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Dia das Mães: medo e falta de informação desafiam maternidade atípica

O Metrópoles conversou com quatro mães de pessoas autistas; mulheres relatam desafios da maternidade atípica no Dia das Mães

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1 de 1 imagem colorida mostra mãe e filho - metrópoles - Foto: Arquivo pessoal

São Paulo – A gerente de riscos Rafaela Aquino, de 27 anos, lembra perfeitamente do dia em que, pela primeira vez, suspeitou que seu filho, Benjamin, fosse autista. O menino, que tinha acabado de completar 2 anos, passava por algumas mudanças de comportamento e a mãe decidiu pesquisar os sintomas na internet.

Naquela época, Ben já não queria mais brincar como antes, tinha parado de chamar as tias e primas pelo nome, e passou a correr de um lado para o outro da casa. O vocabulário, já recheado de palavras, foi diminuindo pouco a pouco.

Ao descrever os comportamentos no Google, a mãe caiu em um vídeo sobre autismo regressivo – nome dado aos casos em que crianças autistas “perdem” habilidades já desenvolvidas. Foi quando “tudo se encaixou”, segundo ela.

“Eu lembro até hoje da cena: ele correndo na sala e eu sentada vendo vídeo no YouTube com as duas mãos na cabeça, desesperada. Minha mãe entrou na sala e brigou comigo. Ela falou: ‘para, você tá louca!’”.

A luta para confirmar o diagnóstico e apresentar a situação para a família é um dos primeiros desafios que as mães de crianças com autismo enfrentam. Na maternidade atípica, como é chamada a maternidade de pessoas com alguma deficiência, muitas mulheres têm ainda que reformular suas rotinas para cuidar dos filhos, enquanto lidam com a falta de informações sobre o tema e o medo sobre o futuro.

Neste Dia das Mães, o Metrópoles conversou com quatro mulheres que, longe de romantizar essa realidade, relataram como é viver uma maternidade atípica. Todas elas são mães de pessoas autistas, com diferentes níveis de suporte.

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"Conheço muitas mães atípicas e a única verdade absoluta entre todas é que todas precisam de ajuda", diz Rafaela
Ela diz que hoje é uma mãe mais gentil e generosa com o filho do que era antes do diagnóstico
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Rafaela descobriu que Ben era do Transtorno do Espectro Autista (TEA) quando ele tinha 2 anos

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"Conheço muitas mães atípicas e a única verdade absoluta entre todas é que todas precisam de ajuda", diz Rafaela

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Ela diz que hoje é uma mãe mais gentil e generosa com o filho do que era antes do diagnóstico

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Para Rafaela, o diagnóstico de Ben veio acompanhado de uma depressão severa. “É uma quebra de expectativa, um luto por tudo que você planejou para o teu filho”, diz ela, citando o medo com o que seria o futuro do filho.

A descoberta do autismo mudou completamente o dia-a-dia da gerente, que precisou adaptar seus horários para garantir uma rotina de terapias ao filho. Aos poucos, Rafaela diz que foi aprendendo a lidar com as descobertas e entendeu que poderia “curtir o Ben” sem as expectativas de antes.

“Eu aprendi até a gerenciar a ansiedade dos outros. Hoje ele está totalmente não verbal e todo mundo fica perguntando quando vai voltar a falar. Eu falo: ‘ele tá no caminho, tá fazendo terapias para falar, mas pode ser que ele não volte. Pode ser que ele use um método alternativo de comunicação'”, diz ela. “O Ben é uma criança extremamente feliz”.

Três anos depois do diagnóstico, ela diz que o apoio da família e do pai do filho foram importantes para que ela também não esquecesse completamente de si.

“Conheço muitas mães atípicas e a única verdade absoluta entre todas é que todas precisam de ajuda. É muito fácil depois que você começa esse processo você se abandonar completamente e viver em torno da rotina daquela criança porque demanda muito”.

Paula Carvalho, 35, entende bem o que é não ter este apoio. “Às vezes dá vontade de desmoronar, mas eu tenho que estar ali porque ele precisa de mim”, diz ela, que cuida sozinha do filho Enzo, de 7 anos, que tem autismo nível 3 – com necessidade de maior suporte – e deficiência intelectual.

Ela e o marido se separaram antes da confirmação do diagnóstico. “Durante todo o ano, se ele vê o filho duas vezes é muito”, diz Paula sobre o ex-companheiro.

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Lucineia, o filho Davi e marido
Carla e o filho Gabriel
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Paula e o filho Enzo

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Lucineia, o filho Davi e marido

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Carla e o filho Gabriel

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A moradora de Parelheiros, no extremo sul de São Paulo, teve que deixar o emprego de confeiteira para conseguir cuidar de Enzo. “Ou eu trabalhava, ou fazia o tratamento dele. E eu fui vendo que ele estava piorando”.

Agora, ela tenta conseguir o Benefício de Prestação Continuada (BPC) para manter as contas de casa em dia. O auxílio, no valor de um salário mínimo, será somado ao Bolsa Família que Paula já recebe e à pensão.

Em São Paulo, pelo menos dois projetos de lei que estão na Assembleia Legislativa (Alesp) preveem criar auxílios financeiros para mães que precisam dedicar tempo integral aos filhos com deficiência. Um deles é do deputado Enio Tatto (PT) e o outro da deputada Andrea Werner (PSB), que também é mãe de um autista.

Para Paula, os governos precisam garantir que os direitos básicos das pessoas com deficiência sejam fornecidos se quiserem ajudar as mães. Ela cita, por exemplo, que está há sete meses à espera de uma consulta com um neuropediatra no Centro Especializado em Reabilitação (CER) II de Parelheiros para trocar a medicação do filho.

Após a reportagem entrar em contato com a Secretaria Municipal de Saúde, na última sexta-feira (10/5), Enzo recebeu um encaixe no Centro Especializado em Reabilitação (CER) III Interlagos.

Em nota ao Metrópoles, a Prefeitura de São Paulo afirmou que a Associação Saúde da Família (ASF), que administra o local, está com o processo seletivo aberto para contratação do neurologista “o mais breve possível”.

A advogada Carla Bertin, mãe de um adolescente autista nível 1, diz que a falta de informações sobre os direitos dessa população é outro empecilho para que as famílias consigam oferecer melhor qualidade de vida aos filhos.

“Eu, por exemplo, só descobri que autismo era considerado deficiência [na legislação] um ano depois do diagnóstico do Gabriel”, afirma ela, lembrando que as pessoas com deficiência têm uma série de direitos garantidos por lei.

Há seis anos, Carla criou o site Autismo Legal para reunir informações sobre o tema e ajudar outros pais que não sabiam onde procurar os direitos.

A rede de apoio formada pela comunidade atípica acaba sendo fundamental, dizem as mães, para encontrar ajuda quando necessário.

Na periferia da zona leste da cidade, a Associação Azuis da Leste é um exemplo da força dessa rede. O grupo de mães surgiu há quase uma década para reivindicar uma escola para os filhos após o fechamento de uma unidade especializada onde as crianças e adolescentes estudavam.

Após a mobilização, as mães conseguiram que os filhos fossem transferidos para escolas com estrutura para recebê-los.

Uma das diretoras do projeto, Lucineia Rodrigues Ventura, 49, conta que o grupo pretende construir no futuro um espaço dedicado aos cuidados de pessoas autistas de todas as idades.

“Chega uma certa idade que eles ficam invisíveis para o poder público”, diz ela, citando que seu filho, agora com 18 anos, tem enfrentado dificuldades para fazer as terapias na rede pública de saúde.

A ideia é que o espaço funcione também como uma casa, onde o grupo poderá encontrar acolhimento a qualquer momento da vida.

Neste Dia das Mães, Lucineia faz questão de dizer que rejeita o título de “guerreira” e ou “mãe especial”. “Especial é pastel de feira”, diz.

Para ela, somente quando o Estado garantir políticas públicas e inclusão para a população autista, as mães também terão qualidade de vida.

“A gente pensa só em lutar pelos direitos dos nossos filhos e, consequentemente, os nossos também”.

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