Carnaval: 1ª noite de desfile tem ato antirracista e Gaviões “da paz”
Confira os destaques das escolas de samba na primeira noite do Carnaval 2023 em São Paulo
atualizado
Compartilhar notícia
São Paulo – A primeira noite de desfile das escolas de samba do Carnaval 2023 de São Paulo foi marcada por tom político e arquibancada cheia até o último minuto. Nenhuma escola registrou atraso ou problema grave para atravessar o Sambódromo do Anhembi, na capital paulista.
Mais aguardada do dia, a Gaviões da Fiel foi a última a desfilar, entrou na avenida já de manhã e levantou a torcida – que permaneceu em peso, apesar da hora avançada. Com desfile “da paz”, a escola espera encerrar, em 2023, o jejum de 20 anos sem conquistar o Carnaval de São Paulo.
Com forte carga política, a Rosas de Ouro protestou contra o racismo na avenida e foi outro ponto alto da noite. Esperada no Anhembi, a chuva forte só deu as caras na apresentação da Barroca Zona Sul, por cerca de 30 minutos; os integrantes da escola, porém, deram continuidade à folia tranquilamente, sem maiores complicações.
Confira abaixo como foi o desfile de cada escola de samba na primeira noite do Carnaval 2023 em São Paulo.
Independente Tricolor
Coube à Independente Tricolor a responsabilidade de abrir os desfiles no Sambódromo do Anhembi. Na avenida, a escola abusou de referências mitológicas e recursos teatrais para contar a história da Guerra de Troia.
Recém-promovida à elite do Carnaval de São Paulo, a agremiação fez um desfile honesto. Seus 1,6 mil componentes, bem distribuídos pela avenida, atravessaram o Sambódromo sem sobressaltos. Destaque para o último carro alegórico, o Cavalo de Troia, com bailarinos pendurados de ponta-cabeça.
Passistas faziam carão. Coreografias remetiam a lutas. Nas fantasias, espadas e lanças. O objetivo era traçar o paralelo entre a Guerra de Troia e as batalhas da própria Independente Tricolor, rebaixada em 2018 e vítima de um incêndio no barracão em 2019.
“Estou toda arrepiada, foi lindo”, avaliou a influencer Mileide Mihaile, rainha de bateria da escola. “Eu amei esse samba, ele reflete muito minha vida: lutando até a morte. Não há nenhum mal que não traga muitos bens.”
Acadêmicos do Tatuapé
Com fantasias ricas em detalhes e muito bem acabadas, a Acadêmicos do Tatuapé ofereceu uma homenagem elegante a Paraty, cidade histórica e disputada por turistas no Rio de Janeiro, no Sambódromo do Anhembi.
Na comissão de frente, bailarinos viraram peixes e sereias para saudar o mar de Paraty. Ao longo de 20 alas e quatro carros alegóricos, a escola também explorou a história, as belezas naturais e até a tradicional cachaça da cidade.
Componentes traziam fantasias caprichadas, cheias de brilho e plumas, e maquiagem de ponta. Bolhas de sabão, lançadas na avenida, davam um clima romântico à apresentação.
A melhor parte do desfile, no entanto, ficou por conta do samba, entoado a plenos pulmões pelos 2,2 mil componentes da Acadêmicos do Tatuapé. Presença habitual, a cantora e deputada estadual Leci Brandão (PCdoB) exalava confiança quando cruzou a linha final.
Barroca Zona Sul
O cronômetro marcava 30 minutos quando uma forte chuva caiu sobre o Sambódromo do Anhembi. O pé-d’água fez o público encolher na arquibancada, mas não foi capaz de abater os integrantes da Barroca Zona Sul.
“Não atrapalha nada! Foi para lavar a alma”, comentou um dos 2 mil componentes da escola, a terceira a desfilar no Carnaval de São Paulo, ao chegar animadíssimo e encharcado na dispersão. Não houve atraso.
Conhecida pelo tom político dos desfiles, a Barroca Zona Sul escolheu desta vez o enredo “Guaicurus”, em homenagem aos povos indígenas do Pantanal, que lutam por suas terras há mais de 300 anos.
A resistência a colonizadores europeus foi abordada já de cara na apresentação. Na ala final, passistas carregavam estandartes com a imagem do antropólogo e historiador Darcy Ribeiro (1922-1997), uma das maiores referências de estudos de povos indígenas no Brasil.
Unidos de Vila Maria
O que Nossa Senhora Aparecida, Papai Noel e Michael Jackson têm em comum? Todos são elementos que a Unidos de Vila Maria juntou para contar sua própria história no Sambódromo do Anhembi.
Com refrão chiclete e alegorias que, à primeira vista, não têm conexão entre si, o desfile da Vila Maria relembrou enredos antigos e relações da comunidade com a capital paulista. A escola foi a quarta a desfilar em São Paulo.
“Respeite a nossa história!”, cantavam seus 2,5 mil integrantes. Gigantesca, a agremiação precisou até dar uma corridinha no fim do desfile, para não ser punida por atraso.
O carro de Nossa Senhora chamou atenção. Em outro, um Papai Noel gigante fazia referência a ações sociais promovidas por integrantes da escola, todos os anos. Em possível spoiler para o enredo de 2024, um cover de Michael Jackson, referência da cultura pop, fechou o desfile.
Rosas de Ouro
“Forte e atual.” Foi com essas palavras que a presidente Angelina Basílio, emocionada e em meio a passistas que pulavam de alegria, resumiu o desfile da Rosas de Ouro no Sambódromo do Anhembi.
Em um manifesto contra o racismo, a escola apresentou o enredo “Kindala! Que o amanhã não seja só um ontem com um novo nome”. Em bantu, um dos troncos linguísticos africanos, “kindala” quer dizer “agora”.
O objetivo de impactar o público do Anhembi ficou evidente já na comissão de frente da escola. Em uma espécie de barco-gangorra, bailarinos encenavam o sofrimento dos navios negreiros.
Um dos carros alegóricos trazia homenagens a uma série de personalidades negras – entre elas, Pelé e Glória Maria. Também teve destaque a reprodução da frase do ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida: “Vocês existem e são valiosos para nós”.
Tom Maior
Com o enredo em homenagem às mães pretas e a presença marcante de crianças fantasiadas de anjinhos, a Tom Maior fez um dos desfiles mais coloridos da noite no Sambódromo do Anhembi.
A escola da zona oeste da capital paulista, que completa 50 anos da sua fundação em 2023, investiu em fantasias luxuosas e alegorias exuberantes para tentar conquistar seu primeiro título do Carnaval de São Paulo.
Diferentes carros alegóricos abordaram o tema da maternidade no Sambódromo. Passistas fantasiados de orixás também levaram brilho para a avenida, em uma das muitas referências a religiões de matriz africana presentes no desfile.
Em clima de comemoração, a Tom Maior encerrou o desfile com o dia já às claras. Os 2,3 mil componentes cruzaram a linha de chegada com tranquilidade.
Gaviões da Fiel
Última escola a entrar na avenida, a Gaviões da Fiel ofereceu ao público do Sambódromo do Anhembi a maior fantasia do primeiro dia do Carnaval 2023: um mundo sem intolerância religiosa.
Na fantasia proposta pela Gaviões, egípcios e hebreus são amigos, ao contrário do que registra a Bíblia; israelenses e palestinos convivem em harmonia; e Jesus Cristo, negro, é acolhido nos braços de Oxalá, branco.
Imponente símbolo da escola, o gavião irrompeu no abre-alas, todo de branco – a principal cor na paleta do desfile. Em outros carros alegóricos, componentes foram suspensos no ar. A agremiação também investiu em alas coreografadas.
Show à parte, a musa Sabrina Sato aumentou a temperatura do espetáculo. Vestida de vermelho, sambou fantasiada de dragão de São Jorge, santo mais lembrado do Carnaval e padroeiro do Corinthians.