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Viver bem é saber ocupar seu lugar no mundo, e não qualquer lugar

No meu ofício de analista, acostumei-me a estar diante de sujeitos que nem sempre sabem para que existem

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Onde termina a vida e começa a sobrevivência? Pergunta capciosa, de respostas múltiplas. Aqui falo do significado da vida, da razão para existir e ocupar, com um corpo, um lugar no tempo e no espaço. De algo que, que de tão óbvio, parece estar subentendido. Não está.

No meu ofício de analista, acostumei-me a estar diante de sujeitos que nem sempre sabem para que existem. Sabem até os porquês – especialmente enumeram aqueles que impõem sofrimento. Quase nunca percebem a ausência de sentido como alimento do mal-estar.

Existir é muito pouco para a condição humana. Desde os primórdios, quando começou a pensar-se, o ser humano buscou uma função a ocupar diante do outro e do todo. Uma função que validasse sua inserção no universo que o engloba, que o identifique como ser único.

E, enquanto vivíamos no dito primitivismo, essas respostas eram suficientes. Jung cita o representante da tribo aborígene que tinha por função permitir que o sol nascesse. Obviamente, uma fantasia mágica. Mas que era impreterível a ele e aos seus convivas.

Representar esse papel era a salvação de tal sujeito. Era experimentar o sagrado em si. Por esse motivo, desempenhava esse ofício da maneira mais fiel e responsável o possível.

Hoje, demarcamos espaço com feitos superficiais e repetitivos, com um álbum de fotos e depoimentos curtos sobre nossos afazeres. Reclamamos da segunda-feira, do cansaço, da corrupção. Comemoramos a sexta, o lazer, as vantagens que o outro não percebeu – mesmo que não saibamos o que fazer com o tempo, nem entendemos a função da diversão e da ética.

Replicamos ideias, crendo que somos delas autores (na dúvida, pesquise em Platão ou Aristóteles – “é provável que eles já tenham pensado sobre isso, e de forma melhor”, como me alertou uma professora querida).

E, assim, sobrevivemos. Assumimos um estado de torpor enquanto a morte não vem. Não arriscamos, pois não queremos perder. Queixamo-nos pelas oportunidades que não chegam. Descartamos o aprofundamento, quando ele exige mudanças. Culpamos, muito, o outro por nossos fracassos. Não nos permitimos a dádiva educativa do fracasso.

Nesse estado de espera por um advento, ou um agente redentor, evitamos tudo que inspira vida. O movimento, a desconstrução, o embate. Não sentimos a alma pulsar, e isso se traduz numa ausência de sentido, uma espécie de desconexão ou falta de pertencimento.

Muitas vezes, tudo isso é simples reflexo da dificuldade que temos de bancar o que sempre soubemos, mas nunca quisemos admitir. Aquilo que, convencionalmente, não parece o melhor – apesar de, por dentro, ser um valor genuinamente seu. Parece difícil bancar nossa verdade.

Basta olhar para a história da humanidade. Os veneráveis nunca eram os mais bem adaptados, e sim os autênticos. Quase sempre, eles não tiveram autorização para realizarem a própria história. Muitos pagaram com a vida. Viver nunca foi fácil. Mas é recompensante.

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