO M. YOSHIOKA/METRÓPOLES

São Paulo – A decisão da empresa 99 de retomar o serviço de transporte de moto por aplicativo na cidade de São Paulo fez reviver uma disputa jurídica envolvendo o município e as plataformas.

A Prefeitura da capital afirma que a empresa não tem autorização para usar motocicletas no transporte de passageiros na cidade, com base em um decreto editado em janeiro de 2023 que proibiu esse tipo de serviço.

A alegação é que o aumento de motociclistas em circulação na cidade tem feito crescer o número de acidentes fatais no trânsito.

“A 99 coloca em risco motociclistas e pessoas que possam usar o serviço. Em 2024, entre janeiro e julho, foram registradas 329 mortes de motociclistas na cidade de São Paulo. No mesmo período, em 2023, foram 240 óbitos. Um aumento de 37%”, afirma a prefeitura em nota.

A 99, por outro lado, argumenta que está resguardada pela lei federal que estabelece a Política Nacional de Mobilidade Urbana que, desde 2018, permite o serviço de transporte individual privado de passageiros.

“A legislação estabelece que as prefeituras podem regulamentar e fiscalizar a atividade com exigências específicas, mas não podem proibi-la. Já existem mais de 20 decisões judiciais confirmando esse entendimento, que é confirmado também pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em decisão de repercussão geral”, afirmou a empresa em nota.

A decisão do STF mencionada é a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 449 que, em 2018, considerou inconstitucional a proibição ou restrição de atividade de transporte privado individual por motorista cadastrado em aplicativo, “por violação aos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência”.

Segundo ainda a 99, a volta do serviço de “mototáxi” por aplicativo está “alinhada ao entendimento de 20 decisões judiciais em todo o Brasil: a de que cabe ao município regulamentar a atividade com regras específicas para a localidade, mas não proibir um serviço que é permitido por legislação federal e opera em mais de 3.300 cidades”;

Após a decisão da plataforma, o Comitê Municipal de Uso do Viário (CMUV) notificou a empresa, determinando a suspensão imediata do serviço de transporte de moto por aplicativo na cidade.

A 99 afirmou que vai manter a operação e que “segue defendendo a legalidade da categoria, adotando todas as medidas cabíveis, nas instâncias adequadas, para preservar os direitos da companhia e dos usuários da modalidade”. O serviço está sendo oferecido, por enquanto, apenas fora do centro expandido e será ampliado gradualmente, de acordo com a empresa.

Após esbravejar contra a decisão da 99 e classificar a empresa como “irresponsável”, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) afirmou nesta terça-feira (14/1) que entrará com uma ação judicial para barrar a iniciativa. Afirmou ainda que a liberação do serviço vai causar uma “carnificina na cidade”.

“A decisão da 99 segue na contramão do trabalho realizado pela atual gestão, que inovou ao implantar a Faixa Azul, um modelo pioneiro que prioriza a segurança dos motociclistas reduzindo a gravidade dos acidentes em 212 quilômetros de vias sinalizadas”, afirmou a prefeitura, em nota.

Na tarde desta terça, o SindimotoSP, sindicato que representa a categoria dos motociclistas, emitiu nota repudiando o retorno do serviço pela 99.

“Para o SindimotoSP, a insistência da 99 com esse serviço de transportes de passageiros com moto só aumentará o número de vítimas, além de, no caso dos acidentes, deixar os motociclistas e passageiros na mão, tendo que os mesmos arcarem com os custos e muitas vezes, com a própria vida”.

A 99 afirma que conta com mais de 50 funcionalidades de segurança para proteger usuários e motoristas, “como alerta de velocidade com avisos visuais e sonoros, governança contra direção perigosa, monitoramento em tempo real das corridas, botão de emergência e uma central emergencial disponível 24 horas”.

Limbo jurídico

Para a advogada Amanda Regina da Cunha, especialista em Direito Civil e Processual Civil, a legislação federal dá ao município o direito de regulamentar o serviço e, portanto, a prefeitura pode determinar sua suspensão.

Além disso, segundo Amanda, tanto o entendimento do STF como a lei federal não versam especificamente sobre o uso de motos no transporte por aplicativo, mas sim de carros.

“A Constituição, no artigo 30, inciso I, fala que compete aos municípios legislar sobre assuntos de interesse local. O decreto do município suspende essa prestação de serviço com base em estudos que falam do aumento dos acidentes de trânsito. Nesse sentido, entendo que o município, com base em fatos e leis, tem autorização para editar essa norma e colocá-la em prática.

Para a especialista, portanto, a 99 se utiliza de uma brecha jurídica para retomar o serviço. “O entendimento do STF é muito baseado na prestação do serviço em si de usar veículo particular por aplicativo, e não fala exatamente da utilização de motocicleta, muito menos analisa o fato do aumento de acidentes”, diz.

Já o professor da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) do Rio de Janeiro, Felipe Fonte, entende que o município não pode proibir a atividade via decreto.

“A Constituição Federal diz que as atividades econômicas são livres à iniciativa privada, ressalvadas aquelas proibições ou condicionamentos criados por lei”; diz.

Ele argumenta que o município já havia editado uma lei tentando proibir o transporte por aplicativo, o que acabou gerando posteriormente o entendimento atual do STF, de que os municípios não podem proibir as atividades.

“Na minha visão, não há nenhuma razão para entender que o transporte por aplicativo seja restrito apenas aos carros. Se permite um transporte de dois ou três passageiros, não faz sentido proibir que se faça o mesmo transporte por moto”, afirma.

O jurista ainda explica que, no caso dos serviços de táxi ou mototáxi “tradicionais”, entende-se que o município tem poder de definir as regras, regulamentações e eventuais proibições. Os mototáxis também são proibidos na cidade de São Paulo. Já o transporte por aplicativo, segundo Fonte, a legislação entende como um serviço privado.

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