De esperança a fiasco: Datena arrasta PSDB para o pior resultado em SP
Apresentador José Luiz Datena terminou eleição no 5º lugar, com apenas 1,84% dos votos, e PSDB não conseguiu eleger nenhum vereador em SP
atualizado
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São Paulo — Teve cadeirada, choro, dia no hospital, troca de ofensas, bom e mau humor, vários flertes com a desistência e uma campanha digna de um anticandidato que despencou de 19% em uma pesquisa realizada no fim de julho para 1,84% dos votos digitados nas urnas nesse domingo (6/10) na eleição à Prefeitura de São Paulo.
O apresentador José Luiz Datena foi lançado candidato a prefeito de última hora pelo PSDB como uma esperança de reconstrução do partido após perder os comandos da Prefeitura paulistana e do governo do estado entre 2021 e 2022, mas acabou em 5º lugar, a pior colocação de um tucano em disputa para prefeito da capital paulista.
Antes mesmo do término da apuração, Datena deu uma entrevista coletiva na qual disse que seu desempenho foi abaixo do esperado pelo tamanho de seu partido. “Péssimo. Horrível. Muito abaixo da crítica”, afirmou. A performance do apresentador arrastou o PSDB para seu pior desempenho eleitoral na capital — a sigla não conseguiu eleger nenhum vereador para a Câmara Municipal, ante oito parlamentares eleitos na eleição de 2020.
A própria escolha de Datena já era um prenúncio de que o PSDB havia embarcado em uma viagem imprevisível e com muitos riscos envolvidos em sua luta desesperada para cair no gosto popular. O apresentador de TV foi bancado por tucanos históricos, como seu vice na chapa, o ex-senador José Aníbal, e por lideranças nacionais do partido, como o deputado Aécio Neves (MG), e o presidente da legenda, Marconi Perillo.
Assim que decidiu não apoiar a reeleição de Ricardo Nunes (MDB), ainda em abril, o partido viu uma revoada de vereadores para a base do atual prefeito, zerando a bancada tucana na Câmara Municipal. A sangria não parou, mesmo em plena campanha. Na penúltima semana, cerca de 50 tucanos foram expulsos do partido por terem se aproximado do emedebista. Até o filho de Bruno Covas, Tomás, está na berlinda e, segundo Aníbal, deverá deixar o partido.
O racha chegou às urnas. Com a votação obtida neste domingo, Datena superou negativamente Fabio Feldmann, quarto colocado na eleição de e1992, com 5,83%, pior desempenho do PSDB em uma disputa pela Prefeitura de São Paulo até então.
Entre quem se manteve próximo a Datena, a percepção é a de que o apresentador não tinha a dimensão do que é uma eleição na maior cidade do país, muito pelo desprezo que eventualmente nutria pela classe política. Em um primeiro momento, segundo interlocutores, teria sonhado com uma verdadeira aclamação ao seu nome, o que estaria muito longe de acontecer, como confirmaram as urnas neste domingo.
Desilusão
Durante uma caminhada na 25 de Março, minutos depois de ter chorado ao vivo durante sabatina Folha/UOL, praticamente jogando a toalha em meio à disputa, Datena foi saudado pelas pessoas, numa prova clara de sua popularidade — desde o início, foi apontado como o candidato mais conhecido na disputa deste ano. Quando já se preparava para ir embora, chegou a perguntar para a reportagem do Metrópoles como todo aquele carinho demonstrado pela população não se convertia em voto.
O fato é que Datena pareceu, até o último momento, não compreender claramente como a popularidade como apresentador de programa policial em uma emissora aberta não se converteu automaticamente em preferência para ocupar a cadeira de prefeito da capital paulista, com todas as suas complexidades.
Datena ruiu diante das adversidades. A principal delas atende pelo nome de Pablo Marçal (PRTB). O apresentador não disfarçou sua frustração durante a campanha diante do crescimento do influenciador, como uma candidatura alternativa aos candidatos Guilherme Boulos (PSol) e Ricardo Nunes (MDB), exatamente o espaço que Datena queria ocupar.
A escalada de Marçal nas pesquisas coincidiu com o derretimento do apresentador, que chegou ao primeiro turno atrás de Tabata Amaral (PSB), com quem havia negociado o posto de vice no início do ano, antes de decidir lançar candidatura própria pelo PSDB.
Cadeirada
Datena não conseguiu — ou não quis, sob risco de se enrolar na Justiça — tirar proveito político da agressão no debate da TV Cultura, quando deu uma cadeirada em Pablo Marçal, seu antagonista. Não se falava de outro assunto nas ruas naquele início de semana, mas mesmo assim Datena faltou às duas agendas previstas para Santana e Perus, ambas na zona norte.
Ele só deu as caras no Capão Redondo, na zona sul, no meio da semana, mesmo assim a contragosto, quando foi saudado por parte do povão, empolgado com a reação do apresentador às provocações do influenciador, que havia chamado o tucano de estuprador no debate.
Diante da agressão, o próprio PSDB nacional “passou pano” para a cadeirada, reprovando o ato, mas dizendo que seu escolhido expôs o “terrorismo psíquico” praticado por Marçal.
Foi justamente o candidato do PRTB quem roubou o perfil de “outsider” que Datena gostaria de ostentar. Sem o diferencial, o tucano se portou como anticandidato, mas não emplacou. Também se embananou logo no primeiro debate, na TV Bandeirantes, emissora onde trabalha há mais de 20 anos, algo que reconheceu. Acostumado a falar por três horas ao vivo, todos os dias, sem ser interrompido, não soube controlar o tempo nas perguntas e respostas, problema que se repetiu nas entrevistas. Reagiu mal às tentativas de ser questionado, esquecendo-se que estava sob escrutínio público — não era mais pedra, mas vidraça.
Em meio a tudo isso, Datena disse que se dedicou à campanha no limite de suas forças. Também conviveu com problemas de saúde que o assombram há décadas, desde que retirou um tumor no pâncreas, tanto que chegou a passar uma terça-feira no Hospital Sírio-Libanês. Na ocasião, foi informado que precisaria colocar um sétimo stent no coração — o que prometeu fazer após a eleição.
Conforme as pesquisas foram confirmando sua derrocada, o apresentador passou a demonstrar ainda mais desânimo, admitindo, inclusive, que dificilmente seria eleito — e ressaltando que queria mesmo era ser senador. Nessa última semana, chegou a cancelar agenda na Avenida Paulista, sem motivo aparente, a 20 minutos do início do compromisso.
O apresentador, que havia desistido outras quatro vezes de concorrer a um cargo eletivo, declarou que essa seria sua única tentativa de ser eleito, porque “a política é cansativa”. Se cumprir a promessa, esse debut depois de inúmeros ensaios será fato isolado, mas não menos relevante em sua trajetória.
Certa vez, questionado sobre o que levaria das caminhadas de campanha para a vida, Datena debochou. Citou objetos inanimados como um poste, um orelhão. Na última sexta (4/10), ele ponderou. “A rua, para mim, foi o maior ensinamento político. Pretendo, sim, sair para caminhar, principalmente porque em todos os lugares que eu fui bem recebido. Se houve um ou dois xingamentos, foi muito. Não aconteceu isso. Eu fui muito bem recebido em todos os bairros de São Paulo”, disse.
Neste domingo, logo após votar em um colégio no Morumbi, na zona oeste de São Paulo, Datena disse que não pretende apoiar outro candidato no segundo turno e que deve tirar 20 dias de férias antes de voltar à TV. Questionado se teve algum arrependimento sobre a eleição, foi taxativo. “Levar a campanha até o fim”, disse. Por quê? “Porque sim”, completou.