Entenda como funciona comissão que avalia entrada de cotistas na USP
Processo para avaliar possíveis fraudes de cotistas pode ter até quatro etapas e reúne representantes da universidade e da sociedade civil
atualizado
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São Paulo – Pelo menos três estudantes cotistas entraram na Justiça contra a Universidade de São Paulo (USP) por terem a matrícula cancelada após a instituição não reconhecê-los como pardos. A decisão sobre negar a entrada dos alunos foi tomada pela Comissão de Heteroidentificação, criada pela USP para evitar fraudes na política de cotas.
A comissão analisa os casos de estudantes que se candidataram para as vagas destinadas a pretos e pardos nos cursos de graduação. A decisão sobre barrar ou não a entrada de um aluno pode passar por até quatro etapas. Entenda abaixo como funciona o trabalho da comissão.
Bancas de Heteroidentificação
A análise dos casos começa com as chamadas “Bancas de Heteroidentificação”, que avaliam fotografias enviadas pelos alunos durante a pré-matrícula para identificar possíveis fraudes. Todos os estudantes aprovados no vestibular e que se autodeclararam pretos ou pardos passam por essa etapa.
A USP tem duas bancas, com cinco membros cada. Cada uma delas possui um professor da universidade, eleito por seus pares; um aluno da graduação e um aluno da pós-graduação, ambos indicados pela Coligação dos Coletivos Negros da USP; um representante da sociedade civil organizada, com comprovada atuação na defesa de ações afirmativas; e um servidor técnico e administrativo, eleito por seus pares.
Os professores e servidores que fazem parte das bancas têm mandato de dois anos. Já os alunos e o membro da sociedade civil têm mandato de um ano.
Como funciona a avaliação das bancas?
Segundo a USP, os membros das bancas avaliam apenas as características fenotípicas dos alunos. São considerados para a aprovação fatores como a cor da pele (se é morena ou retinta), o formato do nariz (se tem base achatada e larga), os cabelos (se são ondulados, encaracolados ou crespos) e os lábios (se são grossos).
Cada foto é submetida a uma banca por vez. “Se identificados alguns desses elementos, a banca sugere a aprovação da autodeclaração”, afirma a universidade.
Se a foto não for aprovada pela primeira banca, por maioria simples, a imagem é enviada para a segunda banca. Os membros que fazem a análise não sabem se estão vendo uma foto que já foi negada ou se ela está ali para a primeira avaliação.
Se nenhuma das duas bancas aprovarem a foto por maioria simples, o candidato passa para a terceira etapa de checagem: a de averiguação presencial ou virtual.
Em 2024, 1.498 estudantes entraram na USP após ter a foto aprovada pelas bancas.
Averiguação
Estudantes aprovados pela Fuvest e que tiveram suas fotos reprovadas pelas duas bancas são obrigados a ir presencialmente até a universidade para uma averiguação. A ideia, segundo a USP, é que a universidade possa “captar melhor a imagem” dos candidatos para confirmar a declaração.
“Como a análise é estritamente fenotípica, a banca não faz nenhum tipo de pergunta sobre a vida dos candidatos. O que conta mesmo é a cor da pele, os cabelos e a forma da boca e do nariz”, afirma a instituição de ensino.
No caso dos candidatos aprovados pelo Enem e o Provão Paulista, a averiguação é feita de forma virtual, com uma videochamada. A USP alega que optou por fazer a análise virtual destes estudantes porque “muitos desses candidatos moram em lugares muito distantes”.
Assim como na averiguação presencial, nenhuma pergunta é feita aos alunos, que apenas leem sua autodeclaração.
Nesta etapa, a análise é feita por uma única comissão de heteroidentificação, composta por cinco integrantes que já participaram da análise das fotos. Caso a maioria simples dos membros da comissão decida a favor da entrada do estudante, o caso é encerrado e o aluno tem a matrícula liberada.
Se a comissão decidir por negar a matrícula da vaga afirmativa ao aluno, entra a última etapa do processo: o recurso.
Recurso
O estudante que for reprovado nas etapas anteriores de avaliação pode apresentar um recurso à universidade. Neste caso, a análise do pedido é feita por uma “banca recursal”, formada por cinco professores da universidade.
“Essa banca prepara um parecer sobre o recurso, deferindo ou indeferindo o pedido, que é analisado pelo Conselho da Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento, formado por representantes de toda a Universidade. Ou seja, para a negativa definitiva, o caso do candidato é analisado por quatro grupos distintos. O Conselho é a última instância sobre todos os casos”, afirma a USP por meio de nota.
Em 2024, até este momento, 204 candidatos enviaram recursos à universidade após serem reprovados nas etapas anteriores do processo. Destes casos, 51 foram aceitos.
Os estudantes que têm os recursos indeferidos perdem a vaga, que é destinada para o próximo aluno na lista de espera.