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“Escravas virtuais” são vítimas do medo de rejeição, diz especialista

Professora de Psicologia da Educação avalia como meninas adolescentes se tornam vítimas de tortura em salas virtuais do aplicativo Discord

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Hacker ataque - Ataques na internet, hackers, rede de sistemas, violações de dados sigilosos, documentos expostos, ciberataque11
1 de 1 Hacker ataque - Ataques na internet, hackers, rede de sistemas, violações de dados sigilosos, documentos expostos, ciberataque11 - Foto: Hugo Barreto/Metrópoles

São Paulo – Medo de rejeição, manipulação e necessidade de pertencimento. Esses são os principais fatores que levam meninas adolescentes a se submeterem a sessões de tortura e humilhações transmitidas ao vivo para uma plateia de espectadores on-line em salas fechadas do aplicativo Discord.

Nessa sexta-feira (5/5), o Metrópoles mostrou como jovens promovem abusos psicológico, físico e sexual por meio da plataforma. Sob ameaças e chantagens, garotas viram “escravas virtuais” dos agressores, praticando automutilação, esquartejamento de animais e até zoofilia.

Os crimes são investigados pela Polícia Federal (PF) e pela Polícia Civil de São Paulo. Um rapaz de 20 anos já foi preso em Minas Gerias, e um adolescente de 17 anos, apreendido em Mauá, na Grande São Paulo. Outros cinco jovens já foram identificados.

A professora Luciene Tognetta, do Departamento de Psicologia da Educação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), afirma que a submissão das adolescentes aos abusadores não pode ser entendida “de uma forma só.”

Em primeiro lugar, a especialista pontua que a forte necessidade de pertencimento é um dos fatores que influenciam no comportamento das vítimas. Segundo Luciene, elas procuram uma “aprovação social”.

As investigações da Delegacia de Combate à Pedofilia de São Paulo mostram que, em alguns casos, mais de 700 pessoas assistiram às sessões de tortura de meninas, como no vídeo abaixo.

 

O grande volume de espectadores, reitera a professora da Unesp, explicaria a atitude das jovens para se sentirem incluídas em um grupo. “Isso explica, em parte, o comportamento de algumas delas”, diz a acadêmica, que também é membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Moral (Gepem).

Vídeos encontrados no computador de um adolescente de 17 anos, apreendido em 6 de abril na cidade de Mauá, Grande São Paulo, mostram garotas chorando enquanto se cortam, introduzindo objetos na vagina e sofrendo violência psicológica. São verdadeiras sessões de tortura em salas virtuais de terror.

As meninas praticam a autoviolência, segundo Luciene, por medo de serem expostas pelos algozes.

Os abusadores sabem de detalhes da vida das vítimas — como endereço da casa, da escola e os nomes dos pais —, que são usados para chantagear as garotas. Além disso, há casos em que os criminosos enganam as meninas, em falsos relacionamentos on-line, conseguindo imagens que depois são utilizadas para ameaçá-las.

“Elas acabam fazendo o que os abusadores pedem por medo da ameaça, porque isso vai colocar sua intimidade em risco. Vai fazer com que elas se sintam envergonhadas, não só diante dos pais, mas também diante dos outros”, frisa a educadora.

Abusadores

Segundo a professora, os abusadores são pessoas “altamente inteligentes”, que descobrem tudo a respeito das vítimas para persuadi-las a realizar os atos, mesmo que elas não queiram.

“Eles são capazes de pegar exatamente aquilo que é o mais importante para as vítimas, que tem valor para elas, que é mais delicado. O abusador sabe onde atingi-las, porque estudou com afinco os desejos, as necessidades, as expectativas, o sentido para a vida que as vítimas têm.”

A especialista explica que a adolescência é um período em que o indivíduo começa a se dar conta de quem de fato é quando se empodera de sua própria identidade, sem depender mais de seguir exclusivamente pais e professores. E há os casos em que os jovens não se sentem valorizados, mas deslocados, e tentam ser reconhecidos de alguma forma.

“Daí a falta de respeito que alguns sentem contra si mesmos. Precisam buscar esse valor nessas condições [de violência], mesmo que seja feito contra o outro, como um gato, um animal de estimação”.

Luciene Tognetta se refere a imagens em que as meninas adolescentes estrangulam e decapitam bichos de estimação, a pedido dos abusadores, nas sessões virtuais de tortura. Há casos em que animais são queimados vivos e a violência é acompanhada por centenas de usuários on-line no Discord.

Criminalização

A melhor forma de combater esse tipo de agressão, segundo a professora da Unesp, é criminalizando os aliciadores e regulamentando os ambientes virtuais.

“Lidar com esses sujeitos não significa perdão, tolerância. Sem romantismo, levando florzinha da paz, isso não vai resolver esses casos. Essas meninas sofrem ali na rede social, como estão sofrendo no cotidiano, porque não sentem valor por si nem lá, nem cá. E os abusadores, assediadores, pedófilos, o são porque lhes falta moral, porque lhes falta alguém que lhes interdite.”

A especialista conclui afirmando que pais e educadores precisam procurar os jovens para conversar, porque os adolescentes “não irão pedir ajuda”. “Não sabemos o que essa juventude vive. Estamos longe deles porque não nos aproximamos, não abrimos espaço, isso precisa ser mudado com a criação de espaços de diálogo, de aproximação.”

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