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Conheça a arquiteta que faz história reformando casas em favela de SP

Do Jardim Colombo, na zona sul, Ester Carro, de 29 anos, virou referência na chamada “arquitetura social” com transformação em comunidade

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ester carro arquiteta jardim colombo (1)
1 de 1 ester carro arquiteta jardim colombo (1) - Foto: Jessica Bernardo / Metrópoles

São Paulo – Quando era adolescente, Ester Carro costumava percorrer a pé o trajeto entre sua casa, no Jardim Colombo, favela na zona sul da cidade, e a escola onde fazia o ensino médio, no bairro vizinho. Naquela época, a menina sonhava em ser professora para “mudar a vida das pessoas”.

Um dia, na caminhada de volta para casa, uma amiga deu uma sugestão: “Por que você não faz arquitetura, Ester?”. A adolescente refutou a ideia de cara. Não conhecia outras pessoas como ela, negra e favelada, que tivessem feito faculdade de arquitetura.

A opinião mudou depois que ela visitou Paraisópolis junto com dois arquitetos para um projeto da escola.

“Eu lembro até hoje. O arquiteto falou: ‘olha o que a nossa profissão é capaz de fazer’ e apontou para um espaço que tinha acabado de ser revitalizado, numa área bem degradada. Eu pensei: ‘É isso! É isso que eu quero fazer’”.

Hoje, com 29 anos, Ester virou referência nacional e internacional do que tem sido classificado na área como “arquitetura social”, que tem como foco projetos para a população de baixa renda.

Com obras surpreendentes nas casas e espaços públicos de sua comunidade, a arquiteta entrou para a lista de pessoas mais influentes do país com menos de 30 anos e foi parar até em um evento da Organização das Nações Unidas (ONU) para falar sobre seu trabalho.

“A arquitetura social está me levando para o mundo”, diz a jovem.

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Arquiteta reaproveita materiais e articula doações para conseguir reformar os espaços
Arquiteta Ester Carro diz que terminará 2023 com 330 ambientes reformados
Ester Carro nasceu e cresceu no Jardim Colombo
Arquiteta Ester Carro em escadaria do Jardim Colombo decorada com a ajuda de voluntários
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Ester Carro faz reformas na casa dos moradores do Jd. Colombo

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Arquiteta reaproveita materiais e articula doações para conseguir reformar os espaços

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Arquiteta Ester Carro diz que terminará 2023 com 330 ambientes reformados

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Ester Carro nasceu e cresceu no Jardim Colombo

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Arquiteta Ester Carro em escadaria do Jardim Colombo decorada com a ajuda de voluntários

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Rede de solidariedade

Basta passar alguns minutos no Jardim Colombo para encontrar alguém que conheça o trabalho da ‘arquiteta da favela’, como Ester gosta se descrever. “Ela pintou a fachada da minha casa”, contou uma moradora ao passar pela reportagem do Metrópoles.

Mais tarde, ao encontrar Ester sentada em um escadão recém-decorado com azulejos, outra mulher parou para conversar. “Eu vi isso aqui e já pensei: ‘Isso é coisa da Ester’. Tá ficando lindo!”, comentou a moradora.

Era mesmo “coisa” da arquiteta. Naquele mesmo dia, voluntários de uma empresa tinham visitado a comunidade para participar de uma intervenção na escadaria em uma ação coordenada pelo Instituto Fazendinhando, projeto social liderado por Ester.

Filha do presidente da União de Moradores do Jardim Colombo, a jovem aprendeu cedo a importância de articular uma rede de solidariedade para promover transformações no bairro.

A própria formação de Ester foi fruto dessa solidariedade. “Na graduação, eu não tive bolsa. Foram ‘padrinhos’ e ‘madrinhas’ que pagavam as mensalidades para mim”, conta ela, explicando que conhecidos da família ajudavam com os boletos.

No meio da graduação, Ester descobriu que estava grávida. Mesmo assim, só trancou o curso por seis meses e, no fim, levou o filho à formatura para pegar o diploma junto com ela. “De todos os sonhos que eu já conquistei na vida, concluir a universidade sempre foi o maior”.

Ester tinha um objetivo: queria transformar a comunidade em que morava em um lugar com moradias dignas e espaços de lazer, como os tantos que viu na faculdade.

Antes mesmo de terminar o curso, ela decidiu colocar os conhecimentos em prática. Junto com vizinhos e voluntários de outros bairros, a então estudante de arquitetura começou um projeto que revitalizou uma área onde ficava um lixão do bairro.

O espaço foi limpo, ganhou uma espécie de “arquibancada” com pneus coloridos e recebeu um playground, onde as crianças costumam brincar aos finais de semana agora. O projeto, inspirado em uma iniciativa similar no Rio de Janeiro, foi a primeira grande intervenção na comunidade encabeçada por Ester e marcou a fundação do Fazendinhando, instituto voltado para a transformação do bairro.

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Antigo lixão do Jardim Colombo foi transformado em espaço de convivência com "arquibancada" de pneus e playground. Lugar é conhecido como Fazendinha
Transformação da Fazendinha foi o primeiro grande projeto de Ester Carro no Jardim Colombo
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Vista da favela do Jardim Colombo a partir da Fazendinha

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Antigo lixão do Jardim Colombo foi transformado em espaço de convivência com "arquibancada" de pneus e playground. Lugar é conhecido como Fazendinha

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Transformação da Fazendinha foi o primeiro grande projeto de Ester Carro no Jardim Colombo

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Em 2023, outra iniciativa liderada pela arquiteta viralizou nas redes sociais e se tornou um de seus projetos mais famosos: a obra na casa de 4m² de Francisco da Silva, 59, o Tiquinho. A reforma ampliou o espaço e incluiu banheiro e cozinha no imóvel. Relembre:

 

No total, a arquiteta já calcula mais de 300 reformas, entre pequenas e grandes obras, no Jardim Colombo, e também em outras comunidades. “Até o final do ano, nós vamos ter mais de 330 ambientes reformados”, projeta.

Nas obras que a arquiteta toca, cada item doado ou trabalho voluntário é precioso, já que os moradores não têm condições de pagar pelas reformas.

“Hoje, 35% dos materiais que são utilizados nas reformas vêm de doações. É muito bom, porque ao invés do material ficar parado na caçamba, a gente consegue fazer o reaproveitamento”, conta. Os itens reaproveitados incluem de revestimentos a vasos sanitários, pias e gabinetes.

Luta por moradias dignas

A arquiteta diz que os casos que chegam até ela, na maioria das vezes, são situações extremamente precárias, de casas sem ventilação, banheiro ou entrada de luz. Até na rua os antigos vizinhos já pararam Ester para pedir ajuda.

“O primeiro sentimento é de indignação. Só que quando eu entro nessas casas, eu consigo visualizar a casa reformada. Dá pra fazer, tem solução, tem caminhos”.

Ester passou a pesquisar soluções sobre o tema que eram estudadas em todo o mundo e virou especialista em urbanismo social. Agora doutoranda em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie e professora na área, ela defende que o poder público volte seu olhar para as favelas e invista em recursos em organizações que atuam nos territórios.

“A gente sabe que tem recurso no Brasil, mas esse recurso não chega na ponta, nas organizações sociais. A gente precisa fazer com ele chegue. Se o trabalho é sério, se há governança, se há transparência é preciso que chegue”, afirma.

A arquiteta diz que os governos precisam “sair um pouco da teoria, do ar condicionado, para estar na favela” e critica a falta de mobilização de quem tem a caneta na mão.

“Tá faltando olhar para as periferias neste aspecto de ação, de ver a transformação”, diz Ester. “Eu não quero vestir a camisa do partido X ou partido Y para as coisas acontecerem. Eu quero que quem está no poder público veja [o que é preciso fazer]”.

Os projetos liderados por Ester deram projeção à arquiteta, que passou a ser convidada para palestras e eventos nacionais e internacionais para relatar as experiências do Jardim Colombo. O convite mais recente veio da Organização das Nações Unidas (ONU), que chamou Ester para palestrar no Fórum Urbano Mundial, em Cairo, no Egito. A palestra aconteceu no início deste mês.

“Eu fico feliz de estar quebrando alguns muros, alguns estereótipos, e de poder, de alguma forma, representar as favelas numa conferência tão importante. Mas não só representar: criar conexões, trazer novas parcerias para dentro das comunidades, dar visibilidade a diversos temas que só a gente que está aqui na base, de fato, sabe como lidar”.

“Quando a gente apoia mulheres negras, periféricas, não é só a vida dela que muda. Ela mobiliza toda a sociedade”, finalizou.

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