Entenda como o corpo reage a quedas abruptas como do avião da VoePass
Politraumatismo seria resultado da força do impacto do avião com solo. Passageiros não teriam morrido ao longo da queda, dizem especialistas
atualizado
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São Paulo – A Polícia Técnico-Científica de São Paulo afirmou que as 62 vítimas da queda do avião da VoePass em Vinhedo, no interior do estado, morreram de politraumatismo quando a aeronave despencou de uma altura de cerca de 4 mil metros e atingiu o solo. O politrauma é uma definição de traumas múltiplos, explicou Jose Gustavo Parreira, cirurgião geral com área de atuação em cirurgia do trauma, ao Metrópoles.
“Quedas, acidentes de tráfego, agressão física, até mesmo projétil de arma de fogo, entram nesse grande grupo de trauma como nós chamamos”, explicou. As lesões traumáticas são causadas pela troca de energia entre o meio ambiente e o corpo.
Por dia, 450 pessoas morrem por politrauma no Brasil, informou Parreira a partir de dados do DataSUS. As causas mais frequentes são acidente de trânsito, homicídios e quedas. As lesões mais comuns são no crânio e sangramento interno.
Mortes na colisão com o solo
Claudio Furukawa, responsável pelo Laboratório de Demonstrações do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), explicou ao Metrópoles o que acontece com o corpo humano em quedas abruptas de avião, como ocorreu com o voo da VoePass.
Segundo cálculos elaborados pelo físico, é pouco provável que os passageiros tenham morrido durante a trajetória de queda. A aceleração de cerca de 3.750 metros em 1 minuto não seria suficiente para causar nenhum dano sério aos passageiros.
Portanto, as grandes forças de impacto, num curto intervalo de tempo, provavelmente ocorreram durante a colisão com o solo, causando a morte dos ocupantes do avião, antes de sofrerem queimaduras devido ao incêndio.
“Quanto a não sentir dor, fica difícil de responder, apesar de o impacto ocorrer num intervalo de tempo muito curto. Porém, em situações de traumatismo craniano severo ocasionado pelo impacto, há rápida perda de consciência e acho que praticamente as pessoas não sentiram muita dor”, disse.
Se, em uma situação hipotética, o avião descesse de maior altura e em maior velocidade, as pessoas dentro da aeronave poderiam ter a sensação total de perda de peso, como se estivessem flutuando no ar. Não foi o caso, considerando que o porta-voz do Corpo de Bombeiros, Maycom Cristo, afirmou no dia da queda que os corpos todos estavam sentados nos seus assentos. “Nenhum corpo foi ejetado. O avião caiu no chão como se estivesse chapado”, disse Cristo.
Os dois especialistas ouvidos pelo Metrópoles – o médico Jose Gustavo Parreira e o físico Claudio Furukawa – reforçam que, neste momento, as projeções são especulativas.
Mas ambos acreditam que os passageiros morreram quando o avião colidiu com o solo. Eles mencionaram que, numa queda sem movimentos bruscos, a sensação é de “frio na barriga”. Como numa montanha-russa.
Acidentes diferentes
Em 2006, o Voo Gol 1907, utilizando um Boeing 737-8EH, partiu do Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, em Manaus, com destino ao Aeroporto Internacional do Galeão, no Rio de Janeiro. Enquanto sobrevoava o estado de Mato Grosso, colidiu no ar com um Embraer Legacy 600.
Todos os 154 passageiros e tripulantes a bordo do Boeing 737 morreram após a aeronave se despedaçar no ar e cair em uma área de mata fechada, enquanto o Legacy pousou em segurança. Nesse caso, os especialistas concordaram que nenhum ocupante do Boeing 737 estava com vida no momento em que a aeronave se chocou com o solo no meio da floresta. As pessoas saíram de um ambiente a 21ºC para outro a -52ºC e morreram congeladas, sem ar, e tiveram um colapso cardiorrespiratório.
No caso do acidente com o avião da VoaPass, Parreira, que é presidente da Sociedade Brasileira de Atendimento Integrado ao Traumatizado, pondera que, na medicina, não existe resposta que afirme se vítimas estavam desacordadas antes da queda.
“A gente não sabe o que aconteceu. Pode acontecer isso? Claro que pode acontecer isso. O que aconteceu lá dentro do avião, como cada um sentiu, nunca ninguém vai saber. Então essas afirmações de que eles sentiram ou não sentiram são completamente especulativas”, disse.
Ambos concordam que as informações da investigação a partir das caixas-pretas é que vão dizer em que força de gravitação o avião caiu, a velocidade, a força de impacto, as causas. “Eu acho que o mais importante é responder como esses acidentes poderiam ser prevenidos”, concluiu o médico.
Causas do acidente
Especialistas consultados, que preferiram não se identificar, afirmaram que é muito difícil cravar, neste momento, o que aconteceu.
De acordo com informações da plataforma Flightradar, que monitora voos pelo mundo, a aeronave da VoePass atingiu os 5 mil metros de altura às 12h23, seguindo na mesma altitude até 13h21. O avião fez uma curva brusca e às 13h22, a altitude já havia caído para 1.250 metros, uma queda de quase 4 mil metros em cerca de um minuto.
O Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) concluiu, na última segunda-feira (12/8), a perícia inicial no local onde o avião da VoePass caiu em Vinhedo.
O órgão, que pertence à Força Aérea Brasileira (FAB), passou o fim de semana realizando a chamada ação inicial. Nesta etapa são recolhidas as primeiras informações que podem explicar a causa da queda. No domingo (11/8), os dados das caixas-pretas do avião foram extraídos com sucesso.
Com a conclusão dessa primeira fase, a FAB explicou, em nota, que as investigações seguem para a fase de análise dos dados recolhidos, “com o levantamento de outras informações necessárias, a fim de identificar os possíveis fatores contribuintes”.
Até agora, foram levantadas três hipóteses para explicar o motivo da queda. A primeira delas é que o acidente possa ter sido causado por formação de gelo nas asas. Tal hipótese é sustentada devido aos boletins meteorológicos do dia e ao histórico de um acidente similar nos Estados Unidos há 30 anos.
Outra possibilidade é que o avião estava com resquícios de danos causados por um “tailstrike” – termo técnico usado na aviação quando o avião bate com a cauda na pista – sofrido em março deste ano.
Há ainda uma terceira possibilidade que problemas no ar-condicionado na aeronave, apontados por pessoas que já pilotaram o avião, tenham prejudicado a sua refrigeração.
O relatório preliminar do acidente aéreo deverá ser divulgado em 30 dias. Segundo o Cenipa, a conclusão da investigação “terá o menor prazo possível, dependendo sempre da complexidade da ocorrência”.