Cracolândia: contagem oficial ignora ilhas de consumo e fluxo noturno
Programa Dronepol só monitora grupo com mais de 30 pessoas e ignora fluxo de usuários durante período noturno na Cracolândia, em São Paulo
atualizado
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São Paulo — A contagem oficial do número de usuários de drogas na Cracolândia, região central de São Paulo, ignora a aglomeração de dependentes químicos em pequenos grupos e desconsidera o fluxo noturno, que está, atualmente, nas proximidades da Rua dos Gusmões com a Avenida Rio Branco. O sistema é baseado no Programa Dronepol, da Prefeitura de São Paulo.
Uma das provas de que dados do Dronepol são insuficientes para mensurar a quantidade de usuários é, por exemplo, o registro mais recente, da semana entre os dias 14 e 20 de agosto.
Como os cálculos são feitos apenas nos períodos da manhã e da tarde, o levantamento da Secretaria Municipal de Segurança Urbana detectou fluxo somente na Rua dos Protestantes, ignorando, por exemplo, a concentração expressiva de usuários, durante a noite, na Rua dos Gusmões, na quadra entre a Santa Ifigênia e a Avenida Rio Branco.
Fora isso, o Dronepol considera “cena de uso” de drogas a ceu aberto apenas aglomerações com mais de 30 usuários. Ou seja, mesmo que 20 dependentes químicos estejam reunidos fumando crack em uma esquina da região central, inclusive bloqueando o trânsito, eles não entram na contagem oficial e são desconsiderados das estatísticas divulgadas pelas autoridades.
Além dessas questões, a vegetação também pode impedir uma contagem precisa do número de pessoas. Na Rua dos Protestantes, por exemplo, há uma grande copa de árvore nas proximidades da esquina com a Rua dos Gusmões, o que pode impedir um retrato mais fiel da aglomeração, ocultando parte dos usuários.
De forma geral, quanto mais dispersos pela região central, menos “contáveis” se tornam os usuários de crack, por estarem distribuídos em grupos inferiores a 30 pessoas.
Método
O Dronepol faz a estimativa por meio do método Jacobs, que trabalha com a densidade de aglomerações visíveis de pessoas. Por exemplo: calcula-se que cada pessoa ocupe 0,2 metro quadrado em multidões muito densas e até 1 metro quadrado em aglomerações leves.
Segundo a própria Prefeitura, problemas técnicos, como condições meteorológicas e acúmulo de resíduos ou vegetação podem prejudicar as estimativas.
O que dizem as autoridades
Questionada, a Prefeitura não explicou por quais motivos o Dronepol não faz contagem durante a noite. Também não disse quem estipulou o critério de que só são contadas aglomerações com mais de 30 pessoas.
A administração municipal, sob a gestão de Ricardo Nunes (MDB), disse que a formação de cenas de uso aberto são um fenômeno de ordem social multifacetada e que se organizam de forma orgânica e com influência do tráfico de drogas.
“A atuação da municipalidade nestes espaços é a de prestar atendimentos em saúde e em assistência social para os indivíduos que fazem o uso abusivo de substâncias psicoativas e que estão em situação de vulnerabilidade social, monitoramento e combate ao tráfico pelas forças de segurança pública, em parceria com o Governo do Estado de São Paulo, zeladoria e revitalização urbana”, afirma, em nota.
A Secretaria Municipal de Segurança Urbana, por meio do Programa Dronepol, diz que envia diariamente um relatório de imagens captadas por Drone, garantindo a segurança de todos nas cenas de uso aberto. Os dados são compilados pela Secretaria Executiva de Projetos Estratégicos.
Já a Secretaria da Segurança Pública, sob a gestão do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), atribui a responsabilidade pelos dados à Prefeitura.