Hotel diz que comprou de colecionador italiano obra de igreja tombada
Escultura que estava desaparecida de igreja foi encontrada no Hotel Unique; estabelecimento diz que aquisição foi feita “de forma legal”
atualizado
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São Paulo — O Hotel Unique, em São Paulo, informou ao Metrópoles que a escultura de São Jorge encontrada no estabelecimento foi adquirida do arquiteto e colecionador italiano Ugo di Pace. A assessoria do hotel afirmou que a aquisição da obra, investigada após ter desaparecido de uma igreja tombada em Itu, aconteceu “de forma totalmente legal” e está exposta no local desde 2004.
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) está investigando a denúncia feita pelo museólogo Emerson Ribeiro Castilho a respeito do paradeiro da obra de arte, desaparecida da Igreja do Carmo há mais de 50 anos.
“A obra foi adquirida de forma totalmente legal do icônico colecionador de arte Ugo di Pace e está exposta no lobby do hotel – uma área aberta ao público e de livre circulação de todos – desde 2004”, disse o Unique, em nota.
O estabelecimento afirmou que, assim que teve conhecimento do “suposto desaparecimento da obra”, informou o Iphan, que visitou o local. Ainda de acordo com o comunicado, “a pedido do próprio Unique, [o Iphan] instaurou um procedimento administrativo para averiguar o tombamento do bem”.
Nascido em Nápoles, Ugo di Pace tem 96 anos e é conhecido pelos trabalhos de arquitetura em casas e mansões de luxo na capital paulista. O Metrópoles não conseguiu localizar a defesa do colecionador para confirmar se a escultura estava em seu acervo. O espaço segue aberto para manifestações.
Modificações na obra
Considerada patrimônio cultural histórico, a escultura de São Jorge tem 1,70 m e quase 200 anos. A peça recebeu itens inexistentes na escultura original, como um cavalo e um dragão.
Os detalhes da armadura são cobertos de ouro, mas ela está desmontada e precisa de restauração. Um turista teria a derrubado após subir no cavalo da escultura. O acidente com a obra não teria sido o único – há vários casos registrados de danos à estrutura.
Questionado sobre as modificações na peça, o Unique afirmou que “a obra se encontra em uma área preservada e monitorada com câmeras e está sendo restaurada com todo cuidado por Julio Moraes – um dos maiores nomes no segmento de preservação, conservação e restauro no país –, com conhecimento do Iphan, por conta de recente incidente causado por um cliente”.
Ao Metrópoles, o Iphan confirmou “que autorizou, no mês de setembro, o processo de intervenção na imagem de São Jorge, visando à preservação e leitura da peça, devendo ser observados os princípios mínimos de intervenção. Serão feitas limpeza, restauro da pintura e reintegração das partes que foram danificadas”. O instituto afirma que não serão realizadas modificações e/ou descaracterização da peça.
“O Instituto continua apurando sobre a proveniência da escultura e se esta é objeto de tombamento federal. A intervenção foi autorizada considerando que a conservação e a restauração dos bens culturais são fundamentais para a preservação da memória nacional”, afirmou o Iphan, em nota.
Outra obra desaparecida
A pintura Cristo Escoltado também estava listada como desaparecida da Igreja do Carmo. A obra foi comprada e vendida por vários colecionadores, até parar no acervo de Emanoel Araújo, morto em 2022. O quadro fazia parte do catálogo de leilão previsto para acontecer nessa segunda-feira (25/9). O Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) solicitou a suspensão do evento.
Na lista do leilão, a obra apresenta outro nome — Martírio de Jesus — com lance mínimo de R$ 40 mil. O Iphan solicitou a retirada da peça do leilão enquanto “apura sobre a proveniência da escultura e se esta possui tombamento federal”, afirmou em nota.
O instituto afirmou que alguns aspectos precisam ser verificados para tomar as medidas necessárias do ponto de vista de proteção do patrimônio cultural.
O órgão esclareceu que está verificando se os bens culturais foram retirados da igreja antes ou depois do tombamento, uma vez que existe a possibilidade de que as peças não integrem o acervo tombado.
Além disso, o Iphan apura como os bens foram retirados da igreja — se de maneira lícita ou ilícita —, e analisa os arquivos e documentos disponíveis no processo de tombamento para fins de identificação do acervo móvel existente no local.
O Ibram não respondeu à reportagem. O espaço segue aberto para manifestações.