Como funciona lobby de associação que fatura com escola cívico-militar
Presidente da Abemil participa de encontros com políticos e vai a audiências públicas para defender lei que cria escolas cívico-militares
atualizado
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São Paulo — Em cinco anos de existência, a Associação Brasileira de Educação Cívico-Militar (Abemil) já soma R$ 11 milhões em contratos assinados sem licitação com pelo menos 10 prefeituras do país.
A entidade oferece serviços para viabilizar o chamado modelo cívico-militar nas redes municipais de ensino, com a contratação de ex-militares para trabalhar nas escolas.
A parceria com as prefeituras, no entanto, não surge de forma espontânea. A Abemil criou um passo a passo para que a associação entre na lista de pagamentos dos municípios, com forte lobby do criador e presidente da entidade, o suplente de deputado federal Capitão Davi Lima Sousa (PL). A receita é divulgada no site da própria associação.
A página descreve que tudo começa com uma “reunião com o gestor” para convencê-lo a encaminhar um projeto de lei que instituirá o modelo militarizado de ensino no município. Na sequência, diz o site, deve acontecer uma audiência pública com a comunidade para que a ideia seja aprovada. O próprio Capitão Davi participa pessoalmente de vários encontros com políticos e audiências públicas para explicar o projeto.
Depois da apresentação do modelo para a comunidade, a Câmara de Vereadores recebe a ata do encontro, já com as indicações de quais escolas serão selecionadas e, então, vota o projeto.
É no quinto passo que a associação sai ganhando, como mostra o site: “É celebrado o termo de convênio entre o município e a Abemil”. O que a página não diz, no entanto, é que isso envolve pagamentos milionários à associação.
Só a Prefeitura de Lins, no interior de São Paulo, já assinou convênios com a Abemil que somam R$ 1,9 milhão. Em Minas Gerais, a entidade do Capitão Davi está presente em nove escolas de cinco cidades, e recebeu dessas prefeituras R$ 5,2 milhões.
O modelo vendido pela Abemil para as prefeituras difere, por exemplo, do formato aprovado pela Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e que prevê que a Secretaria da Educação faça o processo seletivo dos militares que vão atuar nas escolas.
Nos projetos de lei municipais criados com o lobby da Abemil, a própria associação é autorizada a escolher quem serão os funcionários que vão trabalhar nas unidades de ensino.
Os editais de processos seletivos disponibilizados no site da instituição mostram que não há exigência de experiência com educação para militares que ocuparão as vagas de subcomandante nas escolas, segunda mais importante.
Já as vagas de monitores podem ser ocupadas, inclusive, por pessoas sem histórico militar. Neste caso, o processo cobra o diploma de ensino superior, com preferência dada a cursos na área da educação “e afins”.
“Independente e apartidária”
Procurada pelo Metrópoles, a Abemil afirma ser “independente e apartidária”, e que foi constituída com o “propósito inequívoco de implementar e manter o modelo de educação cívico-militar”. A entidade diz prestar serviços em 19 escolas em todo o país e contar com “um corpo de funcionários civis e militares da reserva, criteriosamente selecionados”.
“Reiteramos que as ações da Abemil estão voltadas para o fortalecimento da educação cívico-militar no país, promovendo a disciplina, a responsabilidade, o patriotismo e o desenvolvimento cívico entre os jovens brasileiros”, afirma. Segundo a entidade, a implantação das escolas cívico-militares passa por “processos rigorosos”, como a realização de audiências públicas, aprovação de leis municipais e consulta a pais, alunos e professores.
“A adesão ao modelo é voluntária, respeitando o princípio da legalidade e a autonomia federativa (estadual e municipal). A Abemil não interfere na criação ou alteração de leis”, diz.
Em seus contratos de consultoria, a Abemil diz fazer “visitas técnicas periódicas com o objetivo de capacitar o corpo militar e apoiar a equipe didático-pedagógica-administrativa das escolas” para “assegurar um ambiente escolar seguro e propício ao aprendizado com melhoria na qualidade do ensino”.
A associação ainda afirma que sua atuação tem rendido resultados positivos deste modelo de gestão e cita como exemplos a Escola Cívico-Militar Liceu Codoense Nagib Buzar, em Codó, no Maranhão, que alcançou a nota 5,3 no Ideb, acima das médias nacional e estadual, e a Escola Cívico-Militar Maria Cristina Sutti Lopes Moreno, em Lins, que obteve a nota 6,42 no Ideb.
A entidade diz também que o objetivo das escolas cívico-militares “não é a militarização da educação”, mas sim “a cooperação para uma educação de excelência”, e que 19 governadores, incluindo Tarcísio, “estão estadualizando as escolas cívico militares para assegurar a continuidade deste modelo”. “É importante ressaltar que o projeto de Educação Cívico-Militar não interfere em nenhum um ponto das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica instituídas pelo MEC”, conclui.