As diferenças entre Rodrygo e Vinicius Junior no Real Madrid
Jovens, brasileiros e disputam a mesma posição dentro de um dos maiores clubes do mundo. Inevitável falar de um sem citar o outro
atualizado
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Eram apenas seis minutos de jogo quando Rodrygo marcou seu segundo gol contra o Galatasaray. Em poucos toques na bola, a proporção de uma noite de Champions League daria outra dimensão ao status do brasileiro. Mais tarde, ainda faria o terceiro na goleada por 6 x 0 e sairia como o grande personagem da partida.
Um hat-trick na Liga dos Campeões, pelo Real Madrid, aos 18 anos de idade. Nada é comum ou simples no feito. E o nível de projeção gera naturais comparações com o outro jovem brasileiro do elenco. A questão é que não há a menor necessidade de diminuir Vinicius Júnior para exaltar Rodrygo.
Na verdade, são características bem diferentes. As semelhanças que sugerem tantas comparações? Jovens, brasileiros, talentosos, chegaram cedo a um dos maiores clubes do mundo e disputam a mesma posição dentro do time. Logo, é quase inevitável citar o outro ao falar de um deles.
Se Rodrygo é a sensação do momento, Vinicius foi a da temporada passada. E muitos tratam o retrato de hoje como a imagem definitiva de um sucesso e um fracasso. Não é por aí. O ex-jogador do Flamengo mostrou personalidade e virou um titular importante durante um momento extremamente conturbado de 2018/19, aproveitando o espaço que Solari deu para os garotos.
Antes das conclusões exageradas, há um contexto. Além das transformações a partir das trocas no comando, o Real Madrid convive com uma transição traumática após a saída de Cristiano Ronaldo. O clube perdeu um ídolo histórico, uma referência e, acima de tudo, uma garantia de gols. E o funcionamento de uma década tinha uma organização ofensiva para potencializar a enorme capacidade de decisão do português.
Karim Benzema é o grande símbolo disso. Um 9 completo e que se destaca muito mais pela armação do que pelo número de gols, embora tenha sido o artilheiro na última temporada (em que também foi, disparado, o melhor jogador do time). Mesmo no auge do famoso trio BBC, o francês era quem conectava as peças, compensando momentos menos participativos de Bale ou C. Ronaldo.
Benzema é um facilitador. Com sua qualidade fora da área, participa em todas as partes do campo e é um complemento interessante para qualquer ponta. A grande questão é: sem Cristiano, de onde viriam os gols? Bale e Asensio, teoricamente os sucessores em 2018/19, ganhariam maior responsabilidade, mas não corresponderam. E o problema rapidamente ficou muito claro, ainda com Lopetegui. O time até jogava bem, mas não aproveitava as chances criadas e acabava castigado. Aos poucos, os tropeços derrubaram a confiança, as atuações caíram e os técnicos também.
Além da badalada volta de Zidane, a óbvia resposta de Florentino Pérez foi a ida ao mercado. Hazard chegou como a nova estrela, assumiu a histórica camisa 7 e vira a nova referência. Com todo seu talento e o ótimo nível que recuperou desde a Copa do Mundo, tem muito para acrescentar, embora ainda não tenha deslanchado. Só que o belga também não é um goleador. Ou pelo menos nunca foi até hoje. Produz muito, mas não é uma garantia de 30 gols por temporada. Não é uma crítica. É uma constatação para que a cobrança não seja desproporcional.
Fato que traz desdobramentos. Se o ataque tem Benzema e Hazard, o terceiro elemento também precisará dar a sua parcela de gols. E é aí que entra a diferença de tratamento entre Rodrygo e Vinicius Júnior. O ex-Santos mostra muita maturidade em campo e, tecnicamente, parece mais pronto para tomar determinadas decisões e executá-las com precisão. Além disso, se sente mais confortável na direita, lado que já tira Vinicius da zona de conforto. O ex-Flamengo tem outras virtudes. A inventividade para driblar, mudar de direção e acelerar para cima dos defensores é especial. Porém, o desfecho dos lances muitas vezes não é do mesmo nível, seja na tomada de decisão ou na finalização. Nada que não possa ser aprimorado ao longo do tempo.
Vinicius Junior tem momentos de maior genialidade, pela habilidade e o improviso que quebra qualquer defesa. Ao mesmo tempo, arrisca mais vezes e acaba desarmado mais vezes. E se a produção não for suficiente ou convincente, a armadilha é passar a ser visto de outra forma. Em vez de ser o garoto que mostra personalidade, sempre tenta e cria bons lances, passa a ser o driblador que define mal e gera muitas perdas de bola. São formas distintas de enxergar e rotular uma característica a partir do desempenho.
Se Rodrygo reforçar a imagem do talentoso finalizador, encaixa perfeitamente na maior carência do clube. E isso ajuda a explicar a explosão na repercussão. Zidane tem tentado oxigenar o funcionamento coletivo com a entrada de duas novidades: Valverde na vaga de Modric e o brasileiro na ponta. O lado esquerdo tende a concentrar a armação de jogadas, por reunir Sergio Ramos, Marcelo, Kroos e Hazard. E o outro lado passa a ter o fôlego de Valverde para pressionar e a movimentação de Rodrygo para circular pelas zonas de finalização.
O Real Madrid ainda está muito distante de uma regularidade em nível convincente. E os dois brasileiros já deram passos muito relevantes e precoces em um clube tão importante. O momento é de Rodrygo, o que não desqualifica Vinicius Junior. No fundo, ambos são enormes apostas para o futuro. Méritos para quem aproveitar as chances e subir cada degrau no processo de desenvolvimento, algo natural para garotos de 18 e 19 anos – anormal diante de holofotes tão grandes.