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Amarrado por PMs: juíza que negou tortura mandou algemar homem em audiência

Na audiência de custódia, juíza mandou algemar homem que havia sido amarrado por PMs: “Não há contingente para garantir segurança de todos”

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1 de 1 PMs-homem-amarrado-SP - Foto: Reprodução/Vídeo/Redes sociais

São Paulo – A juíza Gabriela Marques da Silva Bertoli, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), alegou falta de policiamento no fórum e mandou algemar Robson Rodrigo Francisco, 32 anos, durante a audiência de custódia. O homem havia sido amarrado pelos pés e pelas mãos por PMs, após furtar duas caixas de bombom, e acabou preso na segunda-feira (5/6).

Ao analisar a prisão, na quarta-feira (7), a juíza entendeu que não houve “elementos de tortura ou maus-tratos” por parte dos policiais e decidiu decretar a prisão preventiva do homem.

Especialistas ouvidos pelo Metrópoles analisam que a determinação para o uso de algema contraria decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), em súmula de 2008.

De acordo com a Corte, o uso de algema só é “lícito” em casos de presos que oferecem resistência, têm chance real de fuga ou representam perigo à integridade física das pessoas ou dele mesmo. Por ser “excepcional”, a medida deve ser justificada por escrito.

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“Integridade física” e “segurança”

Na decisão, a juíza escreveu que o Fórum Criminal da Barra Funda, na zona oeste da capital paulista, chega a ter mais de 150 julgamentos de presos em flagrante em um dia, mas apenas 19 PMs fazem a segurança do local.

“Houve manutenção das algemas para a garantia da integridade física de todos os participantes da audiência, além das pessoas que se encontram no recinto e fora dele”, justificou.

“Este fórum é o maior da América Latina e nele circulam milhares de pessoas diariamente”, registrou. “Como se vê, e tendo em vista ainda as fragilidades do espaço físico e o número de audiências realizadas simultaneamente, não há contingente suficiente para garantir a segurança de todos”.

Racismo estrutural

Para advogada criminalista Juliana Bignardi Tempestini, do Bialski Advogados, a medida “é passível de causar ainda maiores constrangimentos àquele indivíduo que já está em um momento de vulnerabilidade”.

“O uso de algemas de forma indiscriminada, sem que o indivíduo preso demonstre comportamento violento e traga riscos, traduz um tratamento desumano e contrário aos princípios constitucionais da presunção de inocência”, diz.

Vice-presidente do Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, a pesquisadora Sofia Fromer afirma que a medida seria “mais uma forma de punição”. “É um ato de tortura, porque fere a dignidade humana”.

“Na audiência de custódia, aquela pessoa chega só com o corpo. Ela já está contida, já foi revistada, já passou por detector de metal… Não tem condições de fazer nada contra alguém que está na sala”, analisa.

Já o advogado Carlos Nicodemos, especialista em Direito Penal, destaca que o caso de Robson apresenta “contornos de racismo estrutural” e “merece investigação por parte dos órgãos de controles envolvidos em todas as etapas”.

“Desde a abordagem dos policiais até a audiência, fica evidente que se levou em consideração as condições pessoais do acusado, e não o que ele fez”, pontua.

“Mantê-lo algemado foi apenas o ato culminante desse racismo. A decisão utilizou um argumento genérico, que relativiza a proibição das algemas, sem fundamentar para o caso específico”, completa Nicodemos.

Veja o vídeo da prisão de Robson:

Critérios técnicos

Procurado, o TJSP afirmou que não emite nota sobre questões jurisdicionais.

Por sua vez, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que a PM realiza a segurança do tribunal e “designa agentes para esse trabalho de acordo com critério técnicos”.

“Somente em 2022 os policiais militares realizaram a escolta de cerca de sete mil presos em audiências nas Varas Criminais e do Júri, e de 25 mil presos em audiências de custódia”, explicou em nota.

Habeas corpus

Nessa quinta-feira (8), a defesa de Robson impetrou um habeas corpus para soltá-lo. O advogado José Luiz de Oliveira Junior alega que seu cliente “furtou para se alimentar” e que a prisão teria sido “ilegal”.

“Ele foi pego comendo chocolate na rua. Foi furto famélico, com princípio de insignificância, sem violência ou grave ameaça”, afirmou o advogado.

furto famélico é aquele cometido diante de uma situação de risco, como fome ou doença. Além de comida, pode envolver medicamentos e produtos de higiene básicos, relacionados à garantia de sobrevivência.

Outra linha da defesa é que haveria “ilegalidades” na prisão, motivo pelo qual o ato deveria ser anulado: “As imagens são claras, ele foi arrastado pelos policiais e até a PM afastou os envolvidos, mas a Justiça nem sequer considerou isso”.

Segundo o advogado, Robson vive em situação de rua, é usuário de drogas e possivelmente estaria em “surto psicótico” no momento do flagrante. “Não estou defendendo o ato que ele praticou, ninguém deve furtar, mas é preciso aplicar a razoabilidade”, diz o defensor.

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