“Fantasmas do Copan” vão além do meme e movimentam grupos de moradores
Relato de supostos “fantasmas” no Copan, prédio icônico no centro de SP, viralizou nas redes sociais, mas as lendas de espíritos vão além
atualizado
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São Paulo – Todo prédio tem um grupo de mensagens para os moradores compartilharem alertas, serviços e queixas. Isso não é diferente no Edifício Copan, no centro da capital paulista, que já chegou a ter cinco mil habitantes e, hoje, estima-se que seja o lar de cerca de três mil pessoas. A peculiaridade é que um dos assuntos que mais movimentam as conversas dos moradores dos 1.160 apartamentos são os fantasmas.
Recentemente, a experiência de Zaia, de 26 anos, com um “espírito” vazou do grupo de mensagens do condomínio e acabou viralizando nas redes sociais. A tatuadora mora há nove meses no prédio projetado pelo arquiteto Oscar Niemeyer e inaugurado em 1966 e ouviu as primeiras vozes “do além” num dia em que dispensou o elevador.
“Eu estava descendo pelas escadas e escutei um ‘psiu’ bem no pé do meu ouvido, virei e não tinha ninguém. Continuei descendo e escutei novamente. Eu achei que estavam me zoando, mas não tinha como uma pessoa sair correndo e eu não escutar na escada. Foi bem estranho e guardei para mim”, afirma Zaia.
A moradora do bloco B, local apontado como um dos focos de “fantasmas”, foi adicionada ao grupo de mensagens no dia seguinte e se deparou com uma reclamação: “Gente, o fantasma do 7º andar está me assustando novamente”. Ela questionou se os vizinhos estavam falando sério ou se estavam brincando.
“Começaram a contar relatos até piores do que o meu. Comecei a acreditar que era realmente uma coisa sobrenatural, porque não tinha explicação, sinceramente, não tinha explicação. Muita gente contou que viu parecido ou pior e depois desse lance da escada aconteceu mais coisa. Então, eu estou começando a achar que é espírito mesmo”, diz Zaia. Apesar do medo, ela não pretende deixar o Copan.
“Cafetão do 7º”
Um dos fantasmas mais famosos no grupo de mensagena é o “Cafetão do 7º” andar, do bloco B. Alguns moradores acreditam, inclusive, que foi o espírito dele que se aproximou de Zaia nas escadas e tentou chamar a sua atenção com o “psiu”.
A lenda que circula é que o tal cafetão viveu no Edifício Copan entre as décadas de 1970 a 1990, período que o prédio ícone de São Paulo virou cenário de prostituição e tráfico.
“Deve ter sido algum cafetão dos anos 1970 que matou alguém naquela banheira”, brincou Denis Ferri, de 36 anos, quando duas amigas “esotéricas” afirmaram que o local tinha uma “energia pesada”. O arquiteto tinha acabado de se mudar para a unidade 717 do bloco B, em 2019.
Na época, o novo morador do Copan colocou cristais na banheira e seguiu com a vida. Apenas estranhava se sentir observado mesmo quando estava sozinho no local. Em uma noite na qual trabalhou até mais tarde, Denis também teria visto vultos e ouvido o barulho de algo caindo, mas não encontrou nada que tivesse ido ao chão.
Denis afirma que apenas no fim do ano passado descobriu sobre o “fantasma” pelo grupo de mensagens. Na ocasião, moradores mais antigos disseram para ele, no privado, que o suposto “Cafetão do 7º” morava no 717, exatamente o apartamento dele.
“O que me pegou muito foi isso: a brincadeira que eu fiz quando eu mudei para cá sem saber da história”, diz o arquiteto. Ferri é agnóstico e tenta se manter isento sobre os “fantasmas do Copan”.
“Não sei se eu acredito, mas eu não desacredito. Eu prefiro não questionar. Mas acho legal como virou uma diversão no grupo. Mas os moradores kardecistas pedem para não mexer, não brincar, ‘se não vai aparecer mesmo’. Acho que é mais uma dinâmica para pensar a comunidade e esse edifício, que é um patrimônio histórico. Tem muitas histórias aqui dentro”, diz o arquiteto.
O atual morador do 717 do bloco B do Edifício Copan está de mudança, mas o cafetão não tem nada a ver com isso. Denis está deixando o imóvel por causa do aumento do valor do aluguel e de uma infiltração no banheiro que a proprietária não quer consertar.
O “Cafetão do 7º”, às vezes, também vaga pelo 6º andar do bloco D do Copan, onde Juliana Andrade, de 28 anos, mora desde 2017. Ela afirma que começou a se deparar com o tal espírito quatro meses após se mudar, isso muito antes de o tema ficar em alta no grupo de mensagens.
De qualquer maneira, ela não cogita deixar o apartamento no Copan: “Pode aparecer um batalhão de fantasmas aqui que eu sirvo café e pergunto se quer sentar, mas eu não saio daqui”, brinca.
Suspeitas na madrugada
O ator Nobu Kahi, de 36 anos, se mudou para o bloco B do Copan há apenas dois meses, mal terminou de decorar o apartamento, mas afirma já ter vivenciado situações esquisitas e até sobrenaturais.
“Todo dia eu acordo às 3h40, às vezes com frio, às vezes com calor, um dia ouvi alguém gritando, o que é esquisito porque aqui os apartamentos são bem isolados. Essa noite sonhei ou escutei, não sei ao certo, que alguém estava mexendo na chave da porta. Quando acordei de manhã a chave tetra estava trancada. O que é muito estranho porque eu não tranco a porta, porque tem a fechadura eletrônica. Com certeza eu não tranquei essa porta”, diz Kahi.
Budista, ele conta que que montou um “altarzinho” com imagens religiosas dentro de casa e que está se acostumando a conviver com os tais “fantasmas” do Copan. “Os espíritos, as energias já estavam aqui, então tenho que pedir licença para poder morar aqui também. O mais assustador é o preço do aluguel”, diz.
Fantasma raiz
Affonso de Oliveira, de 83 anos, é síndico do Copan há 30 anos. Ele, que também é chamado de “prefeito” por alguns moradores, mostra orgulhoso o sistema de vigilância de câmeras 24 horas e avisa: “Nós nunca constatamos nada”. Porém, ele diz conhecer a primeira história de “fantasma” que surgiu há 20 anos, com um mecânico da manutenção do prédio.
“Uma noite tinha um problema no elevador e ele subiu na casa de máquinas. Ao entrar no local, ele se deparou com uma figura sentada em cima do motor de tração. Ele se assustou e caiu fora. No dia seguinte, ele veio muito assustado dizendo que não voltaria mais aqui, não faria mais serviços. Nós conseguimos contornar. Mas me pareceu muito real. Eu não acredito que ele iria mentir”, relata o síndico.
Mesmo assim, Oliveira faz piada com o assunto sobrenatural. “A minha maior preocupação é que, de repente, o fantasma peça para eu pagar fundo de garantia. Vai saber há quanto tempo ele está trabalhando aqui? E pior: as câmeras dizem que ele não anda trabalhando muito”, debocha.
Casa de máquinas
Rafael Tomazi, de 40 anos, faz parte do grupo de moradores que não acreditam nos eventos sobrenatuais. O empresário, inclusive, tem uma explicação para o surgimento do “fantasma da casa de máquinas”, que fica próxima à casa do zelador do Copan. “Acredito que o fantasma na casa de máquinas foi algo inventado para a galera parar de encher o saco (do zelador) de madrugada”, diz Tomazi.
O empresário mora há 10 anos no 7º andar do bloco B do Copan e diz que sempre existiram os supostos relatos de experiências sobrenaturais, mas que, agora, ocorre um “hype dos fantasmas” porque o grupo de mensagens é um ambiente que promove mais o assunto.
“Não que eu não acredite nessas pessoas. Pode ser uma alucinação coletiva, uma coincidência, um medo pontual, mas eu acho engraçado, entro na brincadeira, mas não que eu tenha visto ou presenciado alguma vez. É um prédio antigo com muito morador, muita história, não era difícil que acontecesse alguma coisa inexplicável ou várias”, afirma Tomazi.
Para o morador, muitos fenômenos relatados por seus vizinhos podem ser atribuídos às instalações elétricas antigas e à estática. É a explicação que ele dá para a câmera de segurança com sensor de presença em seu apartamento que ligou sozinha um dia e ficou gravando “o nada” por horas.
“O prédio é muito antigo, tem uma instalação elétrica que também é um pouquinho antiga. É natural que as coisas queimem, liguem, desliguem, os objetos caiam. Não que tenha uma entidade. O mais curioso é que muitos costumam ver exatamente a mesma pessoa e ficam assustados”, diz o empresário.
Entre tantas explicações para acalmar os vizinhos assustados, o morador do 7º andar do bloco B ainda demonstra preocupação com o fato de que os “fantasmas” podem atrair para o Copan um turismo indesejado.
“Meu receio é isso atrair streamers que tirem a nossa paz de madrugada. Imagina no meu corredor um monte de caça fantasma gritando assustado e usando detector que eu desconheço, perturbando meu sono na porta de casa? O turismo tem que ser pela beleza do prédio, pela importância que ele tem na cidade. Não o turismo só por conta do fantasma do 7º andar”, diz Tomazi.