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Nossos conselhos valem pouco quando não há terreno fértil para mudança

Acreditamos na capacidade de virar o pensamento do outro a partir de nossa vontade. Somos menos que isso

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Serious calm woman covering ears
1 de 1 Serious calm woman covering ears - Foto: Istock

Dizem que se conselho fosse bom, seria vendido. E também falam que o inferno se faz de boas intenções. Sabedoria popular, a expressão verbal do inconsciente coletivo. No entanto, há momentos nos quais nosso silêncio parece negligência, especialmente diante de quem amamos.

Vemos aquilo que o outro parece não conseguir enxergar. Associamos a isso o sofrimento atravessado. E ele não vem exatamente como uma queixa vazia, como aquela reclamação sem desejo algum de mudança. Intervir ou não?

São incontáveis os motivos que levam pessoas a não se encarregarem, de forma responsável, diante dos próprios problemas. Posso assegurar que preguiça e descaso estão entre os últimos colocados desta lista. O medo lidera com folga.

Medo da desaprovação dos outros; de parecer perdedor por mudar de opinião; de imprimir mudanças significativas na vida; de abrir mão de um plano que exigiu tanto; da dor e do sofrimento que poderá enfrentar; da incompetência diante dos desafios, etc…

Medo da verdade.

Muitas vezes, é apenas uma palavra de apoio que falta, algo que corrobore aquilo que, em nosso íntimo, já sabemos, mas não queremos admitir. Somente com o apontamento do outro ganhamos segurança para afirmar o quanto aquilo é pertinente.

O conselho não vem para mudar nosso pensamento, mas principalmente para reafirmá-lo. E, com isso, despertamos a coragem para enfrentar aquilo que amedronta.

No meu ofício, sou rogado diversas vezes por meus clientes a um conselho. Esse não é o meu papel, e quase sempre resisto ao chamado – por acreditar que minha função é capacitar o outro a reafirmar suas decisões em si e por si.

Mas vejo como, inconscientemente, o conselho escapa a essa minha vontade. Não exatamente por palavras. Num olhar de aprovação, preocupação ou reprovação, numa pausa na fala, num sorriso. E, tempos depois, quando a mudança se efetiva, vem o depoimento da importância daquele gesto naquele momento – que, muitas vezes, a mim pareceu tão corriqueiro, desimportante.

Nisso compreendo a força da vida, que, quando quer se realizar, encontra seus meios e agentes.

Tememos aumentar a população infernal com nossos conselhos, justamente por não compreendermos esse movimento. Por acreditarmos muito na nossa importância e na capacidade de virar o pensamento do outro a partir de nossa vontade. Somos menos que isso.

Nenhum conselho surte efeito quando não encontra território propício para isso, ainda que inconscientemente. Simplesmente não vinga, não abre possibilidades para o novo pensamento. O que julgamos ver com tamanha clareza ainda permanece no total escuro para o outro.

Mas pode ser um princípio, a origem à aproximação de uma nova ideia. A nossa parte, a colaboração possível para colaborar com nosso semelhante – não por vaidade, mas por solidariedade. Nessa experiência, percebemo-nos meros instrumentos de reconexão, entre o outro e sua verdade.

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