Desembarque? Como Tarcísio tenta salvar aliança de Bolsonaro com Nunes
Tarcísio prefere Nunes a Marçal na Prefeitura e tenta se equilibrar entre seu plano e os sinais de desembarque de Bolsonaro da campanha
atualizado
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São Paulo — Desde o dia em que Jair Bolsonaro (PL) fez elogios a Pablo Marçal (PRTB) e disse que Ricardo Nunes (MDB) não era seu “candidato ideal”, há duas semanas, Tarcísio de Freitas (Republicanos) teve de adotar uma série de atitudes para manter firme a aliança entre seus aliados.
Ciente do quanto o prefeito da capital pode ajudar ou atrapalhar seu próprio governo, o governador avalia que a vitória tanto de Guilherme Boulos (PSol), que é o candidato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quanto de Marçal na eleição à Prefeitura de São Paulo pode prejudicá-lo.
Caso Boulos vença, Tarcísio ficará “prensado” entre dois governos de esquerda. Caso a vitória seja do influencer, o governador avalia que seu campo político, a direita, poderia ficar exposto a críticas, uma vez que ele não acredita que Marçal possa fazer um bom governo.
Os dois cenários atrapalhariam o futuro político de Tarcísio, que pode tentar a reeleição em 2026 ou até mesmo disputar a Presidência da República.
Idas e vindas
Pouco após a entrevista à rádio potiguar em que Bolsonaro foi afável com Marçal, Tarcísio e outros aliados atuaram para fazer com que o ex-presidente desfizesse mal entendidos e reforçasse o apoio à reeleição de Nunes. Segundo os aliados, o apoio explícito de Bolsonaro seria suficiente para agrupar o eleitorado de direita ao redor do prefeito.
Após receber vídeos antigos com críticas do influencer, Bolsonaro se convenceu, cedeu e gravou uma declaração de apoio a Nunes, que foi prontamente compartilhada por Tarcísio nas redes socias. “Nós vamos apoiar Ricardo Nunes para a reeleição”, disse o ex-presidente.
A mensagem trouxe alívio à campanha de Nunes, que ficou ainda mais satisfeita no dia 22/8, quando Bolsonaro deu uma entrevista ao Metrópoles dizendo que faltava “caráter” ao influencer. Naquele momento, Marçal e Bolsonaro trocaram farpas publicamente em postagens no Instagram.
Contudo, a maré virou contra o prefeito no mesmo dia, diante da publicação do resultado da pesquisa Datafolha que apontou crescimento expressivo do influencer nas intenções de voto. Marçal subiu sete pontos percentuais em duas semanas, indo para 21%, ficando empatado tecnicamente entre Nunes (19%) e Boulos (23%).
Hora de agir
A última semana marcou o ingresso do governador de vez na campanha, dentro de uma estratégia que já havia sido traçada nos dias anteriores. Tarcísio só não teve agendas públicas e conjuntas com o prefeito na quinta-feira (29/8).
Na segunda-feira (26/8), o governador chamou Nunes para o Palácio dos Bandeirantes e, juntos, anunciaram o término de mais uma etapa do ambicioso projeto de transferência do centro administrativo do Estado para a região da Cracolândia, uma proposta ainda embrionária que será melhor executada, segundo o discurso de ambos, com uma “parceria” entre as duas esferas de governo.
Apesar do cuidado do cerimonial do governo em evitar dar ares de campanha ao evento, e de Tarcísio dizer explicitamente que não queria falar sobre eleição, o governador fez críticas a Marçal quando provocado. “Se a gente passa o tempo todo combatendo o crime organizado, a gente não quer que alguém com conexões com o crime organizado chegue à Prefeitura. Seria um desastre”, disse.
Àquela altura, a Justiça Eleitoral havia bloqueado perfis de Marçal nas redes socais, por suspeita de abuso de poder econômico, e o influencer crescia ainda mais nas redes socais. A equipe de Tarcísio identificou que o governador passou a ser bombardeada por apoiadores do adversário nas redes sociais, entre os quais muitos bolsonaristas.
A expectativa mantida pela campanha de Nunes, de que o vídeo de apoio de Bolsonaro seria suficiente para conter a migração dos votos da direita para Marçal, não deu sinais de se concretizar.
Roubando a cena
Na quarta-feira (28/8), as equipes de Nunes e Tarcísio decidiram promover uma agenda conjunta com eleitores no Mercado Municipal, no centro. A diferença de ritmo entre os aliados chamou atenção dos auxiliares do governador, que já estavam com o sinal de alerta ligado. Tarcísio estava animado, foi tietado, posou para fotos e recebeu elogios. Nunes ficou ao lado, apagado.
A insatisfação com o desempenho do prefeito não ficou restrita aos aliados paulistas. Bolsonaristas do Congresso, antenados ao tráfego das redes, como os deputados Nikolas Ferreira (PL-MG) e Gustavo Gayer (PL-GO), articularam um armistício entre Marçal e a família Bolsonaro, sem a participação de Tarcísio, para evitar que o avanço do ex-coach entre o eleitorado de direita ocorresse à revelia do grupo do ex-presidente.
Desembarque?
Com o aliado paulistano desacreditado e Marçal com a mão estendida, Bolsonaro se movimentou novamente. Na noite de quarta-feira, divulgou um vídeo, sem citar o influencer diretamente, abrindo espaço para que ele compareça ao grande ato contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), marcado para o 7 de Setembro na Avenida Paulista.
Para deixar ainda mais clara a mudança de humores, o vereador carioca Carlos Bolsonaro (PL), filho do ex-presidente, publicou um texto dizendo que havia se entendido com o influencer.
Mantendo a aliança
Os auxiliares de Tarcísio estão incomodados com Nunes, mas o governador optou por manter-se até aqui ao lado do prefeito. No dia seguinte à mudança de rumo na relação entre Marçal e os Bolsonaro, Tarcísio telefonou para o ex-presidente para falar sobre o vídeo e tentar entender a situação antes de falar com a imprensa.
Quando atendeu os jornalistas novamente, em uma cerimônia de entrega de equipamentos para a polícia também no centro, seguindo a estratégia de reforçar políticas conjuntas, o governador disse que o vídeo de Bolsonaro sobre o ato na Paulista mirava “unir a direita no segundo turno” das eleições municipais.
Contudo, Tarcísio mudou o tom em relação “ao grande desastre” que seria a vitória de Marçal. “O grande objetivo para essa eleição é derrotar a esquerda aqui. Porque, obviamente, teria retrocesso de várias políticas públicas que estão em andamento”, disse.
Na última sexta-feira (30/8), o governador ainda fez um novo gesto em direção ao prefeito e o convidou para a cerimônia de ingresso de novos cadetes na Academia da Polícia Militar do Barro Branco, escola de formação de oficiais da corporação.
Nunes tem como vice um policial militar reformado, Coronel Mello Araújo (PL), indicação de Bolsonaro. O militar é da terceira geração de oficiais da PM. Seu pai comandou a corporação e ele, a Rota. O filho de Mello Araújo está entre os cadetes deste ano.
O governador abriu espaço para Nunes discursar, ao lado de aliados, e aplaudiu quando, do alto do palanque público, o prefeito falou em “próximo mandato” e referiu-se a Mello Araújo como “futuro vice-prefeito”.
Tarcísio gravou participação no programa eleitoral de Nunes, mas até a noite da sexta-feira não havia data para que a prometida participação de Bolsonaro na propaganda seja gravada. Isso deve ocorrer em uma agenda conjunta programada para ocorrer na Ceagesp, ainda sem data marcada.