Boulos patina no lulismo e calibra discurso contra ascensão da direita
Tecnicamente empatado em 1º nas pesquisas com Nunes e Marçal, Boulos vai para o “tudo ou nada” ao lado de Lula e pede voto antibolsonarista
atualizado
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São Paulo – Apesar do apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o deputado federal Guilherme Boulos (PSol) patinou ao longo da campanha à Prefeitura de São Paulo para conseguir atrair parte do eleitorado lulista da capital e chega à véspera da eleição deste domingo (6/10) pregando o voto útil para não ficar de fora do segundo turno, o que seria um fato inédito para esquerda paulistana.
No início do ano, Boulos projetou sua campanha visando uma polarização com o prefeito e candidato à reeleição, Ricardo Nunes (MDB), mas acabou se deparando com um adversário mais à direita e incontrolável, que se tornou competitivo promovendo uma campanha altamente agressiva e pautada por disseminação de fake news. Pablo Marçal (PRTB) cresceu rapidamente nas pesquisas, assim como sua rejeição, cenário que fez com que o candidato do PSol passasse a preferir enfrentar o influenciador em vez do prefeito, embora não admita publicamente.
Sem contar com o volume esperado de transferência de votos dos eleitores de Lula, que derrotou Jair Bolsonaro (PL) na cidade na eleição de 2022, e diante de dois adversários ligados ao bolsonarismo — Nunes oficialmente apoiado pelo ex-presidente e Marçal seguido por milhares de bolsonaristas —, Boulos teve de calibrar seu discurso para fazer frente à ascensão da direita na capital.
Na campanha, o psolista adotou uma postura bem mais amena que a do seu partido em assuntos que são caros aos eleitores mais conservadores, como descriminalização das drogas e militarização da Guarda Civil Metropolitana (GCM), e passou todo o primeiro turno, especialmente nos debates, tanto se desvencilhar da pecha de “invasor de casas” usada pelos dois rivais por causa de sua atuação com líder do movimento sem-teto no passado.
Neste sábado (5/10), uma caminhada ao lado de Lula, na Avenida Paulista, é o último trunfo da campanha de Boulos no primeiro turno, e busca explorar ao máximo a imagem – e popularidade – do presidente nas redes sociais. Além disso, a campanha tem cobrado maior presença de Lula, já que esperava contar mais com a ajuda do presidente, que apesar de forte atuação nos bastidores não esteve fisicamente em tantas agendas de rua quanto esperado.
No último Datafolha, divulgado na quinta-feira (3/10), Boulos aparece com 26% das intenções de votos, tecnicamente empatado em 1º lugar com Nunes (24%) e Marçal (24%).
Boulos e o fator Lula
Boulos costurou o apoio de Lula e do PT pela sua candidatura à Prefeitura ainda em 2022. O presidente, contrariando algumas alas do partido, fez com que o PT abrisse mão de candidatura própria em São Paulo pela primeira vez na história para deixar que um candidato do PSol fosse o cabeça da chapa.
Lula também levantou outra polêmica ao refiliar a ex-prefeita Marta Suplicy, então secretária de Nunes, para ser a vice de Boulos. Marta havia deixado o PT em 2016 em meio a uma série de divergências internas e votou a favor, enquanto senadora, do impeachment de Dilma Rousseff, deixando algumas mágoas no partido.
Além disso, o presidente colocou São Paulo como uma de suas prioridades nestas eleições e participou apenas de agendas de Boulos durante a campanha. Também por ordem de Lula, o PT destinou R$ 30 milhões do fundo eleitoral para a campanha de Boulos, com candidatos petistas em outras capitais recebendo menos do que o psolista.
O destaque dado a um candidato de outro partido provocou uma saia-justa dentro do PT, levando Lula a cancelar atos de campanha junto de Boulos. A campanha previa pelos menos cinco eventos juntos – dois em agosto, dois em setembro e um em outubro –, mas Lula cancelou as agendas de setembro, vistas pelo entorno do psolista como cruciais para atrair o eleitorado das periferias.
Estagnada durante o período de campanha oficial, sem crescimento expressivo nas pesquisas, a campanha não traçou nenhum “plano B” para lidar com as ausências físicas de Lula, embora acionasse o presidente para ajudá-la. Boulos chegou a viajar em setembro a Brasília, às vésperas de um debate, para fazer uma nova gravação ao lado do petista e utilizar nas propagandas no rádio e na TV.
Voto útil
A campanha minimizou, desde o início, a possibilidade de não avançar ao 2º turno. Diante do crescimento de Marçal e da queda de Nunes nas pesquisas, inclusive, passou a intensificar os ataques ao prefeito para tentar forçar um 2º turno de Boulos contra o influenciador, visto como um adversário com maiores chances de ser derrotado em um confronto direto.
Boulos passou a tratar Nunes e Marçal como “duas faces do bolsonarismo” na cidade e se colocou como a opção mais viável para combater um aliado do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições.
Diante do crescimento, visto internamente como “inesperado”, da deputada Tabata Amaral (PSB), a campanha adotou o argumento de voto útil e Boulos passou a fazer acenos à adversária em debates, sendo rechaçado por ela mais de uma vez.
Após o debate da TV Globo, no qual criticou todos os adversários, Tabata disse à imprensa que alguns dos artistas e intelectuais que assinaram um manifesto pedindo voto útil em Boulos teriam dito a ela que não foram consultados antes de serem considerados signatários e atribuiu a ação a uma estratégia da campanha psolista.
Horas antes, o Datafolha havia confirmado a tendência de crescimento de Marçal e, diante da possibilidade de que o influenciador pudesse passar Boulos numericamente, houve uma movimentação para que Lula fizesse uma live, de última hora, para tranquilizar a militância.
Lula entrou ao vivo, de surpresa, e conversou com Boulos por cerca de 15 minutos. Disse que estaria ao lado do psolista neste sábado e que acompanharia a eleição em São Paulo como se fosse a própria. Internamente, aliados do psolista afirmam que Lula está ciente de que uma eventual derrota de Boulos também será considerada um fracasso político do presidente.