Desconfiança de Tarcísio trava obra em reduto de presidente da Câmara
Gestão Nunes pode assumir obras de duplicação de estrada em reduto de Milton Leite que estão sob a responsabilidade do governo Tarcísio
atualizado
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São Paulo — O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) e a gestão Ricardo Nunes (MDB) negociam transferir a execução das obras de duplicação da Estrada do M’Boi Mirim, na zona sul de São Paulo, do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) para a Prefeitura da capital.
O DER é alvo de investigações no Ministério Publico de São Paulo (MPSP) por suspeita de direcionamento e superfaturamento em contratos emergenciais feitos nos governos João Doria e Rodrigo Garcia (PSDB), quando o DER foi loteado ao presidente da Câmara Municipal, Milton Leite (União).
A duplicação da Estrada do M’Boi Mirim é a menina dos olhos de Milton Leite e fica no reduto eleitoral do vereador paulistano. A obra estava sob responsabilidade do DER, mas, segundo aliados, o governo Tarcísio desconfia que esse projeto também possa apresentar problemas e prefere passá-lo para a gestão Nunes.
Leite vem sendo alvo de ataques da oposição por causa da demora para a conclusão da obra.
Em 2020, com Doria no governo, Bruno Covas na Prefeitura e indicados de Leite no comando das secretarias de Transporte dos dois governos, um acordo determinou que o DER, órgão estadual, faria a duplicação da via, uma avenida municipal, sob o argumento de que, no passado, a “estrada” era estadual.
As obras, no entanto, só tiveram início em junho do ano passado, às vésperas do período eleitoral, em uma cerimônia que reuniu o prefeito Ricardo Nunes, sucessor de Covas, morto em 2021, Rodrigo Garcia e Milton Leite, que lotou o evento com seus apoiadores políticos.
Porém, dos três trechos do projeto, que vai do Terminal Jardim Ângela até a cidade de Itapecerica da Serra, totalizando 8 quilômetros, apenas um trecho, de 1,8 km de extensão, em Itapecerica, está em andamento. As obras dentro da cidade de São Paulo ainda não começaram.
Entraves à mudança
Estado e Prefeitura confirmam as negociações para a transferência da obra. Oficialmente, o governo não cita nenhuma questão legal ou política relacionada ao projeto afirma que o repasse servirá para trazer maior “eficiência”. Já a Prefeitura diz avaliar se é possível assumir a empreitada.
O DER tem serviços que já estão em andamento, como troca de asfalto, obras de drenagem e troca de adutoras no trecho de Itapecerica. Mas diz à Prefeitura que avaliou ser mais interessante transferir ao município os serviços do trecho paulistano do projeto.
Na Prefeitura, segundo aliados do prefeito, a gestão Nunes vem sendo pressionada por auxiliares de Milton Leite para aceitar a oferta e tomar para si a execução dos trabalhos.
Há, porém, entraves legais para mudança, segundo auxiliares do prefeito Nunes: existe dúvidas, entre os técnicos da cidade, se a Prefeitura terá de fazer novas licitações.
Além disso, o governo já emitiu cerca de 500 declarações de utilidade pública (DUPs) na região, de imóveis que terão de ser desapropriados para a obra. Essas DUPs teriam de ser canceladas e a Prefeitura teria de emitir decretos próprios.
Sem contar que a estimativa é que a Prefeitura teria de assumir um custo de cerca de R$ 200 milhões, valor que não tem dotação orçamentária. O governo do Estado avalia, inclusive, repassar o valor também para destravar a transferência de responsabilidades.
Pressão sob Milton Leite
A relação entre Milton Leite e Tarcísio é praticamente inexistente. Embora o presidente da Câmara paulistana tenha declarado apoio a Tarcísio no segundo turno das eleições, seu partido não conseguiu nenhum cargo relevante no primeiro escalão do governo – além de manter Transportes, Leite queria que o União ficasse também com a Habitação.
Campeão de votos na zona sul, o presidente da Câmara depositou parte do seu capital político em vender a obra como uma das conquistas que seu trabalho político traz a região.
Em junho do ano passado, no ato para celebrar o início das obras, apoiadores de Leite lotaram o evento em que o prefeito Nunes derrubou um muro, ato que simbolizaria o começo dos trabalhos.
Agora, mais de um ano depois da derrubada do muro, a população da região da zona sul da cidade segue enfrentando um trânsito caótico sem notar nenhum trabalho de máquinas ao longo da estrada.
“Trânsito a gente sabe que tem em toda a cidade, mas aqui está acima do aceitável”, afirma José Jailson da Silva, de 44 anos, que coordena o S.O.S. Transportes M’Boi Mirim, movimento que luta há mais de uma década pela mobilidade na região. “Um percurso de quase 5 km, da Vila Calu até o Terminal Jardim Ângela, chega a levar 1 hora. É um percurso que você faria em 15 minutos [sem o trânsito]”, afirma.
Jailson organizou um protesto diante da demora na conclusão das obras no mês passado. Deputados de oposição têm compartilhado protestos nas redes sociais como forma de aumentar a pressão sobre Milton Leite.
O Metrópoles procurou Milton Leite para comentar o caso. O espaço segue aberto a manifestações.