“Efeito zumbi”: consumo de k9 dispara em SP e apreensões já superam 2022
Operações do Denarc já tiraram das ruas de São Paulo este ano 57,3 quilos de drogas K – em todo o ano passado, foram 51 quilos
atualizado
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São Paulo — A apreensão de drogas K, conhecidas por provocar nos usuários o chamado “efeito zumbi”, segue em disparada em São Paulo. Este ano, policiais do Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcótico (Denarc) tiraram das ruas 57,3 quilos da droga. O número, com dados atualizados até essa segunda-feira (21/8), já supera os 51 quilos apreendidos em todo o ano passado.
Em apenas 21 dias, agosto já é o mês com mais apreensões em 2023, com 20,4 quilos da droga, segundo o Denarc. Em seguida vem junho, com 15,9 quilos apreendidos e, na sequência, fevereiro, com 13,2 quilos.
A explosão do k9 pode ser percebida na comparação com anos anteriores. Em 2019, foram apreendidos pelo Denarc somente 22 gramas da droga. No ano seguinte, quando começou a pandemia da Covid-19, não houve registros. Já em 2021, com a flexibilização do isolamento social e o consequente aumento na circulação das pessoas nas ruas, foram apreendidos 5,6 quilos. Em 2022, as apreensões subiram para 51 quilos, um aumento de 810% em relação ao ano anterior.
Dois presos na zona leste
Nessa segunda-feira (21/8), uma operação do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic) apreendeu mais de 11 quilos de drogas — entre k9, maconha, cocaína e skank — destinadas aos usuários da Cracolândia. O material estava no fundo falso de um imóvel no conjunto habitacional Santa Conceição, na zona leste.
Dois suspeitos apontados como responsáveis pela logística foram presos na apreensão de k9 dessa segunda-feira, que não integra os dados divulgados pelo Denarc. Também foi apreendido um caderno com a contabilidade dos negócios.
Segundo o Deic, a casa onde parte da droga foi encontrada contava com um compartimento instalado no chão. A abertura era protegida pelo piso. Uma bolsa com entorpecentes também foi apreendida com um dos suspeitos presos.
“Efeito zumbi”
O Metrópoles mostrou que traficantes estão usando anestésico e anabolizante de cavalo para produzir o coquetel químico que é vendido como se fosse uma “maconha sintética”, conhecida como droga K, que é mais potente do que a maconha natural.
Com 12 ingredientes e sete passos para preparar a mistura, a listagem de três páginas foi avaliada pelo médico psiquiatra Wilson Lessa Júnior, a pedido do Metrópoles. Ele também é professor do curso de Medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e membro da Associação Médica Brasileira de Endocanabinologia.
Uma das reações características das drogas K, também conhecidas como “spice” entre usuários, é o chamado “efeito zumbi” . Por causa delas, a facção Primeiro Comando da Capital (PCC) chegou a proibir seu consumo na região da Cracolândia, no centro de São Paulo.
De acordo com o especialista, esse efeito é provocado pela quetamina de uso veterinário, um anestésico constante na receita apreendida pela polícia com os traficantes da Grande São Paulo.
Além do anestésico, ele destacou a presença do fentanil, um opioide utilizado para combater dores e, em conjunto com outras substâncias, também como anestésico. Fora do ambiente hospitalar, o uso delas pode ser fatal.
“Essas substâncias são, inclusive, usadas em centros cirúrgicos, demandando todo um protocolo de segurança, usado racionalmente dentro do ambiente hospitalar, não como droga de abuso. Temos muitos receptores opioides no tronco cerebral, se eles forem ocupados, a pessoa pode ter uma parada cardiorrespiratória. Em ambientes cirúrgicos, há uma maquinaria que fará a pessoa respirar. Em uma cirurgia, as substâncias são úteis e seguras, mas em outra situação, é morte na certa”, alerta Wilson Lessa.
O opioide que aparece na receita dos traficantes também contribui para causar alta dependência, uma constante entre os usuários das drogas K, que consomem ininterruptamente o entorpecente, vendido a preço baixo.
A mistura resultante dos ingredientes, entre os quais ainda há ácido sulfúrico, é borrifada em tabaco, ou mesmo em maconha velha, e vendido como canabinoide sintético, mesmo não tendo nenhum indício da presença deste tipo de molécula na composição.
“Acredito que fazem isso para dar uma falsa ideia de segurança para o usuário. Se falassem a verdade, de que estão vendendo um opioide com risco de morte, talvez teriam mais dificuldade para vender”, afirma o especialista.