Mortes e sumiços em meio a racha na cúpula acuam tropa do PCC nas ruas
Membros de escalões inferiores do PCC estão “em cima do muro” diante de disputa que rachou a cúpula da facção, segundo promotor do MPSP
atualizado
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São Paulo — O racha histórico no Primeiro Comando da Capital (PCC) é algo claro entre os membros da cúpula da maior facção criminosa do país, mas está deixando lideranças menores “em cima do muro” e a tropa que opera o tráfico de drogas nas ruas acuada diante das mortes e dos desaparecimentos de “irmãos” faccionados na guerra interna.
Essa é a avaliação do promotor de Justiça Lincoln Gakiya, que investiga o PCC há duas décadas e já foi alvo de um plano de sequestro e assassinato da facção, descoberto pela Polícia Federal (PF) no ano passado.
Em entrevista ao Metrópoles, o promotor do Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de São Paulo (MPSP), afirma que, atualmente, a maioria dos chefões de fora do sistema prisional, que compõem a chamada Sintonia da Rua, apoia a liderança de Marco Herbas Willians Camacho, o Marcola, tido, por ora, como o membro da cúpula do PCC com maior protagonismo entre as bases.
O promotor explica que as principais lideranças em liberdade, responsáveis pelo tráfico internacional de drogas, têm entre 30 e 40 anos de idade e, por isso, não conhecem Marcola pessoalmente — ele está preso desde 1999.
Gakiya acrescenta que o apoio dessa nova geração está condicionado aos líderes que conseguem garantir as condições estruturais e logísticas para ela seguir faturando milhões com o despacho de cocaína para a Europa.
“Esses novos membros da facção não são ligados à ideologia [paz, justiça e liberdade] que norteou os mais antigos. O negócio deles é faturar, ganhar dinheiro com o tráfico internacional”, diz.
Como Marcola ainda é visto como uma espécie de fiador dessa logística, ele conta com o apoio dos chefões das ruas, seguidos por seus subordinados.
“Esse pessoal mais abaixo na hierarquia vai seguir o que for imposto pelas instâncias superiores. Eles ficam em cima do muro. Quem os sintonias mandarem seguir, seguirão. A base apoia o Marcola por medo”, afirma Gakiya.
O receio dos criminosos com postos mais baixos, mas com poder, como gerentes do tráfico, é o de expor qualquer tipo de apoio e que seus posicionamentos lhes custem caro, porque a definição de quem mandará no PCC no futuro segue incerta.
Isso porque a liderança de Marcola é contestada por três antigos aliados: Roberto Soriano, o Tiriça, Abel Pacheco de Andrade, o Abel Vida Loka – ambos faziam parte da alta cúpula desde 2002 – e Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho. Os três foram expulsos e condenados à morte, por meio de um salve enviado por Marcola à Sintonia da Rua.
Mortes e desaparecimentos
O racha, segundo Gakiya, estaria resultando no desaparecimentos de membros da facção, ligados tanto ao grupo de Marcola quanto ao do lado de seus ex-aliados. Ao menos três assassinatos de membros do PCC também estão na conta da guerra que opõe suas lideranças máximas.
Alguns familiares já procuraram o Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil, para relatar o desaparecimento de criminosos. Não são pessoas diretamente ligadas às famílias da cúpula, mas que mantinham algum tipo de conexão com os chefões.
“Soube que alguns criminosos nem de casa estão saindo. Eles esperam a poeira baixar para ver o que vão fazer”, diz o promotor.
Isso ocorre porque, como revelado pelo Metrópoles, Tiriça, Abel e Andinho estão se movimentando nos bastidores para tentar reverter a expulsão decretada por Marcola. Além deles, mais dois chefões do PCC se voltaram contra o líder máximo da facção: Daniel Vinicius Canônico, o Cego, e Reinaldo Teixeira dos Santos, o Funchal.
Caso eles sejam bem-sucedidos, esse pode ser o fim da era de Marco Willians Herbas Camacho como líder máximo da facção, após mais de 20 anos. Para Gakyia, mesmo que Marcola consiga se manter no poder, ele sairá da disputa enfraquecido.