“Danoninho”: paciente de clínica morreu por overdose de remédios
Paciente foi amarrado em cadeira, espancado e humilhado por monitor que está preso por homicídio; donos de clínica também foram indiciados
atualizado
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São Paulo — O dependente químico Jarmo Celestino de Santana, de 55 anos, morreu três dias após dar entrada em uma clínica de reabilitação, em Cotia, na Grande São Paulo, onde foi torturado e forçado a tomar um coquetel de remédios, chamado de “danoninho”, que lhe provocou uma overdose.
O monitor terapêutico Matheus de Camargo Pinto, 24, foi preso em flagrante após a polícia ter acesso a um vídeo (assista abaixo) feito pelo próprio indiciado, no qual a vítima aparece amarrada em uma cadeira. Matheus também gravou um áudio, compartilhado em redes sociais, no qual afirma ter espancado Jarmo até a mão doer (ouça abaixo).
Um laudo pericial da Polícia Científica, obtido pelo Metrópoles, afirma que Jarmo morreu em decorrência de “trauma abdominal”, resultante das agressões, aliado à intoxicação provocada pela ingestão de 11 tipos de medicamentos psiquiátricos.
O resultado oficial da morte, concluído em julho, resultou também no indiciamento, por homicídio, de Terezinha de Cássia de Souza Lopes da Conceição, 50 anos, e Cleber Fabiano da Silva, 48, donos da clínica. Ambos respondem ao caso em liberdade.
“Danoninho”
Em depoimento à Polícia Civil, o monitor Matheus de Camargo Pinto, que segue preso, admitiu ter agredido a vítima, após uma conversa dele, por WhatsApp, ser obtida pelas autoridades.
Por meio de um áudio ele afirmou que “cobriu no cacete” a vítima. Matheus enviou para a interlocutora uma foto, de uma vasilha cheia de medicamentos, com a legenda: “Pega esse Danoninho”.
À polícia, ele explicou que Danoninho é um termo usado pelos funcionários da clínica para nomear um coquetel de medicamentos que “acalmariam” internos com “comportamento violento”.
“Essa combinação medicamentosa foi ministrada à vítima Jarmo, que a ingeriu”, diz trecho de relatório policial.
O coquetel que contribuiu para matar o paciente foi preparado, ainda de acordo com registros oficiais, por Cleber Fabiano da Silva.
A defesa dele e de Cássia de Souza Lopes, também responsável pela clínica, não foi localizada. O espaço segue aberto para manifestação.
Vídeo
Outras clínicas, mesmas pessoas
Em 2019, Terezinha e Cleber administravam uma clínica de reabilitação clandestina em Cotia, mesma cidade em que Jarmo foi torturado e morto.
Segundo denúncia do Ministério Público de São Paulo (MPSP), obtida pelo Metrópoles, a proprietária e o enfermeiro “expunham a risco” de saúde e de vida quatro adolescentes, com idades entre 16 e 17 anos, que estavam internados no local.
Novo local
Em 25 de novembro de 2011, a Vigilância Sanitária de Mairinque, interior paulista, identificou uma clínica clandestina, na qual eram mantidos 25 pacientes. O proprietário do local, segundo registros policiais obtidos pelo Metrópoles, era o enfermeiro Cleber Fabiano da Silva.
Durante vistoria, a vigilância observou que a clínica se denominava, no papel, como “Portal do Amanhecer”, cuja licença estava vencida há mais de três meses. No local, porém, constataram que a unidade se chamava Gênesis. O proprietário que se apresentou aos agentes foi o enfermeiro Cleber.
Ouça áudio
Dopado e internado
Um dos pacientes abordados na unidade de Mairinque afirmou, segundo a Polícia Civil, que foi dopado em casa, com o uso de medicamento e “levado contra a vontade” até a clínica clandestina.
Um idoso de 73 anos também afirmou na ocasião não ser dependente químico. Ele alegou que foi internado no local, a pedido da família, que estaria fazendo “uso indevido” da aposentadoria dele.
“[O idoso] não é usuário nem alcoólatra […] não possuía documentos e nem contrato firmado com a clínica”, diz trecho de registros policiais.
Após a interdição por irregularidades das duas clínicas anteriores, Cleber começou a trabalhar na Comunidade Terapêutica Efatá, em Cotia, novamente com Terezinha. Foi nessa unidade que Jarmo morreu.
O local mantinha, até o homicídio, pouco mais de 20 pacientes, entre os quais Matheus. Ele trabalhava sem qualificação profissional na clínica, monitorando outros internos, para custear a própria internação.