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“Sem pilares”: como arquiteta reformou casa de 7,30 m² em Paraisópolis

Arquiteta Ester Carro abusou da criatividade para achar soluções e transformar casa de 7,30 m² em um espaço de 10,50 m²

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Divulgação/André Del Casalle
Imagem colorida mostra interior de casa de 7m² reformada e destaque na Casacor - Metrópoles
1 de 1 Imagem colorida mostra interior de casa de 7m² reformada e destaque na Casacor - Metrópoles - Foto: Divulgação/André Del Casalle

São Paulo – A arquiteta e ativista Ester Carro transformou a casa do entregador Wallece Souza, 33, e criou o primeiro projeto de moradia na favela exposto na Casacor, um dos principais eventos de arquitetura do planeta.

O trabalho não era simples. Wallece vivia em uma casa de 7,30 m² no Jardim Colombo, em Paraisópolis, na zona sul de São Paulo. O local não tinha nem chuveiro. “Eu chegava e tinha que tomar banho no vizinho. Às vezes era tão tarde que nem tomava e você sabe, né, que tomar um banho depois do trabalho é importante para acordar disposto para as entregas no outro dia”, disse.

Não era só chuveiro que faltava. A casa de Wallece não tinha nenhum tipo de estrutura. “Eu tapava os buracos com lençol porque entrava um vento muito frio. E para não entrar nenhum inseto ou bicho desses que matam”, disse.

Como tornar um espaço minúsculo em um lar? Ester pensou em soluções para aproveitar todo o espaço possível no local e elaborou o projeto, que tem quarto, cozinha, lavanderia e banheiro. A arquiteta correu atrás e ofereceu a ideia para a Casacor, que topou. Daí vieram as empresas com as doações.

“A casa dele não tem pilares. muita gente perguntou como seria possível colocar uma estrutura ali sem um custo extremamente alto e sem interferir em outras moradias. Tudo foi feito na medida do possível. Nas laterais não tinha para onde expandir. Daí criei o mezanino para aproveitar melhor o espaço. Ali ele consegue dormir. E, na parte de baixo, tem a cozinha, a lavanderia, o banheiro, o guarda roupa, o armário. Incluímos novas esquadrilhas para entrada de ventilação. Pensando em atender todas as necessidades básicas num espaço minúsculo”.

A solução foi verticalizar. Ester pensou num mezanino na área superior, onde agora fica o dormitório. Abaixo, armários e uma bancada que funciona como cozinha. Ao lado, um tanque. O espaço, agora totaliza 10,50 m². Torneiras, marcenaria, saboneteira, piso, colchão, tintas. Tudo foi resultado de doações de empresas agilizadas pelo projeto de Ester, o Fazendinhando. “O Wallece é um exemplo de jovem que está na batalha todo dia, que nunca desistiu. Que não foi para o crime”, disse ao Metrópoles.

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A casa do entregador após a reforma viabilizada pela arquiteta. Wallece e Ester estudaram juntos
A casa do entregador após a reforma viabilizada pela arquiteta. Wallece e Ester estudaram juntos
A casa do entregador após a reforma viabilizada pela arquiteta. Wallece e Ester estudaram juntos
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Reprodução/Redes Sociais

A transformação começou no dia 10 de junho e foi concluída no dia 6 de julho. Como o local precisa ficar exposto enquanto durar o evento, Wallece está morando de favor na casa de amigos da comunidade. Ele deve voltar para casa na semana que vem.

Amizade

Foi em meados de 2008, na Escola Estadual Pedro Fonseca, que Ester e Wallace conheceram-se no ensino médio. “O acesso à escola pública era, e ainda é, muito difícil. Quando chovia era um caos chegar até lá porque não tem escola pública dentro da comunidade”, disse Ester. O “lá” é Jardim Colombo. Ester completou o ensino médio e formou-se em arquitetura. O colega de infância não conseguiu terminar os estudos. “Eu não tive escolha. Ou estudava ou trabalhava”, disse o entregador.

Eles reencontraram-se em 2023, quando Ester reformou a casa do Seu Tiquinho. Uma residência de apenas 4 m², sem banheiro e sem cozinha, que a arquiteta transformou recolhendo doações, aplicando seu conhecimento e capacitando moradores através do projeto Fazendinhando. 

O sonho da arquiteta

Wallece está feliz e motivado. “É como se minha vida estivesse começando. Sempre tem alguém para criticar, mas eu sei quem ela é e de onde veio. Eu agora quero voltar a estudar”, afirmou ao Metrópoles. “Quem sabe arquitetura ou engenharia civil”, concluiu. 

Ela está certa de que pode fazer mais e segue firme com seu objetivo de lutar por dignidade para a população periférica. “Nunca imaginei que ele vivia naquela situação. Nunca imaginei, na época que estudava, que algo assim aconteceria. Hoje, através da minha profissão, consigo devolver para minha comunidade”. 

Mais que um objetivo, um sonho de quem não esqueceu suas origens. “Quero ter um reality show, um programa na televisão, sobre arquitetura em moradias periféricas porque toda vez que falo desses projetos possíveis dentro de dimensões como essa, ninguém acredita que é possível”.

Wallece voltará para a casa nova somente na próxima semana. E dormirá sem medo de inseto, numa cama cercada por uma parede estilizada com um grafite criado pelo artista Júlio Jesus, morador do Jardim Colombo e fundador do Studio Desenrole.

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